Título: Lula reúne ministros para evitar novo apagão
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 01/08/2007, Brasil, p. A3

Desgastado com o apagão aéreo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolveu acompanhar diretamente as ações do governo para evitar outra crise de grandes proporções: um novo racionamento de energia. Ele convocou os ministros do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) para uma reunião, hoje, no Palácio do Planalto. Lula vai deparar-se com um novo ingrediente no drama vivido pelo setor: a Petrobras descumpriu o termo de compromisso assinado no início de maio com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que fixava um cronograma para aumento progressivo da disponibilidade de gás natural às usinas térmicas, e pode receber multa superior a R$ 80 milhões.

A estatal não forneceu gás suficiente para a geração de energia por pelo menos três usinas - Fafen, Termobahia e Norte Fluminense - quando elas foram acionadas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Sem matéria-prima para produzir, as térmicas não agregaram ao sistema interligado a quantidade de energia prevista e colocaram em xeque o termo de compromisso.

O Valor apurou que a Petrobras colocou à disposição das usinas 900 megawatts (MW) médios a menos do que o acordado, 2.200 MW médios, tanto em junho quanto em julho. Como as multas só poderão ser aplicadas a partir de julho, a Aneel já dispõe de cálculos preliminares que apontam uma penalidade de mais de R$ 80 milhões à estatal, conforme cláusulas do acordo.

A confusão começou no fim do ano passado, quando a agência verificou que não havia gás suficiente para abastecer todas as usinas e retirou 3,6 mil MW do cálculo de energia disponível no sistema elétrico. Para reduzir os riscos de racionamento, Aneel e Petrobras fecharam um acordo em 4 de maio pelo qual a estatal se comprometia a recuperar a oferta da matéria-prima até 2011, quando o déficit estaria todo superado.

O receio quanto à falta de insumo afastou a entrada de usinas térmicas movidas a gás no último leilão de energia, realizado na semana passada, quando a demanda das distribuidoras por eletricidade em 2010 só foi atendida graças à oferta de empreendimentos a óleo combustível.

A cúpula do setor elétrico viu esse resultado com preocupação e considerou igualmente um "fracasso" o leilão de fontes alternativas, em junho, em que não apareceram usinas eólicas e a oferta de biomassa (geração a partir do bagaço de cana) foi bem menor que a esperada. Teve repercussão negativa no governo, também, o recente estudo em que o Instituto Acende Brasil aponta que o risco de apagão chega a 32% em 2011.

Esse foi o pior cenário traçado pelo instituto, que congrega os principais investidores privados de energia no país, e estimou em até 3,7 mil MW médios o déficit de energia em 2011. No cenário mais conservador, de baixa demanda (crescimento anual da economia de 4%) e sem atraso na entrada em operação de novas usinas, o déficit deverá ser de 1,4 mil MW médios e o risco de apagão alcança 16,5%.

O sinal amarelo foi aceso de vez no governo. O próprio Lula tomou a iniciativa de convocar os ministros do CNPE. A presença do presidente dá um indício do grau de preocupação com o assunto. Lula não participou nem mesmo do encontro do CNPE em que se decidiu aprovar a retomada da usina nuclear de Angra 3.

A reunião de hoje, agendada para 9h30, pode sacramentar o veto à entrada das estatais do setor elétrico no leilão da usina de Santo Antônio, a primeira das duas hidrelétricas do rio Madeira. O Ministério de Minas e Energia corre para submeter o edital de licitação à consulta pública na semana que vem.

Defensor da proibição de Furnas participar do leilão junto com a Odebrecht, mantendo o consórcio responsável por todos os estudos do Madeira até agora, o ministro interino Nelson Hubner tem examinado cada letra do edital com a Casa Civil e o assunto poderá ser discutido no CNPE. O governo já sabe que dificilmente a usina de Santo Antônio, com potência de 3.150 MW, entrará em operação antes de 2013, e avalia que ainda não foi capaz de convencer a sociedade de que não faltará energia no início da próxima década.