Título: Inflação castiga os pobres
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 08/01/2011, Economia, p. 15

Alta de 10,4% nos alimentos, vilões dos preços em 2010, atinge o bolso dos que ganham menos. Feijão e carne foram os que mais subiram

Em 2010, manter a dispensa cheia foi uma façanha para os brasileiros pobres. Consumidores decisivos para a eleição da presidente Dilma Rousseff, eles foram os que tiveram o orçamento mais sacrificado. No ano passado, os alimentos encareceram 10,4% e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que calcula o custo de vida para essas famílias, subiu 6,47%. As altas expressivas são um reflexo de choques de oferta e da leniência do Banco Central, que se deixou pautar pelos interesses políticos de Henrique Meirelles ¿ seu ex-presidente ¿ e afroxou o cerco à inflação.

Para o restante da população, a corrosão do bolso foi menos intensa, mas, ainda assim, pesada. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou o ano em 5,91% ¿ a maior taxa desde 2004. No ano passado, produtos tradicionais da mesa dos brasileiros registraram uma explosão de preços. O feijão carioca, o mais consumido no país, ficou 63,62% mais caro. Problemas climáticos promoveram a quebra de safras importantes e, consequentemente, a diminuição da oferta de alguns alimentos. O açúcar, por exemplo, ainda em função de uma produção menor na Índia, encareceu 25,29%.

Tendência ¿Essas questões, aliadas a demanda interna e externa, deixaram os preços em tendência de alta¿, avaliou Eulina Nunes, economista do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e responsável pelo IPCA. De acordo com Luís Otávio de Souza Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, quando os preços dos alimentos se elevam, o peso maior corrói o bolso das famílias de baixa renda, que gastam mais do seu orçamento com itens de subsistência básica. De todos os produtos, a carne tem maior impacto nas contas do brasileiro. Em 2010, o preço do produto subiu 29,64%. Se exatamente há 12 meses era possível comprar um quilo a R$ 15, em dezembro essa mesma quantidade saía por R$ 19,50.

Com os alimentos pressionando, os oito anos da era Lula acumularam uma inflação de 56,36%. Para os especialistas, o BC precisa ficar atento. Não foi apenas a redução da oferta de alimentos que causou a escalada de preços. Os serviços ficaram 7,8% mais caros, impactando fortemente nos indicadores. ¿No ano passado, houve uma aceleração grande neste item, o que mostra que temos, além de um choque de alimentos, uma inflação instalada na economia¿, afirmou Leal.

Saída é mais arrocho A presidente Dilma Rousseff não quer saber de inflação corroendo o poder de compra dos brasileiros e, por isso, determinou ao Banco Central que contenha a escalada dos preços. No seu discurso de posse, ela declarou que fará o necessário para conter essa ¿praga¿. A primeira medida nessa direção deve ser adotada em 18 e 19 de janeiro, na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). O mercado avalia que, diante dos 5,91% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2010, o BC irá promover uma elevação taxa básica de juros (Selic) entre 0,25 e 0,50 ponto percentual.

¿Estamos trabalhando, na média, com três altas, fechando uma elevação de 1,5 ponto percentual. Isso nos parece suficiente, com base nas informações que temos até agora, para ancorar as expectativas e tirar um pouco da força da inflação em 2011¿, revelou Elson Teles, economista-chefe da Máxima Asset Management. A preocupação do BC se acentuou no fim do ano passado, em função da alta nos preços dos alimentos e dos serviços, responsáveis por quase a metade da inflação. ¿O salário mínimo também entra nessa conta¿, disse Teles. (VM)