Título: Caça ao tesouro
Autor: Assef, Andrea
Fonte: Valor Econômico, 31/07/2007, Caderno Especial, p. F1

As condições "climáticas" da economia brasileira nunca foram tão favoráveis ao crescimento do mercado de previdência privada como nos últimos meses. De acordo com a Federação Nacional da Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), o setor captou R$ 10,323 bilhões nos cinco primeiros meses deste ano, crescendo 26,08% na comparação com o mesmo período de 2006, quando a arrecadação somou R$ 8,187 bilhões. Com a estabilidade econômica cada vez mais sustentável, a taxa de juros em queda, o Brasil a poucos passos do grau de investimento e um mercado de capitais em plena expansão, a busca por alternativas de acumulação de riqueza de longo prazo desemboca com força total nos planos de previdência aberta.

Neste cenário, além do aumento da demanda em geral, é possível observar uma procura maior pelos planos mais agressivos, que atualmente têm oferecido melhor taxa de retorno. Para atender a esse público, as seguradoras e os bancos passaram a diversificar produtos e incluir na carteira fundos mais sofisticados, que embutem maiores riscos. Na gestora Icatu Hartford, por exemplo, apenas 17% dos aportes do primeiro semestre destinaram-se a planos totalmente de renda fixa. Há um ano, os fundos de renda fixa representavam 57% do patrimônio em previdência na Icatu. Atualmente esta parcela está em 50%.

"Essa movimentação para fundos de horizonte mais longo e agressivo já era esperada pelo mercado, mas ocorreu de forma mais brusca do que se imaginava", diz Luciano Snel, diretor de vida, previdência e capitalização da seguradora. Além da migração que ocorre entre as pessoas que já estão nesse segmento, há ainda outra novidade que é a chegada de um investidor mais especializado, que sempre aplicou em fundos de ações e agora passou a enxergar os benefícios tributários dos planos de previdência. Isso vem ocorrendo com mais freqüência desde o início de 2007.

Os planos individuais tiveram um bom desempenho no período, com alta de 22,01% na captação. Entre janeiro e maio de 2007, o volume de novos depósitos nessa categoria somou R$ 7,947 bilhões, em comparação a R$ 6,513 bilhões no mesmo período de 2006. Os planos individuais confirmaram a ainda maior fatia de participação na captação dos recursos de previdência, com 76,99% do total.

Categorias como planos para menores de idade e planos para empresas registraram também aumento no volume de captação. Os dados da Fenaprevi mostram que, no período entre janeiro e maio de 2007, os planos para menores cresceram 86,38%, consolidando captação de R$ 575,9 milhões, em comparação a R$ 309 milhões no mesmo período de 2006. "Até dois ou três anos atrás, era preciso uma lupa para enxergar este segmento dentro do mercado de previdência. Atualmente tem sido uma das modalidades que mais crescem", afirma Eduardo Bom Angelo, presidente da Brasilprev, uma das maiores empresas de previdência complementar do país.

A companhia foi pioneira no lançamento de produtos para o segmento menor com o Brasilprev Júnior, que comemorou dez anos em julho deste ano.

Em 1998, os clientes de planos Brasilprev Júnior representavam 35% da base total de clientes da empresa e hoje significam 41%. Em 2006, a Brasilprev apostou em outro produto até então inédito, o Brasilprev Júnior Empresarial, voltado para filhos dos funcionários das empresas clientes. O mercado corporativo, aliás, é outro segmento que começa a despontar no setor com uma performance positiva. Os planos corporativos captaram R$ 1,799 bilhão entre janeiro e maio de 2007 contra R$ 1,364 bilhão do mesmo período em 2006. Isso representa uma alta de 31,87%.

"As pequenas e médias empresas estão enxergando o plano de previdência como um instrumento eficaz de retenção de pessoal, além de garantir a qualidade de vida do funcionário pós-aposentadoria", diz Osvaldo do Nascimento, diretor-executivo da área de vida, previdência e capitalização do Itaú e vice-presidente da Confederação Nacional de Seguros, Previdência e Capitalização. Segundo ele, a tendência deve aumentar ainda mais neste segundo semestre de 2007.

