Título: Vaidade levada a sério
Autor: Batista, Vera
Fonte: Correio Braziliense, 01/01/2011, Economia, p. 9
Cuidar da aparência muda hábitos de consumo e entra no orçamento do brasileiro. A indústria festeja e se prepara para atender à demanda, que crescerá 30% ao ano
Confiante e com dinheiro no bolso, o brasileiro está mais vaidoso. A nova classe média, que por tanto tempo reprimiu desejos de consumo até então considerados supérfluos, agora compra saúde, autoestima e bem-estar para si e para o lar. Tudo em suaves prestações. Os setores de higiene pessoal, beleza e produtos de limpeza vivem seu melhor momento e projetam para as próximas décadas saltos promissores. O avanço dessa indústria mostra o quanto o crescimento econômico é capaz de consolidar mudanças de hábitos e de impulsionar tendências.
O Brasil já é o terceiro mercado em produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos, atrás apenas de Estados Unidos e Japão. Diante do aumento dos lucros, as empresas se preparam para atender a uma demanda que promete crescer a taxas de 30% ao ano. Os empresários temem, no entanto, que os esforços feitos até aqui se percam e o potencial de expansão seja desperdiçado (leia mais na página 10). As atenções estão voltadas para a presidente eleita, Dilma Rousseff, e os rumos que o próximo governo dará aos investimentos programados pelas companhias.
Os preços dos artigos de higiene e limpeza, que já caíram cerca de 35% nos últimos oito anos, com a demanda aquecida, ficarão muito mais acessíveis. Quem antes pouco se preocupava com a aparência, acostumou-se a olhar de frente para o espelho. Exemplo da mudança de comportamento é a babá Sinara Katiussa de Oliveira, 19 anos. Vaidosa, ela engrossa o número dos que consomem produtos de higiene e beleza. Casada há um ano, ela e o marido têm renda de R$ 2.250 e gastam, mensalmente, até R$ 350 com shampoos, cremes para o cabelo e para o corpo, sabonetes, protetor solar, brilho labial e esmaltes. Além dos cuidados básicos, Sinara faz escova progressiva e mudou o perfume quando começou a trabalhar. ¿Agora, uso um Prada. Gosto de me cuidar e se puder vou aumentar os gastos.¿
A Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins (Abipla) comemora. Estudos do Euromonitor Internacional mostram que, de 13 mil consumidores pesquisados entre janeiro de 2009 e janeiro deste ano, 98% das pessoas mantêm gastos com produtos de limpeza, o que demonstra, na opinião da presidente executiva da entidade, Maria Eugênia Saldanha, o quanto esses itens representam para a saúde e o bem-estar da população. Pela primeira vez, o setor comemora desempenho na casa dos dois dígitos: cresceu 11%, em 2010, em relação a 2009, e espera, para 2011, a mesma expansão sobre o faturamento de R$ 13,5 bilhões deste ano. ¿Ainda temos muito espaço para crescer¿, ressalta Maria Eugênia. Em 2009, auge dessa indústria, o país concentrou 5% das vendas mundiais, que totalizaram US$ 122,4 bilhões.
Sorriso bonito
Saúde fraca e nenhuma expectativa de melhoria de vida já levaram o eleitor de baixa renda a trocar o voto por uma dentadura. A parcela pobre da população, aos 30 anos, tinha a aparência de 50 anos, ou mais. Hoje, homens e mulheres de todo o país não perdem mais os dentes na juventude e nem exibem rugas precoces. A procura por reabilitação oral cresceu 12% nos últimos 5 anos e os preços caíram de 30% a 40% de dois anos para cá ¿ principalmente o custo dos implantes dentários. Em alguns casos, o barateamento da cirurgia plástica foi de 50%, no mesmo período. O pagamento por dentes novos ou por uma aparência mais jovem pode ser feito em 10 ou 12 vezes no cheque pré-datado ou no cartão de crédito.
A nova classe média deu adeus aos remendos quando o assunto é beleza e cuidados com a aparência. A indústria e os profissionais do ramo desenvolvem a cada dia materiais mais baratos e métodos mais atraentes. Mesmo quem não tem os 32 dentes na boca pode colocá-los por cerca de R$ 5 mil (implantes de apoio e pontes fixas) a aproximadamente R$ 20 mil (um a um, separadamente). O procedimento pode custar R$ 65 mil, se o material for importado. ¿A falta de dentes interfere na mastigação, na estética e na fonética¿, explica o odontologista Edmundo Souza Júnior, da Orthos Odontologia, que diz que o fluxo de pessoas das classes C, D e E aumentou muito nos consultórios.
Oportunidade
A servidora pública Luiza Pettená Villarinho, 23 anos, não se considera entre as mais cuidadosas, mas usa um creme para as mãos, outro para o corpo e mais um para os pés. É casada e tem renda mensal de até R$ 7 mil ¿ gasta R$ 300 com produtos de beleza e higiene pessoal. Luiza considera o marido mais vaidoso que ela. ¿A autoestima melhora quando se cuida da aparência. Meu marido está certo¿, comemora. Como ele, a auxiliar de serviços gerais Andreia Carneiro da Silva, 24 anos, acredita que todos devem cuidar da beleza, independentemente da classe social ou da condição financeira. Andreia é casada, tem renda mensal de R$ 1,2 mil e não sai sem um batom na boca, as unhas bem feitas e os olhos pintados. Na sua opinião, nenhuma mulher vive sem um hidratante. ¿Gasto R$ 250 por mês com produtos de beleza e higiene pessoal. Faço opção por produtos de qualidade e de boa duração¿, resume.
Esse novo perfil da sociedade abriu espaço para novos tipos de serviço. A BIway Consulting, por exemplo, especializada em soluções para aprimorar a gestão e a análise de negócios. Levando em consideração que, em 2010, mais de 30 milhões de brasileiros ascenderam à classe média (representa mais de 50% da população nacional), o foco é melhorar o atendimento ao comprador e saber avaliar o preço, a eficiência da assistência técnica e o cuidado com o design. As empresas dos setores de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos e de produtos de limpeza aceitaram o desafio.
¿Gasto R$ 250 por mês com produtos de beleza e higiene pessoal. Faço opção por produtos de qualidade e de boa duração¿ Andreia Carneiro da Silva, auxiliar de serviços gerais