Título: Fosso do prestígio local foi a eleição do PT ao governo
Autor: Cruz, Patrick e Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 23/07/2007, Política, p. A12

Eleito deputado estadual em 1954, três vezes deputado federal, prefeito de Salvador, três vezes governador da Bahia, ministro das Comunicações, duas vezes senador, Antonio Carlos Peixoto de Magalhães construiu uma estrutura regional de poder na Bahia com raros padrões de comparação no Brasil. Da sua condição de cacique local, negociou com o governo federal em uma posição ímpar de força.

Desde a morte do filho Luís Eduardo Magalhães, em abril de 1998, ACM atravessava um lento e constante processo de decadência da sua influência nacional e de seu poderio na Bahia, que culminou com a derrota eleitoral no ano passado para o PT. Mas este ano, ainda deu uma demonstração de seu prestígio ao receber a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva por ocasião de sua primeira internação, em março. ACM retribuiu a visita ao ter alta com uma ida ao Palácio do Planalto.

Ao longo do primeiro mandato de Lula os sinais de sua debilidade política se avolumaram. A partir de 2002, pela primeira vez desde o início de sua vida pública, esteve distante da rede de alianças que colocou um presidente da República no poder. Sua participação na eleição de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência em 2002 foi pouco além de uma declaração de voto no segundo turno. Em 2006, combateu a candidatura petista de modo decidido, o que foi uma das razões para a derrota na Bahia do então governador Paulo Souto, que tentava a reeleição sob o manto do carlismo, para Jaques Wagner (PT).

ACM naquela campanha cometeu dois erros fatais, segundo relato de correligionários no Estado , feitos logo depois da eleição: partiu para o confronto total com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no momento em que o então candidato à reeleição presidencial ostentava índices de intenção de voto superiores a 70% no Estado e ainda reforçou a ligação de Souto com o seu grupo, incentivando a federalização da campanha.

No primeiro ano de administração do petista, ACM tentou se credenciar como interlocutor confiável para o governo junto à oposição, mantendo contatos freqüentes com o então ministro da Casa Civil, José Dirceu. O PT não criou obstáculos para que o senador escapasse de um processo por quebra do decoro parlamentar, logo no segundo mês de seu mandato. ACM era acusado de envolvimento em escutas telefônicas clandestinas. A tentativa de aproximar-se do petismo custou até uma ameaça de expulsão de ACM do partido, logo abandonada.

O auge do poder de ACM, tanto no cenário nacional como local, se deu entre 1994 e 1998, no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso. Nunca houve, na história da Bahia desde a independência, um político tão influente no plano federal. ACM chegou pela primeira vez ao Senado tendo em seu grupo político o governador da Bahia, os outros dois senadores do Estado e a maior parte da bancada federal. Na presidência da Câmara, seu filho Luís Eduardo trabalhou para a sua eleição à presidência do Senado, enquanto ACM costurava a candidatura do herdeiro para o governo baiano em 1998 e para a Presidência da República em 2002.

Chegou a ter, nesta fase, o apoio de 28 dos 39 deputados da Bahia e dois ministros na Esplanada simultaneamente: o da Previdência o de Minas e Energia, no momento em que reformas constitucionais e privatizações destas áreas eram o tema do Legislativo. Reeditou assim o poder que exerceu no governo Collor, quando controlava o ministério da Educação e o de Desenvolvimento Regional, com a diferença de que ACM ganhou força naquele governo no momento de seu colapso, semanas antes do impeachment. Já no governo Fernando Henrique, ACM assumiu uma posição central desde o início.

Ele e o filho comandaram todas as votações de interesse do governo, inclusive as da emenda que permitiu a reeleição de Fernando Henrique. Com Luís Eduardo morto, ACM entrou em declínio no segundo mandato de FHC: não conseguiu fazer seu sucessor à presidência do Senado, perdeu as duas Pastas que tinha no primeiro escalão e teve que renunciar ao mandato para não ser cassado pela suspeita de ter violado o segredo de voto da sessão que cassou o mandato do senador Luiz Estevão. Em 2002, voltou ao Senado com uma votação proporcional menor que a obtida oito anos antes. (CF)