Título: Todas as mulheres da presidente
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 01/01/2011, Política, p. 4

Dilma nomeará 13 profissionais que trabalharão diretamente com ela. Escolhidas são conhecidas pela discrição e lealdade

Se toda mulher tem um pouco de Leila Diniz pela vontade de quebrar padrões de comportamento, Cléo, Marly, Jane têm ainda um pouco de ¿Dilma¿ em suas personalidades. Essas mulheres foram escolhidas ¿ com outras 10 ¿ pela presidente eleita para acompanhá-la na nova rotina presidencial. Pessoas próximas as consideram decididas, fortes, leais e discretas, características comuns à presidente. Elas devem integrar o Gabinete Pessoal da Presidência da República. As nomeações serão divulgadas nos primeiros dias do ano.

Cleonice Maria Dorneles tornou-se a principal assessora de Dilma. Começou a militância política na década de 1980. Cléo, como é conhecida, integrou a Brigada Enfil na Nicarágua. O grupo de jovens cheio de ideologias ajudava na construção democrática do país depois de quase 40 anos de ditadura. Colhiam café e trabalhavam na campanha de alfabetização. Cléo passou cerca de três meses na Unidade de Produção Estatal de Las Rosas, em Matagalpa, ao lado de outros 25 brasileiros. Entre eles, o artista Chico Simões. Acordava de madrugada. Não tinha hora para dormir. Os jovens estavam sempre em formação militar. A assessora destacou a experiência em um blog de brigadistas como ¿os melhores dias de sua vida¿.

Hoje Cléo também acorda cedo: sai de casa às 6h. Só volta depois da meia-noite. A dedicação à presidente eleita é exclusiva e a mala está sempre pronta para acompanhá-la nas viagens. ¿Não tem hora de trabalho para ela. Está sempre disponível e tem todas as informações na mão, como a Dilma¿, comenta uma colega. Cléo tem dois filhos: um menino de 20 e uma menina de 11. Apesar de ter nascido em Minas, ela fez a vida na capital federal. Vive na Asa Norte e solicitou um apartamento funcional para a família.

Militante do PT-DF, Cléo trabalhou com Dilma na Casa Civil. Já tinha assessorado o então ministro da Saúde, Humberto Costa. ¿Como a gente diz em Pernambuco, Cléo é `jeitosa¿. Tem muito traquejo político¿, afirma o ex-chefe, eleito senador (PT-PE). A militância partidária sempre foi motivo de orgulho para Cléo, que, em 2006, chegou a contribuir financeiramente com as campanhas eleitorais. Doou R$ 200 para Geraldo Magela e R$ 260 para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sempre alerta

A adrenalina das grandes operações da Polícia Federal (PF), especialmente aquelas de assalto à banco ¿ suas preferidas ¿ deram espaço ao estado de alerta constante. Jane Peres é agente da PF e, desde o início da campanha eleitoral, ela e mais cinco policiais acompanham a presidente eleita. A empatia e a confiança entre ela e a presidente é recíproca. Dilma já convidou Jane para acompanhá-la no novo governo.

¿Toda mulher que ocupa um cargo predominantemente masculino precisa demonstrar mais força, competência, sem perder a feminilidade. Tem que ser um pouco Dilma mesmo¿, brinca a agente que tem 15 anos de corporação e, apesar da simpatia, fama de durona.

Casada com um agente especial da PF e mãe de quatro filho, a pernambucana está maquiada até nos treinos. O batom rosa destaca os traços finos. E os cabelos longos e lisos estão arrumados mesmo depois de muita chuva. Antes de entrar na corporação, ela trabalhava em um gabinete do Tribunal de Justiça. Levava, segundo ela, uma vida de dondoca. Passou no concurso em 1995. A primeira missão foi na fronteira do Brasil com a Bolívia. Enfrentou nas primeiras 24 horas de PF um tiroteio. Tomou gosto.

