Título: Um casal feliz para sempre
Autor: Fariello, Danilo e Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 20/07/2007, EU & Fim de Semana, p. 4

Lygia Daudt Lyra da Veiga e Fábio Penna da Veiga, casal que completou 70 anos de união: "A maior virtude a ser cultivada na velhice é a humildade, são muitas limitações e precisamos saber aceitar ajuda", diz ela Na época em que eles nasceram, viver 70 anos já era considerado um feito e tanto. Completar 70 anos de casado era algo que jamais passaria pela cabeça de alguém nos idos de 1915 - e hoje tampouco. Mas Lygia Daudt Lyra da Veiga e Fábio Penna da Veiga desafiaram as estatísticas daquele tempo e hoje - 70 anos de casados, ela com 93 e ele aos 102 de idade - são retrato dos novos tempos e do novo paradigma da longevidade.

A vida confortável que ambos levam na mesma casa, no Rio de Janeiro, em que vivem há 57 anos - com o auxílio dos profissionais contratados para cuidar deles e sem precisar da ajuda, pelo menos na rotina diária, dos 7 filhos, 20 netos e 25 bisnetos - é conseqüência de muito trabalho, mas também de planejamento e previdência. A lucidez de ambos também é fruto de uma vida bastante ativa, que sempre buscaram ter ao longo das décadas.

Veiga trabalhou ativamente até os 85 anos na construtora que ele montou ainda jovem com um sócio. Até completar 100 anos de idade, mesmo afastado do dia-a-dia dos negócios e da rotina da companhia, ainda freqüentava o escritório todos os dias pela manhã.

"Comecei a trabalhar na construtora em 1940", conta ele. Mas Lygia corrige, com sua memória impressionante. "Não. Foi em 1938", garante ela. Uma das lembranças mais afetuosas do construtor é a de ter acompanhado as obras de construção do Corcovado. "Eram uns amigos meus que o faziam e eu sempre ia lá para acompanhar as obras", recorda-se o empresário, que também construiu vários prédios na orla de Copacabana.

Os elogios mútuos entre Lygia e Veiga sinalizam que o casamento também é longevo e tem resistido firme ao passar de sete décadas. "Admiro muito a serenidade do Fábio e também seu bom humor permanente", conta Lygia, que não perde a oportunidade de incluir o gosto do marido pela literatura. "Fábio gosta de recitar Luiz de Camões. É o seu poeta favorito."

Já Veiga revela as habilidades da mulher com a tecnologia. "Lygia sabe usar computador", comenta ele, em tom de inconfidência. O empresário orgulha-se também das obras assistenciais das quais ela participa de forma sistemática. "Ela já fez 65 bazares aqui. São mais de 30 anos nessa atividade", prossegue.

O casal Lygia e Veiga admite que apesar das inúmeras vantagens da longevidade, há também alguns dissabores. "A maior virtude a ser cultivada na velhice é a humildade", observa Lygia. "São muitas limitações e precisamos saber aceitar ajuda, assim tudo fica mais fácil."

Outro motivo de tristeza e desalento são os amigos já mortos. "O Fábio ainda tem uma irmã que completou 100 anos. No entanto, eu, infelizmente, perdi muitas pessoas amigas, mas eu tive a felicidade de saber e conseguir renovar meu círculo de amizades", conta ela. Lygia se refere às parceiras da Pequena Obra Nossa Auxiliadora (Ponsa), que atende a crianças e a adolescentes no Morro Dona Marta, no Rio de Janeiro. "Elas são como irmãs para mim", afirma Lygia.

Segundo Lygia, para viver bem é preciso ter sempre um objetivo, estar constantemente se renovando e se adaptando aos novos tempos. "Não se pode ficar naquele saudosismo", concordam os dois. Além disso, a receita do casal-70 inclui massagens e fisioterapias freqüentes, que ambos fazem, e uma previdência financeira desenvolvida e conquistada ao longo da vida. "São respaldos importantes", recomenda a expert Lygia. Mas o segredo para viver tanto, diz a sabedoria centenária de Veiga, é "deixar o tempo passar". Poético, como ele gosta.