Título: Alta nas alíquotas de importação divide o setor têxtil
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 23/07/2007, Especial, p. A16

A decisão do governo brasileiro de elevar as tarifas de importação para tecidos e vestuário - ainda em discussão no Mercosul - rachou o setor têxtil. Pequenas e médias confecções estão tão preocupadas com o aumento do custo da matéria-prima, que preferem abrir mão da maior tarifa para seu produto. As grifes de moda também são contra a medida, porque não encontram os tecidos que necessitam no Brasil. Já as tecelagens prometem insistir na alta da tarifa e argumentam que também sofrem com a concorrência asiática.

"Se sobe a tarifa para confecção, a matéria-prima vai pedir o mesmo. Nós queremos é tecido barato", diz Roberto Chadad, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Vestuário (Abravest), que reúne 17 mil pequenas e médias de confecções, parte delas localizadas nos bairros do Bom Retiro e Brás, em São Paulo. "Nenhum país promove aumento de matéria-prima. Isso é inédito no mundo", completa.

Para o diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel, as tecelagens também estão sendo prejudicadas, porque a significativa apreciação do câmbio erodiu as tarifas de importação. "Defenderemos a nossa proposta em praça pública. Está em risco o sétimo maior parque produtivo do mundo", diz. O empresário diz que a Abit tem uma visão integral da cadeia produtiva, mas que o eixo central é a confecção. "Temos conselheiros de todos os elos da cadeia", reforça.

A Abit solicitou ao governo brasileiro a elevação da tarifa de confecção para 35% e de tecidos para 30%. A medida, já aprovada pela Argentina, ainda está em estudo pelos sócios menores do Mercosul. O Paraguai concorda com a elevação da taxa para confecção, mas é contra para tecidos, porque é importador de matéria-prima. O Uruguai resiste em aprovar a medida mesmo para confecções, porque concedeu recentemente apoio ao setor.

Segundo Pimentel, a elevação da tarifa para tecidos é necessária para manter a escalada tarifária existente no setor. Por isso, defende que o governo brasileiro adote um "waiver", uma espécie de licença para elevar as tarifas de tecidos e confecções sem a aprovação do Mercosul. Atualmente, as tarifas de importação brasileiras estão em 20% para confecções, 18% para tecidos, 16% para fios e filamentos e 14% para fibras de algodão.

Na próxima quarta-feira, representantes da Associação Brasileira dos Importadores de Matérias-Primas Têxteis (Abitex) se reúnem com o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, para debater o assunto. "Temos muita dificuldade para conversar com o governo sobre esse tema", reclama José Marcos de Oliveira, presidente da Abitex. Ele afirma que as tecelagens nacionais abastecem apenas 10% do consumo brasileiro.

A entidade enviou uma nota técnica para a Desenvolvimento e a Fazenda com os argumentos contra a elevação da tarifa para tecidos. Segundo o documento, o aumento do custo da matéria-prima anularia os benefícios obtidos pelas confecções com alta da tarifa de importação do vestuário. As tecelagens seriam as maiores beneficiadas, já que o governo não cogita elevar as taxas para a compra de fios no exterior. Conforme a nota técnica, o vestuário concentra 66% dos postos de trabalho do setor, gerando 1,7 milhão de empregos.

O documento aponta que o vestuário representa 0,70% da produção industrial total do país, contra 0,25% da tecelagem. Outro argumento do estudo é que os tecidos importados representam 6% do consumo, abaixo dos 19% de participação dos importados no consumo de bens industriais. Segundo a Abitex, 92% dos tecidos produzidos no país são destinados às confecções locais.

A nota técnica preparada pelos importadores de tecidos aponta também que as importações do setor não atravessam um surto. As compras externas de tecidos de seda e algodão - os dois mais produzidos pelo país - aumentaram, respectivamente 29% e 55% de janeiro a maio desse ano em relação a igual período de 2006. A única exceção são os tecidos de malha, cujas importações aumentaram 300%, influenciadas pela moda de blusas e vestidos de malhas leves. O estudo entregue ao governo argumenta ainda que tarifa praticada no Brasil já é superior a do México, Rússia, Coréia do Sul, Estados Unidos e União Européia, entre outros países.

"A indústria têxtil no Brasil sofreu alguns reveses dos planos econômicos e não acompanhou o desenvolvimento do resto do mundo", critica a estilista Clô Orozco, proprietária e diretora de estilo das marcas Huis Clos e Maria Garcia. Ela afirma que 70% dos tecidos que utiliza são importados. A estilista consegue no Brasil apenas algodão e alguns tipos de seda, mas é obrigada a importar os "tecidos tecnológicos", como, por exemplo, as misturas de algodão com inox e com linho. Clô Orozco diz que as altas tarifas de importação de tecidos afetam a competitividade de sua empresa no exterior.

Segundo a Abitex e a Abravest, o Ministério da Fazenda solicitou ao setor um estudo sobre o impacto da inflação de um eventual aumento da tarifa para tecidos. Para os varejistas, apenas a alta das taxas para confecção gerariam reajuste de 15% nos preços. A Abit refuta a tese de que a medida pode gerar inflação, por conta da forte concorrência que existe no setor.