O ano, por sinal, já começou aquecido. Em janeiro, a captação de planos de previdência somou R$ 2,261 bilhões, um crescimento de 30,86% na comparação com o mesmo mês do ano anterior, quando R$ 1,728 bilhão ingressou no sistema. No mesmo período, a Bradesco Vida e Previdência bateu recorde de vendas de previdência com aumento de 41% em relação ao mesmo período do ano anterior, de acordo com os dados da Fenaprevi, instituição que sucedeu a Anapp (Associação Nacional da Previdência Privada), e que representa 83 empresas que atuam na comercialização de planos de previdência privada e seguros de vida.

"O crescimento do mercado ocorre por conta de uma situação econômica estável somada ao aumento da longevidade da população. Se antes a preocupação com a aposentadoria já era grande, agora ela é maior, uma vez que as pessoas passam quase um terço de suas vidas nessa fase", diz Marco Antonio Rossi, vice-presidente da Fenaprevi e presidente da Bradesco Vida e Previdência, que é líder no segmento com 37% de participação no mercado nacional de previdência privada.

Segundo Rossi, essa corrida em passos mais rápidos à previdência como investimento de longo prazo começou no início de 2005, quando foi implementada a tabela regressiva de imposto de renda, que permite alíquota mínima de até 10% sobre os saques nos planos após dez anos, enquanto a antiga segue a tabela progressiva tradicional, de até 27,5%. Porém, optando por essa tributação - que decresce de 35% para 10% em dez anos -, o investidor assume a responsabilidade de ficar por um bom tempo no plano. Isso porque, se resgatar no primeiro ano, por exemplo, terá de deixar 35% do ganho no VGBL para a Receita, alíquota superior à de 20% de um fundo de renda fixa.

No atual movimento que acelerou ainda mais os aportes em planos de previdência é possível observar quais produtos despontam no gosto do consumidor brasileiro. A estrela do momento é o VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), plano com possibilidade de acumulação de recursos para o futuro, os quais podem ser resgatados na forma de renda mensal ou pagamento único a partir de uma data definida pelo participante e é mais indicado para quem declara Imposto de Renda simplificado ou tem previdência complementar e/ou já abate o limite máximo de 12% da renda bruta anual.

Entre janeiro e maio de 2007, segundo a Fenaprevi, a captação de VGBL cresceu 36,92%, passando de R$ 5,165 bilhões no período entre janeiro e maio de 2006 para R$ 7,072 bilhões no mesmo período de 2007. Já o PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) - um plano de previdência complementar que permite a acumulação de recursos e a contratação de rendas para recebimento a partir de uma data escolhida pelo participante e é mais atraente para quem declara Imposto de Renda completo, podendo aproveitar do abatimento da renda bruta anual na fase de contribuição - captou R$ 1,771 bilhão. Isso representa uma variação negativa de 3,36% em relação ao volume registrado no período entre janeiro e maio de 2006, quando atingiu a marca de R$ 1,833 bilhão.

Nos últimos tempos, a previdência tem deixado de ser apenas um veículo para a conquista da renda vitalícia para se tornar uma opção de investimento para os mais variados casos de acumulação de riqueza de médio a longo prazos. Em resposta a isso, o mercado se movimenta na busca por alternativas diferenciadas que vão desde produtos com foco em renda variável até planos voltados para crianças, estudantes e até saúde, caso do PGBL Saúde, lançado em 2006 pela Bradesco Vida e Previdência.

A força de atração dos fundos de previdência privada começou a mudar no ano passado, em função da Lei 1.153, que alterou a tributação do Imposto de Renda, com a possibilidade de opção pela tabela regressiva, cujo imposto diminui à medida que aumenta o tempo de aplicação. O patrimônio do setor de previdência privada aberta ultrapassou R$ 100 bilhões em reservas, o que representa atualmente 4% do PIB. Segundo projeção do estudo da AlfaSul Capital, esse percentual deve chegar a 9,6% do PIB em dez anos.