Título: Empresas resistem à transferência de vôos
Autor: Leo, Sérgio e Rittner, Daniel e Lyra, P. de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 20/07/2007, Especial, p. A4

As companhias aéreas resistem, mesmo após a tragédia do vôo 3054 da TAM, a reestruturar as malhas de vôo e deixar de usar o aeroporto de Congonhas como "hub" (ponto de distribuição de passageiros). Para as empresas, há um gargalo de infra-estrutura que impede a transferência de grande quantidade de vôos para outros aeroportos, como Guarulhos. Elas dizem que o modelo de negócios em vigor - aproveitamento de até 14 horas por dia das aeronaves para oferecer tarifas que, nos últimos anos, ficaram congeladas e até caíram em termos reais - só se sustenta com o uso de "hubs".

"Se passarmos 30 ou 40 vôos para Guarulhos, saturamos outro aeroporto da mesma forma", diz José Carlos Mollo, presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea). Segundo estudos da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), as pistas de Cumbica estão operando com cerca de 85% da capacidade. Os terminais de passageiros estão com quase 100%.

Apesar das pressões de outras áreas do governo para reduzir o número de operações em Congonhas, incluindo o Comando da Aeronáutica, a Anac vê com bastante reserva uma reestruturação da malha. Uma fonte da agência ressalta que desde que o orgão regulador substituiu o Departamento de Aviação Civil (DAC), em março de 2006, não foi dada uma única autorização para novos vôos em Congonhas. Ainda ontem, segundo a fonte, o Serviço Regional de Proteção ao Vôo de São Paulo (responsável pelo tráfego aéreo na aproximação do aeroporto) garantiu à agência que o limite máximo de 44 operações (pousos e decolagens) por hora em Congonhas não compromete padrões de segurança.

A Anac tem apostado em otimização da infra-estrutura existente para reduzir o estrangulamento de Congonhas e evitar o efeito-cascata de atrasos em vôos. Vão nessa linha sete determinações da agência à Infraero, que começaram a ser implementadas na semana passada. As determinações abrangem o número de operadores dos "fingers" (pontes de embarque), redistribuição das áreas de check-in, mais aparelhos de raio-X para dar acesso às salas de embarque e o aumento de ônibus que auxiliam o desembarque dos passageiros nas áreas "remotas" (sem pontes).

O presidente do Snea questiona a viabilidade de transferir vôos para Cumbica e Viracopos. Ele descarta a utilização do Galeão como "hub", bem como uma redistribuição dos embarques internacionais para o Rio de Janeiro. "Brasília é um hub por motivos geográficos. São Paulo é um hub por motivos econômicos. As pessoas se perguntam por que não há mais vôos internacionais partindo do Rio, mas não se preocupam em saber se há demanda suficiente", diz Mollo.

O executivo contesta a redução de vôos em Congonhas. Segundo ele, o aeroporto mais central de Londres (London City, à beira do Tâmisa) tem 60 movimentos por hora e o de Nova York (La Guardia) também opera com mais operações do que o aeroporto paulistano. Para Mollo, é irrelevante cobrar preços maiores dos passageiros que querem embarcar ou desembarcar em Congonhas, como forma de estimular a migração a outros aeroportos. "Quem usa Congonhas é a pessoa jurídica, menos vulnerável ao valor da tarifa", justifica.

O grande problema, segundo ele, é que "o terminal (aeroportuário) de São Paulo está falido". "Não houve investimento. O que houve, foi feito de forma errada."

O modelo atual de negócios começou a ser adotado em 2001, com a criação da Gol, e logo implementado pela TAM. Naquele ano, por exemplo, os aviões da Varig voavam seis horas por dia, em média, e os jatos da TAM ficavam oito horas no ar. Para tirar melhor proveito das aeronaves, as companhias foram aumentando o tempo de uso até chegar às 13 a 14 horas atuais. Resolveram apostar, também, em aeronaves maiores, com capacidade para mais de 170 passageiros, como o Airbus A320 e o Boeing 737-800.

Executivos das companhias dizem que os "hubs" são fundamentais para operar aviões desse porte, que não lotam em vôos ponta a ponta entre cidades médias. A BRA resolveu apostar numa estratégia diferente e anunciou, no mês passado, a compra de pelo menos 20 jatos do modelo 195 da Embraer. Menores, com capacidade para 118 passageiros, esses aviões viabilizam as ligações ponta a ponta, sem passar por grandes "hubs".