Título: China está disposta a barganhar com emergentes na OMC
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Fonte: Valor Econômico, 27/07/2007, Brasil, p. A3

A China pavimenta o terreno para barganhas com o Brasil e outros países emergentes na próxima fase das negociações agrícola e industrial, na Organização Mundial do Comércio (OMC), em setembro. Reconhecido como principal ganhador se as tarifas industriais caírem globalmente, a China apoiou ontem explicitamente o Brasil contra a proposta de altos cortes de alíquotas nos países em desenvolvimento.

Ao apoiar os protecionistas na área industrial, os chineses esperam que o Brasil ajude a acomodar suas posições mais defensivas na negociação agrícola, que inclui mecanismo para facilitar frear súbito aumento de importações.

A proposta moribunda do mediador industrial na OMC é para os 31 países em desenvolvimento que serão afetados cortarem tarifas industriais entre 55% e 62%. A China acha que os emergentes precisam ter mais espaço para acomodar seus objetivos de desenvolvimento e os países ricos devem cortar mais do que o mediador sugeriu.

Os Estados Unidos ontem mesmo avisaram que as demandas não são realistas, visto que economias em rápida expansão econômica estão oferecendo pouco corte nas tarifas aplicadas.

Na quarta-feira, em reunião com a União Européia (UE), os chineses deram a impressão aos europeus de que estavam absolutamente satisfeitos com o texto industrial. A única decepção para os europeus foi que a China dá menos importância a acordos setoriais e nem quer falar em acordo envolvendo o setor químico.

Em todo caso, o apoio público chinês ao Brasil, ontem, ocorre num cenário que, para certos negociadores, repete Cancún e Potsdam, com acordo entre americanos e europeus e tentativa de dividir os emergentes. Em Cancún, em 2004, isso resultou na criação do G-20, que alterou a relação de forças na negociação agrícola. Depois de Potsdam, o Brasil conseguiu ontem ativar o G-110 (na verdade 88 países em desenvolvimento).

Desta vez, porém, a divisão entre os emergentes está escancarada também na área industrial, com um grupo chamado de "intermediário", com membros que não hesitam em alvejar o Brasil.

Foi o que fez a Costa Rica, pequeno país da América Central. Indagou como um país que participou durante meses de negociações a portas fechadas, referindo-se ao G-4, e que terminaram em fiasco, agora se permitia criticar os países que têm posição intermediária. Já o Chile, que a princípio coordenou esse grupo, abrandou sua posição e ontem sequer mencionou negociação industrial.

Indagado se o México não temia a China ao defender altos cortes tarifários, o embaixador Fernando de Mateo reconheceu preocupação com a competitividade chinesa, mas ressalvou que seu país aciona a OMC em caso de conflitos, como agora, no qual questiona subvenções dadas por Pequim.

Enquanto o confronto prosseguia, certos delegados se inteiravam do mundo real, que quer dizer sobretudo o perigo chinês. Por exemplo, Pequim vai reduzir suas exportações de manufaturados baratos para se concentrar mais em produtos de melhor qualidade. Também chamou a atenção um novo livro, do australiano Kevin Baker, prevendo que a partir de 2010 a China vai produzir 12 milhões de carros, mais que a indústria automotiva dos EUA. (AM)