Título: Cuidador de idosos, atividade em alta
Autor: Fariello, Danilo e Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 20/07/2007, EU & Fim de Semana, p. 4

Em "Como Água para Chocolate", Laura Esquivel abre sua novela sobre a personagem Tita com o drama do cuidador. Aos 15 anos, preparando uma receita, Tita conta à mãe a intenção de um seu pretendente de pedir-lhe a mão. Com olhar de educadora rija, a matriarca sentencia: "Sabes muito bem que, por ser a mais nova das mulheres, és responsável por cuidar de mim até o dia da minha morte." Tita, envolta em dúvidas, gostaria de saber quem começou essa tradição familiar. Diz ela: "Seria bom fazer saber a essa engenhosa pessoa que em seu perfeito plano para assegurar a velhice das mulheres havia uma ligeira falha. Se Tita não podia se casar nem ter filhos, quem cuidará dela quando chegar à senectude?"

A literatura parece muito mais atenta ao problema do cuidador do que as políticas públicas. Mas o cuidador aos poucos ocupará no mercado de trabalho um espaço tão significativo como hoje é o das babás. Essa inversão é uma conseqüência da queda na taxa de natalidade. A longevidade produz uma situação cada vez mais comum: idosos cuidando de idosos. Esse exército de cuidadores de octogenários desenhará nova realidade socioeconômica. O fenômeno já atinge o Brasil. As preocupações de Tita procedem, porque, no México, 2% das idosas solteiras encontram-se na posição de filhas de chefes de família. "Provavelmente, elas nunca se casaram para poder cuidar dos pais", observa a economista do Ipea Ana Amélia Camarano, especialista em envelhecimento populacional e co-autora do texto "Famílias com Idosos: Ninhos Vazios?"

A preocupação é a realidade malthusiana que surge: uma família cada vez menor. A queda da natalidade é associada à maior participação da mulher no mercado de trabalho. "Isso pode implicar alterações na função tradicional de suporte e apoio aos idosos", afirma Ana Amélia.

O idoso brasileiro, apesar de aposentar-se saudável, em sua maioria, e ter participação significativa na renda familiar em razão do desemprego dos jovens, está sujeito aos efeitos da longevidade. "Pesquisas mostram que a dependência está mais ligada à morte do que à expectativa de vida", diz Anthony Webb, professor de Harvard e autor do estudo "Saúde e Longevidade Criam Riqueza?", publicado pelo International Longevity Center (ILC). Nesse cenário, ganha importância a figura do cuidador, familiar ou profissional. Segundo o ILC, há uma "crise do cuidador" nos Estados Unidos, onde 12 milhões de idosos precisam de algum auxílio. O ILC lançou a campanha The Caregiving Project for Older Americans para atender aqueles sem auxílio de planos de saúde ou da família.

Já o Japão passa por uma fase de transição na qual o Estado divide com a família o cuidado do idoso. Paralelamente à previdência, há a colaboração (descontada como a contribuição para a aposentadoria) para os cuidados de longo prazo. Tanto do trabalhador da ativa como do aposentado. Uma das novas ações é a licença de trabalho para o cuidador, algo como a licença-maternidade. O cuidador ganha 40% de seu salário para licenças de quatro a seis meses só para tratar do idoso. Conta ainda com políticas de isenção de impostos, treinamento e descanso de uma semana ao mês.

Todas essas políticas visam a adaptar as demandas da longevidade ao perfil da população economicamente ativa. Para Webb, é preciso considerar o aumento de participação na PEA das idosas e cuidadoras. A ausência de políticas trabalhistas nesse sentido pode significar um incentivo para faltas ou aposentadorias precoces. A trabalhadora pode deixar o mercado em sua fase mais produtiva e comprometer o crescimento econômico. Afinal, a mulher de hoje é bem diferente de Tita.