Título: Com propostas semelhantes, PT e PSDB divergem sobre fundações
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 16/07/2007, Política, p. A8

O projeto de Lei que permite a criação de Fundações Públicas de Direito Privado para administrar hospitais, além de oito outros setores específicos da administração federal, mal chegou ao Legislativo e já transformou-se em uma disputa política entre PSDB e PT. Assinado no dia 11 pelo presidente Lula, o projeto, que abre a possibilidade de contratações por CLT para áreas como a previdência complementar do setor público, meio ambiente, cultura e ciência e tecnologia, chegou ao Congresso na sexta-feira gerando polêmicas.

Os tucanos afirmam que a possibilidade de se abolir o concurso público para contratação de servidores abre brechas para o apadrinhamento político e uma nova politização da máquina pública. Os petistas negam a acusação e rebatem que o PSDB não tem condições para reclamar, pois já adota prática semelhante na administração pública de São Paulo.

O PSDB da Câmara anunciou, de antemão, que vai trabalhar para derrubar o projeto ou apresentar emendas ao texto. "É um escândalo. Eles querem acabar com o concurso público e comprar máquinas sem a necessidade de licitação, medidas criadas para dar mais transparência ao sistema", afirmou o líder do partido na Câmara, Antonio Carlos Pannunzio (SP).

Em relação à extinção dos concursos públicos, Pannunzio desconfia que seja mais uma tentativa da gestão Lula de aparelhar a máquina. "Primeiro eles encheram o governo de petistas. Depois, aumentaram o número de cargos de livre provimento. Como a fonte está secando, buscam agora outras alternativas para empregar os companheiros", acusou o tucano.

O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) estranhou as declarações de Pannunzio. "Não entendo como ele pode fazer críticas se aqui em São Paulo eles fazem muito pior". Segundo o petista, desde a gestão de Mário Covas, o PSDB paulista passou a entregar os hospitais estaduais para Fundações Privadas chamadas de "Organizações Sociais", popularmente conhecida por OS.

Elas passam a ser responsáveis por toda a administração dos hospitais, desde a contratação de servidores, passando pela resolução de problemas do dia-a-dia até a compra de equipamentos, dispensando do cumprimento da lei de licitação que rege o setor público ( a 8666) . "O projeto do governo Lula é diferente. Serão Fundações de Direito Público (o texto diz que pode ser de Direito Privado também) mas ligados ao Estado, subordinados às regras da União. Não estamos privatizando nada", assegurou o petista.

Zarattini acrescenta que os servidores das Fundações deixarão de ser estatutários e passarão a ser regidos pela CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas - mas não significa, necessariamente, que deixarão de ser concursados. Assessores do Ministério da Saúde, no entanto, confirmaram ao Valor que poderão ser contratados profissionais de saúde sem a necessidade de concurso, sobretudo nos casos de emergência.

Pannunzio minimiza os ataques de Zarattini. Reconhece que as "Organizações Sociais" administram hospitais estaduais, mas justifica que a transferência de responsabilidade só aconteceu em relação aos hospitais novos. "Não pegamos hospitais já existentes na rede e entregamos para a administração privada", afirmou. Ele reconhece que as contratações são feitas sem concurso. E justifica: "o custo-benefício de um servidor terceirizado é muito melhor do que de um concursado", declarou o tucano.

Quanto à dispensa de licitações apontada pelo petista, Pannunzio admite não ter informações sobre isso. Mas acredita que tenha havido poucas situações concretas, já que os hospitais terceirizados foram entregues prontos pelo governo estadual. "A obra foi feita pelo governo, dentro das regras legais de licitação", assegurou.

Se PT e PSDB brigam por conta de um projeto que recém iniciou sua tramitação no Parlamento, no passado, durante o governo Fernando Henrique - alternando, portanto, os papéis de governo e oposição - as duas legendas também discordaram radicalmente de mudanças a serem realizadas no setor público. Durante a reforma administrativa proposta pelo então ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, a assessoria técnica do PSDB sugeriu a criação do "emprego público, de provimento sem concurso e cujos servidores passariam a ser regidos pela CLT". As mudanças ocorreriam na contratação de profissionais para as agências reguladoras.

O PT, que hoje admite a transformação dos estatutários em celetistas, na época foi contra e entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal. "Eles alegaram que atividades exclusivas do Estado - no caso, o poder de fiscalização e auditoria, por exemplo - precisavam ter estabilidade para exercerem com mais independência seu papel", recorda o coordenador da assessoria técnica do PSDB, Wilson Calvo. "Até hoje, não existe uma lei complementar que regulamente o que é ou não atividade exclusiva de Estado", afirmou o assessor tucano.