Essa paixão pelo trabalho parecer ser o ponto em comum entre Jane, a mais experiente do grupo, e as outras cinco agentes. Todas especializaram-se na segurança de autoridades apesar de já terem enfrentado diversas missões. A gaúcha Lícia Steint é outra que deve ficar na equipe de Dilma. Avessa às câmeras, a agente é extremamente concentrada no trabalho. A escolta feminina foi um pedido de Dilma. As ¿meninas¿, também chamadas de ¿minha filha¿ pela presidente, ganharam tanto destaque que irão ao lado do carro de Dilma no desfile.

Marly Ponce Branco tornou-se fiel escudeira de Dilma. Eficiente, rápida, dedicada, a ex-assessora técnica da Subchefia de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil começou a trabalhar com a presidente eleita no Ministério de Minas e Energia, quando ela chefiava a pasta. Casada com Raul Branco, economista e membro da Sociedade Teosófica no Brasil, a assessora é bastante religiosa. ¿Assim como ela, Marly é muito discreta. Dilma gosta disso¿, afirma um funcionário da equipe de transição. Durante a fase, a assessora ganhou destaque na imprensa depois de encomendar um berço para o neto da presidente. O móvel não foi pago com dinheiro público.

A equipe é mais feminina porque Dilma deve escolher as pessoas que ela considera mais preparadas para aquele trabalho e isso (a escolha de mulheres) parece uma grande novidade¿ Miriam Goldember, antropóloga

Orgulho das militantes

» Josie Jeronimo

Há 20 anos, quando disputou a eleição para a prefeitura de Salgueiro, município localizado a 500 quilômetros de Recife, a então candidata Cleuza Pereira viu seu adversário utilizar uma entrevista com uma eleitora para desqualificar sua candidatura. ¿O que você acha de uma mulher governar Salgueiro?¿, perguntava o suposto entrevistador. ¿Ah, eu não mando nem na minha casa¿, respondeu a mulher consultada. Cleuza, hoje com 74 anos, venceu o preconceito dos pernambucanos do interior e foi prefeita de Salgueiro por três vezes. Já no comando da prefeitura, não deixou de enfrentar o machismo na administração pública. Ela conta que veio a Brasília em busca de recursos e, na antessala de um ministro, antes de ser atendida, em 1993, ouviu de uma secretária: ¿Você trouxe o seu prefeito?.¿

Filiada ao PSB, a ex-prefeita atualmente não exerce cargo público, mas comemora a chegada de Dilma Rousseff à Presidência da República. ¿Nós mulheres somos consideradas ótimas para ser secretárias, para coordenar campanhas dos homens, mas ser indicadas para governar algo que leve nosso próprio nome é difícil. Por isso, admirei tanto o presidente Lula, por colocar mulheres em postos de relevo e depois indicar o nome de Dilma¿, elogia.

Há 30 anos, em um congresso de partidos de esquerda realizado na Asa Sul, em Brasília, a atriz Clara Luz, nome artístico de Clarestina Maria de Jesus, 85 anos, interrompeu a fala de um militante e gritou no meio da reunião: ¿Nós queremos ver uma mulher na Presidência¿. Foi saudada por calorosos aplausos das feministas presentes, mas a manifestação foi esfriada pelo comentário da amiga. ¿Você sonha muito alto, Clara¿. A atriz afirma que ver uma mulher chegar ao poder é a realização do sonho de muitas militantes feministas que ficaram à margem da representação democrática durante longo período da história brasileira. ¿Havia muita censura. Se em 2011 nós temos um preconceito, imagina há 30 anos. Antes a mulher não competia com o homem. Nunca poderia imaginar que eu, aos meus 85 anos, veria uma mulher presidente da República.¿

Só milagre O destino social das mulheres, geralmente eternizado com o posto da mãe de família, era tão intransponível que a fundadora do PT da Paraíba, Eliza Mineiros, chegou a rezar para que um milagre ampliasse seu mundo, até então restrito a uma propriedade rural de seu pai, no Cariri. ¿Meu Divino Espírito Santo, peço que o senhor me tire desse sítio atrasado porque eu quero ser uma doutora¿, relembra do pedido feito aos nove anos de idade.

