Título: Fé também afeta bem-estar, mas é difícil dizer como
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Fonte: Valor Econômico, 24/07/2007, Especial, p. A16

Não importa o que professem, a maioria das religiões do mundo diz que a felicidade não é tão simples quanto parece; os prazeres terrenos podem facilmente mostrar-se uma quimera e a verdadeira felicidade pode estar em superar os impulsos egoístas ou servir com devoção aos outros e a Deus. No que as religiões costumam discordar é no resultado desse esforço espiritual. Alguns falam em autodestruição, outros em união com Deus, outros em um tipo muito pessoal de recompensa. O alcorão a coloca de forma clara. "A felicidade nesta vida e no além" é prometida "aos que acreditam e levam uma vida correta" - não há outra forma. Na tradição cristã, fala-se muito no entrelaçamento de prazer e dor: não se pode ter um sem o outro. Alguns monges cristãos cultivam um estado conhecido como "charmolypi", prazer-dor: lágrimas pelas aflições do mundo e gratidão pelo perdão de Deus.

Mas, em um nível mais terreno, os sociólogos concordam que a prática da fé e a ampla felicidade com a vida parecem estar relacionadas, embora ninguém tenha muita idéia do motivo.

"Não sabemos se as pessoas vão à igreja porque são felizes ou se são felizes porque vão à igreja", diz Andrew Clark, economista que ajudou a elaborar pesquisa junto a 30 mil europeus em 12 países.

Mas, se a religião é um fator significativo para deixar as pessoas satisfeitas, presumivelmente isso deveria transparecer em algum lugar das pesquisas globais de bem-estar, como a do Gallup, já mencionada no texto acima.

Dalia Mogahed, que supervisiona uma pesquisa do Gallup sobre a opinião islâmica, fez algumas observações contundentes sobre o trabalho. Há muitos países muçulmanos, destaca, nos quais homens e mulheres estão descontentes com a vida. No entanto, dos dez lugares com maior correlação entre ser mulher e sentir-se (relativamente) satisfeito, nove são predominantemente islâmicos: Afeganistão, Irã, Egito, Turquia, Emirados Árabes Unidos, Bangladesh, Palestina, Jordânia e Marrocos. Mogahed diz que isso reflete tanto as dificuldades de ser um homem como as bênçãos de ser uma mulher no islamismo. Em regiões tradicionais, nas quais se espera que o homem sustente a família, muitos sofrem com o trauma de estar desempregados ou em trabalhos muito duros ou mal remunerados. Outro fator, acredita, é que uma grande fonte de pobreza de crianças e mulheres no Ocidente - as mães solteiras - praticamente não existe nas sociedades islâmicas.

Alguns podem achar que tais conclusões são muito complacentes em relação ao destino das mulheres muçulmanas. Margot Badran, estudiosa americano do feminismo em países islâmicos, diz que, em muitos deles, há um senso palpável de descontentamento entre as mulheres. "Mas isso não implica que são miseráveis ou consumidas pelo complexo de vítima. Diz apenas que precisamos de um quadro com mais nuances sobre a vida do que qualquer mero espectro de felicidade pode capturar."