Título: Investimento no setor encolhe, mesmo após crise
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 27/07/2007, Brasil, p. A8

Mesmo com o forte aumento no movimento de passageiros, o governo Lula está investindo, a cada ano, menos no setor aéreo do que seu antecessor fez nos dois últimos anos de seu mandato. De 2003 a 2007, a execução orçamentária dos três principais programas do setor - proteção ao vôo e segurança do tráfego aéreo, desenvolvimento da aviação civil e desenvolvimento da infra-estrutura aeroportuária - teve seu maior desembolso em 2005: R$ 1,050 bilhão. Considerando valores corrigidos, em 2001, o governo Fernando Henrique Cardoso liberou R$ 1,060 bilhão e, em 2002, R$ 1,169 bilhão.

Em 2005, o melhor ano da gestão Lula em termos de investimento no setor, houve aumento de 16,17% no movimento de passageiros nos aeroportos administrados pela Infraero. Esse aumento da demanda não surpreendeu porque o ano anterior, 2004, já tinha registrado elevação de 16,13% sobre o total de embarques e desembarques.

Os três principais programas do sistema aéreo, sob a gestão do Comando da Aeronáutica (Ministério da Defesa), não incluem os investimentos da estatal Infraero. Para este ano, o Orçamento Geral da União prevê R$ 999,8 milhões para os três programas, valor inferior, novamente, ao que foi gasto em 2002, último ano da gestão FHC. Já a Infraero tem previsão de investimentos de R$ 1,002 bilhão.

Ao analisar os números do orçamento, o economista e consultor da organização não-governamental Contas Abertas, Gil Castello Branco, cita um trecho de um acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU). Em 16 de dezembro de 2006, os ministros daquela corte afirmaram que "o chamado apagão aéreo nada mais é do que uma sucessão de equívocos quanto aos cortes nas propostas orçamentárias elaboradas pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), contingenciamento de recursos para o setor, indolência em relação às necessidades de expansão e modernização do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro (Sisceab) e quanto à ineficiente política de alocação de recursos humanos".

Procurada pelo Valor, a assessoria do Ministério do Planejamento explicou que, a partir de 2003, as aplicações de recursos retornaram ao nível do período 1997/1999 porque os investimentos necessários ao reaparelhamento da infra-estrutura de comunicação já haviam sido feitos. Um investimento maior para compensar a defasagem ocorrida foi realizado entre 2000 e 2002, diz o Planejamento, tornando imperfeita a comparação com o momento atual.

Segundo o Ministério do Planejamento, o período 1996-2006 teve R$ 3,7 bilhões em empenhos para ampliação, modernização e manutenção do Sisceab. Em valores corrigidos, chegam a R$ 5,7 bilhões. Em relação ao Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam), que integra o Cindacta IV, foram investidos R$ 1,6 bilhão de 2000 a 2006. Corrigidos, são R$ 2,7 bilhões.

Castello Branco ressalta, contudo, que a Resolução n 5 do Conselho de Aviação Civil (Conac), de 30 de outubro de 2003, recomendou à Casa Civil e aos ministérios da Fazenda e do Planejamento que os recursos dos fundos Aeronáutico e Aeroviário fossem liberados para o adequado planejamento das atividades do então Departamento de Aviação Civil (DAC), antecessor da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e do Decea.

Apesar da recomendação assinada pelo então ministro da Defesa, embaixador José Viegas, o Decea pediu, de 2004 a 2007, orçamento de R$ 2,569 bilhões, mas foram aprovados R$ 1,979 bilhão. A diferença foi de R$ 590 milhões.

Na pré-proposta orçamentária de 2006, o Decea alertou, em 2005, que não atender aos pleitos teria como conseqüência atrasos e congestionamentos nos principais aeroportos, maior tempo de espera entre pousos e decolagens em um mesmo aeroporto e aumento considerável do consumo de combustível de aviação, o que refletiria nos preços das passagens.

Mesmo ciente dessa advertência, a Casa Civil respondeu ao Decea, em agosto de 2005, que "a política de contingenciamento de recursos não prevê exceção, sendo esta uma posição definitiva do governo". Foi sugerido ao Ministério da Defesa que buscasse diretamente com a Fazenda e o Planejamento a liberação dos recursos. Castello Branco conclui que o governo usou os recursos dos Fundos Aeroviário e Aeroportuário para fazer superávit primário. Depois de deflagrada a crise aérea, no segundo semestre de 2006, o Fundo Aeronáutico acumulava R$ 2,146 bilhões. Ele é integrado pelo pagamento de tarifas recolhidas pelas empresas aéreas e passageiros.

Gil Castelo Branco afirma que o Ministério do Planejamento acenou com a liberação de três parcelas do Fundo Aeronáutico: R$ 123 milhões em agosto deste ano e R$ 121 milhões em 2008 e 2009. Para dar uma noção da importância dos recursos contabilizados no fundo, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) destinou R$ 3 bilhões para os aeroportos no período 2007-2010. Ontem, o ministro Paulo Bernardo anunciou que mais R$ 2 bilhões serão remanejados para o setor aéreo, elevando para R$ 5 bilhões os recursos do PAC para o setor até 2010.

A crise deflagrada depois do acidente com o avião da Gol, em setembro de 2006, fez com que o governo aumentasse o ritmo de liberação dos recursos para os três principais programas do sistema aéreo, incluindo restos a pagar, mas os montantes orçados originalmente não se alteraram. No primeiro semestre de 2006, foram pagos R$ 196,0 milhões. Até junho de 2007, foram R$ 350,5 milhões.