Título: Mercado vê empresa como grande incógnita
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 27/07/2007, Brasil, p. A4

A eventual abertura de capital da Infraero é um grande ponto de interrogação na cabeça dos analistas do mercado financeiro. Hoje, há um enorme desconhecimento sobre os resultados da empresa, além de muita desconfiança quanto à gestão atual da companhia, tida como ineficiente, sujeita a pressões políticas e vulnerável à corrupção. No entanto, se o governo conseguir mudar esse quadro - e, principalmente, se convencer o mercado de que as mudanças são para valer -, os analistas acreditam que a operação poderá ser bem-sucedida. O ponto é que os investidores são, acima de tudo, pragmáticos.

Para ter sucesso na abertura de capital, o governo terá de deixar claro que a gestão será profissional e não haverá ingerência política na empresa, diz o presidente da Associação dos Investidores do Mercado de Capitais (Amec), Luiz Fernando Figueiredo. Um modelo de negócios bem feito, baseado numa administração independente e com boas práticas de governança corporativa, é essencial para que o negócio possa dar resultado. "Hoje, o entendimento do mercado sobre a empresa é zero", resume Figueiredo, ex-diretor do Banco Central e sócio da Mauá Investimentos. Será necessário conciliar a necessidade de obter lucros, típica de uma companhia aberta, com o fato de que a Infraero é uma empresa que presta um serviço público nem sempre rentável.

O diretor de Investimentos da Fundação Cesp, Jorge Simino, tem opinião parecida. Segundo ele, o sucesso ou fracasso da operação dependerá do trinômio gerenciamento, governança corporativa e estrutura da operação de venda das ações. Se ficar claro que a empresa tem uma boa gestão e vai respeitar os direitos dos minoritários, a abertura de capital da Infraero interessará aos investidores. "O mercado é pragmático", diz ele, para quem o fato de a empresa continuar a ser uma estatal não é necessariamente um obstáculo ao sucesso da operação. Ele lembra que a Telebrás, em 1994, lucrou cerca de US$ 350 milhões. Três anos depois, o número ficou na casa de US$ 3,2 bilhões, devido a mudanças como o reajuste da tarifa básica de assinatura, que antes era fortemente subsidiada.

Figueiredo lembra, porém, que as ações de empresas estatais muitas vezes são negociadas com desconto, porque o grau de independência não é o mesmo de uma companhia privada, devido ao risco de ingerência política . Como o governo não pretende, ao que tudo indica, abrir mão do controle da Infraero, há uma possibilidade não desprezível de que os investidores imponham um deságio aos papéis da Infraero, avaliam participantes do mercado.

Os analistas têm dificuldade em analisar o balanço da empresa. Em 2006, por exemplo, a receita bruta atingiu R$ 2,036 bilhões, um volume considerável, que registrou crescimento de 16,4% em relação ao ano anterior. A margem bruta, que mede a relação entre o lucro bruto e a receita bruta, ficou em 26,5%. "O número parece razoável, mas é necessário comparar com o de outras empresas responsáveis pela infra-estrutura aeroportuária em outros países, para saber se o resultado é bom ou não", comenta o analista de um grande banco.

Segundo o coordenador do Núcleo de Estudos de Competição e Regulação do Transporte Aéreo (Nectar), Alessandro Oliveira, no resto do mundo, empresas de infra-estrutura aeroportuária e as que fazem parte de sua cadeia produtiva "têm reputação de serem bastante lucrativas", enquanto às companhias aéreas muitas vezes sofrem com margens apertadas. No Brasil, o quadro tem sido o inverso, nota ele. "A Infraero tem uma gestão que não é a melhor que se pode ter, sofrendo com a ingerência política", diz ele.

Oliveira acredita que a abertura de capital pode ser bem sucedida. "Tudo vai depender do desenho institucional que vai ser adotado." Uma empresa monopolista que tenha flexibilidade para cobrar tarifas adequadas tem tudo para ser rentável e interessar aos investidores - desde que seja administrada profissionalmente, diz Oliveira.

O timing da operação também é um ponto delicado. O setor aéreo passa por crise grave e a credibilidade da Infraero está baixíssima. A empresa é vista como ineficiente e vulnerável à corrupção. Outro analista diz que será necessário esperar um tempo razoável para vender parte das ações da companhia. "É necessário esperar baixar a poeira e deixar claro que a gestão da empresa mudou, assim como as práticas de governança corporativa", diz ele. Há quem acredite que é possível montar a abertura do capital em três a seis meses.

O diretor da Modal Asset, Alexandre Póvoa, tem uma visão mais pessimista sobre a eventual operação. Se quiser vender as ações por um bom preço, o governo não deve fazer a operação às pressas, avalia ele. Para Póvoa, é necessário pelo menos um ano para "limpar a casa", dar um direcionamento para a empresa, mostrar algum resultado da nova administração e montar um modelo de gestão compartilhada com o setor privado (ainda que sem abrir mão do controle da companhia). Sem esse conjunto de ações, o negócio será ruim para o governo, deixando de interessar a muitos investidores, adverte ele.