Título: Para especialistas em segurança, acidente do Airbus teve várias causas
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 06/08/2007, Brasil, p. A2

Especialistas em segurança de vôo e parlamentares que tiveram acesso a informações sobre o acidente da TAM chegaram a uma conclusão após uma semana de análise de dados: não há uma razão única para os acidentes aéreos, o que torna impróprias as acusações entre a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o governo federal, a TAM, a Airbus e todos os demais envolvidos com o desastre. Neste, como em todos os acidentes aéreos da história, não há apenas um fator responsável. Todo acidente aéreo é fruto de uma sucessão de erros e falhas das chamadas "barreiras de segurança".

"Nunca houve e nem haverá uma única causa de um acidente aéreo. É sempre uma conjugação de fatores", diz o deputado federal Miguel Martini (PHS-MG), da CPI do Apagão Aéreo e ex-controlador de vôo. Ele revela, por exemplo, que o choque do Boeing da Gol com o jato Legacy, em setembro de 2006, só aconteceu por uma união de 39 fatores. Em acidentes aéreos, cada um desses fatores, isoladamente, não leva a um acidente.

No caso da TAM, ainda não há evidências de tantos fatores juntos. As investigações preliminares e os dados das caixas-pretas dão conta de, pelo menos, sete fatores determinantes para o acidente. Nenhum deles, isoladamente, levaria à tragédia. São eles:

1) A posição equivocada dos manetes. Por se tratar de um erro "infantil", os investigadores suspeitam que houve uma falha em um dos computadores, que não leu a posição dos manetes. Não está descartada uma possível desatenção do comandante na hora de posicioná-los; 2) A falha na posição (ou na leitura pelos computadores) dos manetes levou à não abertura de dois dos principais recursos de frenagem do avião: os spoilers e os flaps; 3) O reverso da asa direita do avião estava com defeito. No momento do acidente, a aeronave ficou descontrolada. A turbina direita, sem o manete, acelerou. A esquerda, com o manete em funcionamento, freou; 4) A chuva deixou a pista escorregadia. Dessa forma, quando o piloto os acionou, os pedais de freio foram pouco eficientes; 5) A falta de ranhuras na pista contribuiu para que a chuva a tornasse ainda mais escorregadia; 6) A pista de Congonhas é curta e sem área de escape. O piloto tinha pouca margem de erro na hora do pouso e um problema mais sério na frenagem poderia ocasionar uma tragédia; 7) Segundo Jorge Kersul Filho, diretor do Centro de Investigações e Prevenção de Acidentes (Cenipa), um fator contribuinte para acidentes é o estresse. Na caixa-preta, o piloto mostra preocupação com o reverso quebrado e com a pista.

Esses sete fatores, isoladamente, não levariam à tragédia. Prova disso é o acidente com um avião em Taiwan, em 2004. Naquele episódio, o piloto colocou os manetes em posição incorreta. O avião entendeu que a intenção do comandante era acelerar ao invés de frear. Como a pista era ampla e tinha longa área de escape, a aeronave seguiu mais alguns metros e parou em uma vala. Ninguém morreu.

"Esse exemplo demonstra que um ou outro fator de segurança, quando falha, não leva ao acidente. São necessários vários fatores", disse um oficial do Cenipa. Se a pista não estivesse escorregadia e tivesse uma longa área de escape, não haveria acidente. Se o manete funcionasse como deveria, o reverso não teria sido tão importante para o acidente. Se não houvesse chuva, a pista não estaria escorregadia e o piloto estaria menos estressado. Se tudo funcionasse bem, ninguém reclamaria da falta de ranhuras na pista.

"É o que chamamos de barreira de segurança, que serve para evitar que falhas isoladas levem ao acidente", diz o oficial. A suspeita de falha na manutenção dos aviões da TAM, a possível incapacidade da Anac de gerir o sistema aéreo, a falta de investimentos em infra-estrutura e até a suspeita de falha técnica do computador levaram, juntos, ao acidente.