Título: Comissário da UE reitera apoio à carne bovina brasileira
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 17/07/2007, Agronegócios, p. B13

A Comissão Européia rejeitou demandas de pecuaristas da Irlanda e do Reino Unido pela proibição imediata da importação de carne bovina brasileira. O comissário para Saúde Pública e Segurança Alimentar, Markos Kipryanou, disse que nada justifica uma "mudança urgente" na política européia em relação à carne brasileira.

A mais recente missão veterinária européia enviada ao Brasil, em março deste ano, constatou "dificuldades práticas" na implementação do sistema de identificação e controle de movimento dos animais. Mas apenas no fim do ano, após averiguar se o Brasil corrigiu as deficiências apontadas por Bruxelas, é que vai reconsiderar a autorização para a exportação da carne para o mercado comunitário.

Poucas horas antes de os produtores irlandeses e britânicos irem ao Parlamento Europeu pedir o embargo completo da carne brasileira, o comissário Kyprianou enviou documento de 26 páginas aos deputados europeus e associações agrícolas, contestando, ponto por ponto, um relatório da Associação dos Agricultores irlandeses (IFA) - mas deixando de fora os temas de meio ambiente e social, que não são de sua área.

O relatório irlandês alega que o gado brasileiro não é identificado ou registrado da mesma maneira que o dos europeus, que a rastreabilidade completa não pode ser alcançada no país, insiste na presença de febre aftosa e em que há movimento de gado entre Estados infectados com a doença e não infectados. Afirma ainda que o controle de remédios veterinários não é idêntico ao europeu.

Mas o comissário de Saúde e Segurança Alimentar da UE desqualificou o relatório. Disse que as alegações são baseadas em interpretações incorretas das exigências da UE para importação de carne bovina, que as informações não são novas e apresentam-se de forma enganosa ("misleading") .

Kyprianou lembrou que a União Européia não pode impor toda sua legislação interna a terceiros países. E que que não há exigência para que todo o gado brasileiro seja completamente rastreado ou que a aftosa esteja ausente de todo o território nacional, ou ainda que seja banido o movimento de gado entre zonas infectadas ou não.

Em contrapartida, ele mencionou o "duplo cerco" de Bruxelas, exigindo que qualquer animal cuja carne seja destinada ao mercado comunitário fique em uma área livre de febre aftosa por 90 dias e em uma fazenda autorizada 40 dias antes do abate. Esse período assegura que animais com problema não sejam abatidos para exportação. O bloco exige que o abate ocorra em plantas frigoríficas aprovadas por Bruxelas.

Com relação aos resíduos e controles de remédios no Brasil, o comissário disse que o país deve oferecer garantias equivalentes às da UE. Afirmou que as missões européias não encontraram nenhuma evidência de uso de hormônio para crescimento no gado e ficaram "amplamente satisfeitas" com os controles das autoridades brasileiras, considerando assim "não válidas" as alegações dos irlandeses.

O comissário contestou ainda afirmações dos agricultores, de que a União Européia deixa entrar carne brasileira que os Estados Unidos e o Japão não aceitam. Primeiro, Kipryanou observou que os dois países tampouco importam carne européia mais de um ano depois de a Organização Internacional de Saúde Animal (OIE) ter modificado suas regras sobre a doença da vaca louca. Além disso, os Estados Unidos e o Japão não respeitam o princípio de regionalização sanitária para febre aftosa, previsto nas regras da OIE.

Em seu documento aos deputados, Kyprianou avisou que as decisões da UE em relação à importação de alimentos se baseiam unicamente na segurança alimentar e proteção da saúde, sem considerar interesses econômicos.

O documento também questiona ponto por ponto as alegações da Associação dos Agricultores Irlandês. Utiliza uma cifra dos próprios irlandeses, de que 331.436 toneladas de carne foram importadas do Brasil. Isso representa 2,5 milhões de bois abatidos. Ocorre que o rebanho brasileiro é de 200 milhões de cabeças, dos quais 16,5 milhões estão registrados no Sisbov, o sistema de rastreabilidade. Significa que grande parte do gado brasileiro não pode ser exportada para a UE. Portanto, não está sujeito a exigências de Bruxelas.

Também nota que as exportações de carne bovina do Brasil freqüentemente passam por São Paulo por razões fiscais, o que explica por que esse Estado exporta mesmo entrando na lista de proibidos.

O comissário contestou que a União Européia tenha de exigir do Brasil sistema equivalente na identificação, registro ou rastreabilidade dos animais. Pelo contrário, disse ele. É exatamente porque o sistema brasileiro não é equivalente ao europeu que a UE exige que o país controle parte do sistema de produção, com condições adicionais para os animais cuja carne é exportada para o mercado comunitário.

No capítulo sobre controle nas fronteiras e biossegurança, Kyprianou desmontou igualmente todas as acusações irlandeses. Disse que a União Européia não encontrou nenhuma "evidência objetiva" de que febre aftosa é um grande problema ou esteja fora de controle na fronteira entre Brasil, Bolívia e Paraguai, e nem mesmo que tenha ocorrido foco em Santa Cruz, na Bolívia. Ele afirmou que, mesmo se o contrabando ocorrer nas fronteiras, a política européia é "robusta o suficiente para tratar dessa situação e manter nosso controle apropriado de proteção".

Quanto ao suposto controle inadequado da febre aftosa - alegação que os irlandeses dizem se apoiar em avaliação de um especialista no assunto, professor brasileiro Augusto Pinto, o comissário deu uma resposta igualmente direta. Segundo ele, a UE só está preocupada com os controles exercidos no Brasil sobre os animais e suas carne destinadas à exportação para o mercado europeu.