Título: Código aéreo tem 55 propostas de mudança
Autor: Rittner, Daniel e Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 01/08/2007, Política, p. A7

Defasado e anacrônico, o Código Brasileiro de Aeronáutica tem 55 propostas de mudanças em tramitação só na Câmara dos Deputados. É esse o número de projetos de lei apresentados para alterar o marco regulatório da aviação no país, promulgado em 1986. Se aprovadas, as mudanças podem até atualizar vários aspectos da legislação do setor aéreo, mas ameaçam transformar o Código de Aeronáutica em uma verdadeira colcha de retalhos.

Levantamento feito pelo deputado Pepe Vargas (PP-RS) indica que apenas em 2007 foram apresentados cinco projetos de lei, tratando de assuntos diferentes: a prática de "overbooking", o atraso máximo permitido nos vôos sem indenização aos passageiros, regras para promoções de bilhetes aéreos e a titularidade de imóveis nos aeroportos, como hangares e terminais. Um dos projetos, já aprovado pelo Senado, determina o uso obrigatório de coletes salva-vidas em helicópteros que sobrevoem o mar.

"Propor uma atualização do marco regulatório da aviação civil pode ser uma das grandes contribuições da CPI", afirma Pepe Vargas. O deputado deve assumir uma subcomissão específica para modernizar o Código de Aeronáutica. O relator da CPI da Câmara, Marco Maia (PT-RS), disse que a subcomissão deverá ser criada ainda nesta semana.

A Constituição, o Código de Defesa do Consumidor, o Novo Código Civil, a Lei das Sociedades Anônimas e a Lei da Anac tornaram o Código de Aeronáutica antiquado. Ele não proíbe o "overbooking", só prevê o pagamento de despesas dos passageiros de vôos que atrasam mais de quatro horas e estipula indenizações em OTNs, unidade de referência que sequer existe mais. "A CPI ainda não tem uma proposta a ser apresentada, mas fica muito claro que o Código Brasileiro de Aeronáutica é defasado. Precisamos propor mudanças", reforça o deputado Otávio Leite (PSDB-RJ).

Até agora, boa parte dos projetos de lei apresentados altera aspectos pouco relevantes do Código de Aeronáutica. O PL 7.258, de 2006, tenta disciplinar a cobrança de bagagens especiais despachadas pelos passageiros, como bicicletas e outros materiais esportivos. Já foi, inclusive, aprovado na Comissão de Viação e Transportes. O PL 1.458, de 2007, chegou à Câmara depois de aprovação no Senado. Obriga ocupantes de helicópteros a usar colete salva-vidas "durante o sobrevôo de grandes extensões de água".

Apesar de lidar com uma questão de interesse direto da Infraero, o PL 197/07 não recebeu uma só emenda na Comissão de Viação e Transportes. O projeto, de autoria do deputado Sandes Jr. (PP-GO), atende a uma antiga reivindicação das empresas aéreas: permitir a incorporação, ao patrimônio delas, de áreas nos aeroportos como terminais e hangares. É o chamado "direito real de uso" de bens imóveis, hoje sob domínio da Infraero. Nas discussões da lei de criação da Anac, no Senado, o lobby das empresas tentou incluir esse direito até o último instante. A estatal alegou que o patrimônio público poderia ser lesado e venceu a disputa.

O PL 83/07 proíbe as aéreas de vender bilhetes "que excedam o total de assentos disponíveis em cada aeronave". Se houver descumprimento, segundo a proposta apresentada pela deputada Solange Amaral (DEM-RJ), a multa será de dez vezes o valor da passagem e o valor será revertido para o passageiro. O PL 730/07, de Eduardo Cadoca (PMDB-PE), tenta disciplinar as promoções no transporte aéreo. Obriga as empresas a "divulgar, na sua publicidade, a quantidade de assentos em cada vôo oferecidas com tarifas promocionais".

O diretor-presidente da Anac, Milton Zuanazzi, defende uma Lei Geral de Aviação para o setor. A agência chegou a criar um grupo para propor a legislação, mas os trabalhos estão atrasados por causa dos desdobramentos do acidente em Congonhas. Para Gustavo Fruet (PSDB-PR), rever a legislação é importante, mas não basta. "Nós temos que mexer, isso é fato. Mas o caos aéreo é falta de comando, não de legislação".