Título: Relator acatará emenda que prevê demissão de diretores de agências
Autor: Lyra, Paulo de Tarso e Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 30/07/2007, Política, p. A8

Em meio à crise do apagão aéreo e à perda de credibilidade da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o Democratas deve fazer emenda ao projeto de lei das agências reguladoras, em tramitação na Câmara, prevendo a demissão dos diretores de agências reguladoras antes do fim do mandato. As demissões ocorreriam com base no descumprimento de critérios de desempenho pré-estabelecidos. De acordo com o presidente do partido, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), a demissão deveria ser uma prerrogativa do Senado e não do presidente da República. "Agência reguladora é uma função de Estado, não de governo", justificou o parlamentar fluminense.

O projeto de lei, enviado pelo governo em 2004, está com o regime de urgência aprovado, mas só deverá ser votado no plenário em meados de agosto. O relator do projeto, deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ), admite acatar sugestões sobre mecanismos de destituição de diretores das agências. O pemedebista, porém, faz diversas ressalvas. "Não se pode abrir a possibilidade de uma demissão política, sob comoção. É preciso estabelecer regras muito claras para que seja um afastamento técnico, com critérios", disse ele ao Valor. "O mandato das agências serve para o bom funcionamento delas."

Picciani reconhece que a crise, deflagrada pela tragédia do vôo 3054 da TAM, o fez refletir sobre os comandos de todas as agências reguladoras. "O que acontece hoje com a Anac pode ser repetido em outras agências, em outro momento. Acho razoável permitir um controle social do trabalho das agências", defendeu.

Ele vê "incompetência" da Anac na regulação do setor aéreo, mas teme discutir novas regras para a demissão de diretores "sob comoção". Para ele, são frágeis as acusações de que os dirigentes da Anac não têm experiência no setor. Isso tende a prejudicar a regulação, sublinha Picciani, mas não deve ser apontado como um motivo para a destituição. "A Varig era gerida por pessoas do setor e quebrou", lembra.

Picciani defende a intensificação do controle externo das agências pelo Congresso. No máximo, segundo ele, reproduzir o sistema de intervenção na Procuradoria-Geral da República. Se o Palácio do Planalto quiser mudar o chefe do Ministério Público, precisa obter autorização expressa do Senado, mediante votação. Ele não descarta a possibilidade de incluir uma regra semelhante no caso das agências reguladoras. "Precisamos encontrar uma forma de preservar a autonomia, sem que isso sirva de guarda-chuva para a incompetência", acrescenta o deputado.

No substitutivo de Picciani, já consta a obrigatoriedade de as agências prestarem contas ao Congresso Nacional, mas o texto não fala em metas de desempenho, como quer Rodrigo Maia. "Teríamos de regulamentar as punições para o caso de as metas não serem alcançadas", disse o pemedebista, ao comentar a proposta do DEM.

Maia considera que o projeto em tramitação na Câmara enfraquece as agências. No caso da Anac, no entanto, o democrata reconhece as dificuldades operacionais da agência. "Existe um setor da aviação que é impossível desmilitarizar, como o Cindacta (órgão que pertence ao Decea, responsável pelo controle de tráfego aéreo), por exemplo", explicou o presidente do DEM. Por isso, em sua visão, a Anac não poderia funcionar simplesmente num regime em que imperem as leis de mercado, como é o caso das telecomunicações. Isso não deve, porém, disse Maia, justificar a "inoperância" da Anac. "Em qualquer lugar do mundo, as agências devem ser um instrumento de proteção ao cidadão, não de apoio ao setor privado", observou.

O PSDB não pretende propor alterações ao texto de Picciani. O líder da legenda, deputado Antônio Carlos Pannunzio (SP), disse que o partido é contra o projeto das agências proposto pelo governo. "No nosso entendimento, já é possível ser feito o afastamento dos diretores das agências. Basta ser aberto um processo administrativo no caso de alguma irresponsabilidade do gestor. Aberto o inquérito, o presidente da República pode afastá-lo de forma cautelar", sustentou.

Os deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Ivan Valente (PSOL-SP) pretendem apresentar emendas ao texto de Picciani. O pemedebista quer incluir no projeto a possibilidade de os diretores serem demitidos pelo presidente da República ou pelo Congresso Nacional. O destaque de Valente cria uma espécie de "recall" dos diretores. Na metade do mandato dos dirigentes das agências, hoje de três a cinco anos no caso da Anac, eles seriam convocados para uma nova sabatina no Senado. Caso o trabalho fosse reprovado, eles poderiam ser demitidos.

O vice-líder do governo na Câmara, Beto Albuquerque (PSB-RS), acha temerárias algumas propostas que estão sendo feitas neste momento. "Temos que tomar cuidado para não retrocedermos diante dessa crise. Precisamos, sim, definir o que esperamos das agências. Os grandes problemas não estão nelas próprias, mas na lei que regulamenta as atuações", ponderou. Albuquerque também estranha a gritaria generalizada sobre as agências. "Os tucanos criaram algumas, mas nós criamos a Anac. Se elas existem, nossa obrigação é dar condições para que trabalhem", cobrou o parlamentar.

Apesar do regime de urgência, o projeto das agências só deve entrar em pauta para votação em meados de agosto. O Congresso reinicia os trabalhos na próxima quarta-feira, dia 1º, e o presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), pôs como primeiro item da pauta uma medida provisória, trancando as votações da Casa. A semana entre os dias 7 e 9 será dedicada à conclusão da reforma política.