À época, um professor visitava a casa das famílias rurais para alfabetizar as crianças e nem sempre a dedicação à educação das meninas era a mesma oferecida aos meninos. Hoje, aos 86 anos, ela se orgulha dos títulos de assistente social e da pós-graduação em pedagogia, cursada no Rio de Janeiro. Alçou outros voos e, em sua militância pelos direitos humanos, conheceu um famoso líder sindical em São Bernardo do Campo conhecido como Lula. Depois disso, ¿tomou gosto¿ pela política. ¿Lutei muito por ela (Dilma), embora não a conheça pessoalmente. Era chegado o momento histórico de uma mulher ocupar a presidência da República, porque as mulheres têm a mesma competência dos homens. Sempre tive esse ideal.¿

Planos de visitante

» Leandro Kleber Especial para o Correio

A Esplanada dos Ministérios na capital federal chamará hoje a atenção de todos os brasileiros. Quem quis prestigiar as solenidades de posse da presidente eleita, Dilma Rousseff,¿ em sua maioria militantes do PT, eleitores da petista e aventureiros que aproveitaram o evento para conhecer a cidade ¿ movimentaram as áreas de desembarque do aeroporto e da rodoviária de Brasília nos últimos dias. ¿Será um momento inédito. A primeira presidente eleita do país dará continuidade aos projetos políticos do maior presidente da história do Brasil¿, comemora a petista gaúcha Maria Helena Cordeiro, 63 anos, que desembarcou na última quinta-feira para ver a posse de Dilma.

A chegada dos visitantes é menor do que a registrada no fim de 2002, antes do presidente Lula ser empossado no Palácio do Planalto, mas empolga os viajantes. Hélida Catelan, 52 anos, outra gaúcha filiada ao PT que veio a Brasília prestigiar o evento, se orgulha do momento. ¿Votei nela pela identidade partidária e pelo projeto político apresentado. Ainda me orgulho por ela ser gaúcha (Dilma nasceu em Minas Gerais e fez carreira política no Rio Grande do Sul)¿, diz. As duas petistas irão cedo à Praça dos Três Poderes para ficarem próximas ao Palácio do Planalto, onde Dilma fará o pronunciamento à nação. ¿A ideia é chegar o mais cedo possível. Em 2003, fiquei bem na grade, em frente ao Planalto porque cheguei 9h¿, conta Maria Helena. ¿Como boa petista, vamos estar fardadas (com vestimentas do partido). Será uma bela festa¿, diz Hélida.

Os professores paulistas Carlos Rogério Gonçalves e Rodrigo Ferreira, que chegaram a Brasília na última quinta-feira para ver a posse e estão hospedados em um dos albergues da cidade, pensam que Dilma será discriminada por ser mulher. ¿Quando ocorrerem as primeiras crises, acho que o preconceito contra a mulher vai ficar evidenciado. Vão jogar na cara dela¿, acredita Rodrigo Ferreira, que leciona história a alunos do ensino médio. Ele se diz simpático ao PT e votou em Dilma por considerá-la ¿muito técnica, convicta do que faz, decidida e preparada¿.

Já seu colega, que dá aula de geografia também para secundaristas em uma escola particular de São Paulo, confessa que optou por Dilma no segundo turno das eleições por falta de opção. ¿Talvez por isso, eu vou usar uma roupa mais neutra no dia da posse. Vim a Brasília mais para conhecer a capital do país. Sempre falo da cidade aos meus alunos. Tenho grande admiração por Oscar Niemeyer¿, afirma. Os dois voltam para São Paulo neste domingo.

A expectativa do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília é de que praticamente todos os 24 mil leitos disponíveis na cidade estejam ocupados. ¿O movimento nos restaurantes também vai aumentar pelo menos 10% nesse período¿, afirma Clayton Machado, presidente do sindicato