Título: O Ministério da Saúde, o BNDES e a indústria de produtos hospitalares
Autor: Souza, José Henrique e Matsumoto, Wellynghton
Fonte: Valor Econômico, 18/07/2007, Opinião, p. A10

No dia 07 de maio duas reportagens do Valor que abordaram propostas de integrantes da equipe de governo trouxeram "boas novas" para a indústria brasileira. Uma matéria de Sergio Leo sobre o "ministro" Coutinho (pág. A2) e a entrevista de Sergio Leo e Paulo Lyra com o ministro da Saúde José Temporão (pág. A12) divulgam argumentos a favor do apoio público aos fabricantes nacionais de material médico-hospitalar. Algumas partes da entrevista do ministro José Temporão foram reproduzidas nas semanas seguintes, em vários sites que tratam de assuntos pertinentes à indústria de material médico-hospitalar. Tal impacto não é surpreendente. A indústria de produtos médicos no Brasil vive um momento realmente delicado.

Melhorar a saúde no Brasil significa investir em equipamentos e material. Quanto mais eficientes forem as empresas nacionais que produzem esses bens, menores serão as exigências de divisas e de orçamento. Com o envelhecimento da população, a melhoria do atendimento médico demandará mais recursos. Além disso, problemas como a "gripe aviária" e da "Sars" demonstram que é preciso criar tecnologias em saúde e na produção de bens para a saúde. Depender de importações desses produtos pode ser um erro grave.

O segmento produtivo que abastece o sistema de saúde, além de gerar oportunidades de negócio, renda e emprego, aumenta a segurança no abastecimento nacional de produtos essenciais para o bem estar social. Entretanto, os dados externos do Brasil, no segmento de produtos médicos, não vêm demonstrando grandes avanços.

O comércio internacional de produtos para a saúde cresceu intensamente entre 1997 e 2004. O volume exportado a preços correntes quase triplicou, passando de US$ 115 bilhões para mais de US$ 309 bilhões, crescendo, em média, 15% ao ano; taxa superior ao crescimento das exportações mundiais (total e manufaturados) e do PIB mundial. Nesse período vários países elevaram rapidamente suas exportações. Até países de economias pequenas, como Grécia, Costa Rica e República Tcheca aproveitaram para ultrapassar os volumes exportados pelo Brasil.

-------------------------------------------------------------------------------- É igualmente possível promover um ambiente inovador com a busca empresarial por inovações e pelo mercado externo --------------------------------------------------------------------------------

Na verdade, o mercado internacional de produtos médicos é bastante concentrado. Apenas dez países controlam mais de 80% das exportações. O Brasil, o vigésimo quarto importador e o trigésimo segundo exportador, com um déficit de US$ 2,4 bilhões em 2005, é uma grande oportunidade para fabricantes locais. O ministro da Saúde tem razão quando sustenta que há um campo imenso para a indústria nacional avançar. O Brasil só não tem um saldo negativo maior do que dez de 179 países.

Temporão e Coutinho demonstraram em seus estudos que o desenvolvimento industrial envolve a entrada do país em atividades industriais novas, mais complexas, sofisticadas e que apresentem maior valor agregado e expansão futura. O apoio público setorial vinculando a demanda e o financiamento público não é novidade no Brasil e, com Coutinho no BNDES e Temporão no Ministério da Saúde, pode retornar com mais vigor.

O quadro externo do segmento sugere que uma política de apoio aos fabricantes nacionais é uma necessidade. Não se trata, obviamente, de repetir políticas intervencionistas do passado. O Estado pode desenvolver novas formas de relacionamento com as empresas eliminando o clientelismo, a corrupção e a ineficiência. As empresas também podem ampliar suas relações com o sistema nacional de inovação. É igualmente possível promover um ambiente inovador com a busca empresarial por inovações e pelo mercado externo, com compras governamentais e com especificações das agências reguladoras.

Como salientou o ministro da Saúde, grande parte do consumo de produtos para saúde, da oferta tecnológica e do financiamento às empresas está sob controle do Estado. Assim, o governo possui excelentes condições para promover a indústria de material médico-hospitalar instalada no país. O desafio é coordenar o financiamento público, a demanda governamental, a tecnologia dos centros de pesquisa e ensino e a capacidade produtiva local.

O desenvolvimento produtivo e tecnológico da indústria de bens para a saúde requer investimento em pesquisa, financiamento favorável e encomendas pioneiras. Por isso, a política de compra do Estado pode ser um instrumento eficaz e, desde que transparente, temporária e reservada a segmentos estratégicos, pode dar bons resultados. Nas palavras do próprio ministro da Saúde: "O que falta é calçar a capacidade de compra do Estado com a linha de financiamento".

José Henrique Souza é Economista e Doutor pela Unicamp, Professor de Economia da PUC-Campinas. josehenriquesouza@yahoo.com.br

Wellynghton Carlos Matsumoto e Ageu Barbosa da Silva são do grupo de estudos sobre a indústria de produtos médicos da PUC-Campinas.