Título: Anac pede a suspensão da venda de passagens em SP
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 24/07/2007, Brasil, p. A3

Em um dia de caos nos aeroportos, pilotos se recusaram ontem a pousar em Congonhas, tripulações inteiras deixaram de entrar nas aeronaves em solo por terem excedido o número máximo de horas de trabalho e a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) pediu às companhias aéreas que deixem de vender bilhetes para as próximas horas.

Para atenuar os transtornos no aeroporto de Cumbica (Guarulhos), a Infraero prometeu reorganizar, na próxima semana, as áreas de check-in ocupadas pela Varig. A antiga líder de mercado tem apenas 3% de participação nos vôos domésticos e 13% nos internacionais, mas mantém o mesmo espaço do que TAM e Gol juntas. Parte dos balcões da Varig será repassada à Gol, sua nova controladora. A Gol, por sua vez, deverá transferir à TAM alguns guichês de check-in.

Até as 19h, segundo a Infraero, 38,1% dos vôos decolaram ontem com atraso superior a uma hora e outros 20% foram cancelados. O presidente da estatal, brigadeiro José Carlos Pereira, atribuiu os atrasos ao efeito-cascata gerado pela pane ocorrida no Cindacta-4, em Manaus, na madrugada de sábado. Mas ele acrescentou um novo elemento à crise: pilotos e comissários de bordo com carga horária vencida não embarcaram em aviões preparados para decolar. Pereira disse que esse problema gerou pelo menos 14 cancelamentos no aeroporto de Florianópolis e, em menor medida, em Porto Alegre. A maioria dos vôos afetados seria da Gol.

A presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Graziela Baggio, disse ao Valor que a entidade recebeu ontem um número recorde de telefonemas de tripulantes pedindo esclarecimentos sobre normas trabalhistas para o setor. O sindicato representa pilotos e comissários. "Recomendamos a todos os trabalhadores que observem a legislação trabalhista, a regulamentação profissional, as orientações da Anac e do próprio Código Brasileiro de Aeronáutica."

Os tripulantes combinam várias cargas máximas de trabalho: 11 horas por dia (das quais um limite de 10h30 em vôo), 85 horas por mês e 230 horas por trimestre. Graziela diz perceber um movimento, por parte dos trabalhadores, de tolerância cada vez menor às pressões das companhias.

Segundo ela, o desrespeito à carga máxima de trabalho atingiu o ponto mais alto no Natal do ano passado, quando as empresas teriam pressionado as tripulações a voar além do permitido, para contornar os transtornos gerados por seguidos atrasos e cancelamentos. "Tivemos várias denúncias. Fizemos uma triagem e, de todas aquelas em que recolhemos indícios, encaminhamos à Anac, mas até hoje não recebemos resposta", afirmou Graziela.

A sindicalista disse desconhecer os problemas de ontem em Florianópolis e em Porto Alegre. Procuradas, TAM e Gol não informaram se a causa dos cancelamentos foi provocada pela falta de pilotos e comissários, mas garantiram que as tripulações não decolam com carga horária ultrapassada. Nesses casos, a decolagem só ocorre quando chega uma nova equipe.

Para o presidente da Infraero, as companhias terão que "cortar na própria carne" para solucionar a crise - o que inclui a contratação de maior número de tripulantes. "Uma das resoluções do Conac (Conselho de Aviação Civil), tomada na semana passada, é para que as companhias providenciem tripulação reserva. Ainda não houve tempo para se adequarem a essa medida", afirmou.

O certo é que esse não foi o único problema. Preocupada com a reorganização da malha aérea, afetada pelas chuvas em Congonhas, a Anac fez gestões junto às companhias para que elas interrompessem a venda de passagens para vôos de hoje, segundo informou fonte graduada do governo. Paralisar a entrada de novos passageiros no sistema seria a melhor forma de desafogar os aeroportos, que estão com as salas de embarque abarrotadas e os vôos sem previsão de volta à normalidade.

O vice-presidente de Planejamento da TAM, Paulo Castello Branco, não confirmou o pedido da Anac, mas disse que a empresa tomou espontaneamente a decisão de suspender as vendas de bilhetes para Congonhas no próximo fim-de-semana. A maioria dos vôos já está com alta taxa de ocupação, por ser volta das férias, e os assentos restantes não serão mais vendidos, segundo ele. É uma forma de contribuir com o desafogo das salas de embarque e balcões de check-in, que estão em situação crítica, disse Castello Branco.

Técnicos da Anac se reuniram com executivos das empresas para iniciar a reorganização dos vôos retirados de Congonhas. Caberá às empresas escolher outros "hubs" (pontos de distribuição de passageiros) e apresentar a nova malha à agência. O presidente da Infraero admitiu que as tarifas vão aumentar com a reestruturação e os passageiros vão precisar "pagar pela segurança maior".