Título: Proposta industrial é igual a que o país julgava 'ilegítima'
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 18/07/2007, Especial, p. A12

O Brasil está numa situação politicamente delicada com o texto para a área industrial. Trata-se de uma proposta quase idêntica a que foi feita após o fiasco de Potsdam pelo México, Chile e outros seis países em desenvolvimento e que o Itamaraty qualificou de "ilegítima".

O mediador, embaixador canadense Don Stephenson, propõe que os países em desenvolvimento aceitem coeficiente entre 19 e 23 na fórmula suíça, enquanto os países ricos aceitariam coeficiente entre 8 e 9. Significa que, enquanto Brasil e Argentina defendem reduzir as tarifas em 50%, a proposta defende algo entre 57% e 62%. Quando proposta mexicano-chilena surgiu, a diplomacia brasileira bombardeou o texto alegando que provocaria desindustrialização nas nações em desenvolvimento e não cortava as tarifas dos proponentes, que já têm alíquotas baixas.

Indagado sobre como venderia sua proposta ao Brasil, Stephenson argumentou que seu texto não representa todo o "inventário" de sugestões e que sua idéia foi de que, se aceita, resulte em ganho real para os exportadores com maior acesso aos mercados. Insistiu que as divergências na negociação industrial não representam uma divisão Norte-Sul, ricos e pobres, como se chegou a falar depois do fiasco de Potsdam. "Há posições (entre emergentes) que divergem fortemente", disse, notando que seu texto visa "apenas facilitar a negociação e não tem existência oficial e não obriga ninguém".

O mediador se inspirou no México também para propor uma nova flexibilidade: os governos que não quiserem escolher quais setores podem ser considerados sensíveis, até pela complicação política que isso envolve, podem então decidir por coeficiente mais alto, 26, que corta menos as alíquotas, mas também não exclui nada.

Ao longo de quase toda a negociação o Brasil sempre foi visto como conciliador, na reta final endureceu a posição e agora está sob pressão para mostrar flexibilidade que o setor industrial, de fato, admite ter, como chegou a constatar comissário europeu de Comércio, Peter Mandelson. "Foi muito interessante ouvir o setor industrial brasileiro", disse ele recentemente, em Lisboa.

Fontes garantem que os principais ministros não foram consultados antes sobre os tamanhos de cortes de tarifas. Mas que as cifras tanto na área industrial como na agricultura estão próximas do que estava em discussão em Potsdam - e resultou num fracasso.

"Se você olhar o documento inteiramente, verá que há alguns números realmente fortes de cortes lá", disse Falconer Crawford, o mediador agrícola. Em produtos industriais, a idéia é realmente de garantir oportunidades "substanciais" nos mercados ricos e em desenvolvimento, em particular para produtos onde os ricos ainda aplicam altas alíquotas, como têxteis, calçados e agronegócio. (AM)