Título: Brasil terá até 2017 para cortar tarifas, dizem EUA
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 26/07/2007, Brasil, p. A2

Os Estados Unidos criticaram ontem o Brasil e a Argentina pela resistência a fazer corte ambicioso de tarifas industriais, o que provoca forte polarização entre emergentes. Washington minimizou o argumento dos dois países de que isso provocaria perda maciça de empregos e desindustrialização e insistiu que quem já liberalizou está mais competitivo.

Peter Allgeier, o embaixador americano na (OMC), alegou que, primeiro, o Brasil e a Argentina terão flexibilidades para excluir completamente de cortes 5% das linhas tarifárias ou cortar menos em 10% delas. E segundo, o novo texto industrial sugere que os cortes ocorram em tamanhos iguais ao longo de oito anos, prazo que considera suficiente para os governos trabalharem "os ajustamentos" no setor industrial.

Allgeier destacou que, nesse cenário, somente em 2016 ou 2017 é que as alíquotas consolidadas (a taxa máxima que podem cobrar) dos dois países vão alcançar o nível das tarifas que são realmente aplicadas hoje.

Contra outras evidências matemáticas, ele calculou que o impacto do texto industrial que está agora em debate vai ser grande nos EUA, mas não tanto nos países emergentes. Alegou que hoje a tarifa americana mais elevada, de 58,2% (para importação de calçados), cairia para menos de 8%. Enquanto isso, acha que mesmo no cenário mais ambicioso a tarifa mais alta em países como o Brasil ficaria ainda em 19%.

Indagado sobre a divisão na América Latina a respeito dos rumos da negociação industrial, o embaixador considerou a situação "interessante" e apontou uma "lição" de países do grupo chamado "intermediário", que inclui Chile, México, Peru, Colômbia e Costa Rica, que fizeram ou negociam acordos de livre comércio tanto com os EUA como com a União Européia.

"Os países que já liberalizaram seus mercados em relação aos mais competitivos no mundo ainda consideram útil ir mais além na liberalização", afirmou.

Recentemente, o Itamaraty qualificou de "ilegítima" proposta de maior abertura feita por esses países na Rodada Doha, argumentando que provocaria desindustrialização. Curiosamente, foi a mesma proposta que o mediador da negociação industrial pegou para apresentar aos membros da OMC e que ontem sofreu fortes críticas.

Allgeier advertiu que os países não podem esperar cortar menos tarifas ou proteger setores e ao mesmo tempo achar que os EUA vão fazer corte pleno de tarifas para os mesmos produtos - ou seja, quem quer acesso ao mercado tem que pagar a contrapartida.

Os têxteis, um dos produtos de maior interesse das nações em desenvolvimento, que hoje sofrem tarifas elevadas para entrar no mercado norte-americano, mas que pelo texto em debate terão de ficar abaixo de 10%, foram dados como exemplo.

"Teremos definitivamente um problema se os principais exportadores de têxteis protegerem seus próprios setores têxteis e de confecções e esperar que cortemos totalmente os nossos produtos. Temos sido claros ao dizer que os países não podem esperar as duas coisas", afirmou em entrevista.

Além de cobrar corte tarifário bem superior ao proposto pelo mediador, que é entre 55% e 60%, Allgeier repetiu que Washington quer completar a liberalização com acordos setoriais para eliminação ou redução mais acelerada.

Em alguns setores, ele acha que dá para fazer acordo com 75% do comércio coberto, em outros vai insistir na participação de países que façam juntos 90% das exportações - ou seja, é acordo setorial bem menos "voluntário" do que se prevê. (AM)