Título: Cresce pressão para a saída das tropas do EUA do Iraque
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 17/07/2007, Opinião, p. A14

Relatórios dos serviços de segurança dos Estados Unidos indicam que a Al-Qaeda recuperou sua capacidade operacional ao nível que tinha antes dos atentados de 11 de setembro. Os terroristas de bin Laden e seu chefe estão seguros e atuantes nas fronteiras do Afeganistão com o Paquistão, onde uma rebelião islâmica toma forma, depois que os radicais entrincheirados na Mesquita Vermelha, em Islamabad, foram mortos pelas tropas do ditador Pervez Musharraf, um aliado americano. Essa não é a única péssima notícia para o governo de George W. Bush, cuja estratégia de invadir o Iraque como resposta a Ossama bin Laden - que nada tinha a ver com Saddam Hussein - e exportar a "democracia" revelou-se um sangrento fracasso. Os desastres custaram a popularidade de Bush, hoje em seu ponto mais baixo, e tornaram o presidente impotente a mais de um ano do fim do mandato, sem que se conseguisse desmobilizar a Al-Qaeda.

George W. Bush está pagando o preço pelas idéias "neoconservadoras" de seu time de governo, já parcialmente defenestrado. Paul Wolfowitz, uma iminência parda, foi derrubado da presidência do Banco Mundial por nepotismo e Donald Rumsfeld foi botinado da Secretaria da Defesa, após uma coleção ininterrupta de malogros. Se todo o estrago causado por Bush se resumisse ao destino pouco afortunado de seus assessores, a conta sairia barata. Os erros que cometeu, porém, têm graves conseqüências.

O Iraque continua uma sucursal do inferno, apesar dos atentados em massa terem sido provisoriamente arrefecidos. O Líbano move-se novamente em um pântano político, onde o governo de Fuad Siniora enfrenta o ataque conjunto do Hezbollah e da Síria. O governo de Israel é o mais fraco de sua história. O ditador egípcio Hosni Mubarak fecha aos poucos as pequenas brechas que se abriram sob auspícios de uma "democratização" patrocinada, à maneira de sempre, pelos EUA. O Irã elevou o tom de suas ameaças aos americanos, enquanto arma xiitas no Iraque e o Hezbollah no Líbano.

Pode-se argumentar que nem todos os reveses são atribuíveis a Bush e que talvez a situação não fosse significativamente diferente se esses países fossem deixados à própria sorte. Não restam dúvidas, porém, de que a invasão do Iraque mudou o mapa político da região e a tornou mais, e não menos, insegura, sem que passos duradouros no caminho da democracia tenham sido dados. A responsabilidade dos EUA por possíveis e novos banhos de sangue no Iraque é cabal e integral.

As tropas americanas são a única força a evitar que um país dividido, enfeudado por seitas rivais armadas, com um governo fraco e um Exército ainda em construção, escape da guerra total de todos contra todos. As fortes pressões do Congresso americano vão agora na direção de estabelecer uma data - a mais próxima possível - para que os efetivos americanos se livrem da enrascada. Com as eleições se aproximando, a retórica dos democratas, que dominam Senado e Câmara, começa a conquistar republicanos. Bush tenta dar tempo ao tempo. O presidente espera o relatório final, a ser apresentado em setembro pelo general David Petraeus , comandante das tropas militares no Iraque, para reavaliar a situação.

Um relatório parcial mostra avanços a passo de tartaruga e obstáculos até agora intransponíveis. Boa parte dos pontos satisfatórios do relatório dizem respeito a um aumento da segurança onde as tropas americanas se envolveram. E boa parte dos reveses se concentram na incapacidade de desarmar as milícias, aumentar a capacidade das autoridades iraquianas de executar um plano se segurança e elevar o número de unidades de segurança capazes de operar de forma independente. A isso somam-se dificuldades políticas vitais, como a de estabelecer regras para a distribuição dos lucros com a exploração do petróleo, uma repartição difícil quando curdos e xiitas habitam regiões com muito óleo e os sunitas, não. O retrato traçado pelo relatório é claro. As tropas iraquianas não param de pé sozinhas e não estão em condições de enfrentar as milícias, que se recusam a entregar as armas. As tropas americanas estão no pior dos mundos - a retirada será uma confissão de derrota seguida do caos, a permanência não trará grandes chances de vitória.