Título: Esvaziadas, sabatinas do Senado aprovam indicados sem questioná-los
Autor: Lyra, Paulo de Tarso e Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 06/08/2007, Política, p. A8

As sabatinas do Senado, criadas para ser um contraponto às indicações políticas do Executivo, transformaram-se em um processo irrelevante do ponto de vista técnico na análise de nomes para ocupar postos de direção nas agências reguladoras e nos tribunais. O Senado também imprime critérios políticos às suas sabatinas. O problema ficou mais explícito com a crise aérea e o bombardeio sobre a falta de conhecimento dos diretores da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) do setor a que deveriam fiscalizar. Mas o pouco aprofundamento no debate entre sabatinadores e sabatinados repete-se em outras inquirições.

Nas sabatinas para o Supremo Tribunal Federal, os senadores gastam mais tempo em elogios aos candidatos do que em questionamentos. Há senadores que chegam à sessão exclusivamente para elogiar o indicado e, depois, se retiram alegando compromissos importantes em outros locais. Com isso, eles transformam uma sessão criada para questionamentos num "show de elogios" a magistrados que, no futuro, poderão vir a julgar os seus sabatinadores do presente.

"Reconheço que precisamos nos aprofundar mais nas sabatinas. Mas precisamos lembrar que não estamos diante de um vestibular técnico para as respectivas áreas", ressalvou o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN).

Outro problema gritante nas sabatinas dos integrantes do STF é que os senadores procuram se ater a assuntos da ordem do dia na sabatina, enquanto os candidatos a ministros ficam por anos, décadas no cargo. Na última sabatina para o STF - da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, realizada após os ataques do PCC em São Paulo -, o Senado focou-se no tema da segurança pública. Na penúltima - do ministro Ricardo Lewandowski, ocorrida depois dos escândalos do mensalão e dos Correios - o assunto foram as liminares do STF a favor de depoentes nessas CPIs. Já os ministros que foram indicados, em 2003, no início do primeiro mandato do presidente Lula (Cezar Peluso, Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa) tiveram de responder sobre a reforma da Previdência, o assunto do momento.

Também é muito freqüente que senadores levem a sabatina para questões provincianas. Neste ponto, as disputas partidárias locais também acabam pesando, em alguns casos para atrasar as nomeações. É o caso do indicado para diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (DNIT), Luiz Antonio Pagot. A sabatina ainda não foi realizada por brigas políticas entre o governador de Mato Grosso do Sul, Blairo Maggi e o ex-senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT). Senadores confirmaram ao Valor que Antero pressiona para que a indicação fique "presa" no Senado.

Há casos de senadores que se atentam a critérios únicos para todas as sabatinas. A senadora Serys Slhessarenko sempre elogia se a indicada é mulher e, se o indicado for homem, ela sempre faz discurso falando da necessidade de se colocar uma mulher no cargo. Há ainda casos de senadores que não sabiam sequer o nome de indicados. O ministro Ricardo Lewandowski foi chamado diversas vezes de "Lewandowinski" por alguns senadores.

As sabatinas não são mais o momento em que se decide se o indicado irá ocupar ou não o cargo. No caso do STF, Lula sempre tem uma conversa reservada com o indicado antes de encaminhar o seu nome para o Senado. Conquistar a confiança do presidente neste encontro tornou-se fundamental, já que essa entrevista prévia antecede a possibilidade de o indicado chegar à sabatina.

Nas sabatinas para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), dois casos mostram que o essencial para a aprovação de um indicado do governo não é mais a sabatina. Antes de ser nomeada para a Anac, Denise Abreu foi indicada para o Cade, mas nem chegou a ser sabatinada, pois surgiram restrições dentro do governo ao seu nome, e não no Senado. O nome de Denise foi retirado do Cade. Essa substituição fez com que o senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) votasse contra à futura diretora da Anac. "Eu nem sei dizer se ela é competente ou não para o cargo. Mas acho difícil alguém ter currículo para dois cargos tão díspares", afirmou o tucano, durante a sabatina. Já o economista Cleveland Prates foi indicado por Lula para ser reconduzido a um novo mandato no Cade, foi aprovado na sabatina, mas não foi votado no plenário. O governo concluiu que havia o risco de rejeição e retirou o nome do economista.

O líder do PSB no Senado, Renato Casagrande (ES), admite que o Senado vem cumprindo mal suas atribuições. Mas tem algumas justificativas. Para ele, muitas vezes o indicado tem o perfil técnico adequado para o cargo, com um currículo que se enquadra na vaga. Mas acaba sendo um péssimo diretor por falta de habilidade gerencial. "Ter conhecimento técnico não significa ser um bom gestor. Isso só se descobre na prática."

Para resolver questões como essa, Casagrande defende a criação de um "recall" para diretores de agências. Na Câmara, o deputado Ivan Valente (P-SOL-SP) já apresentou um projeto prevendo que, na metade do mandato dos diretores das agências, eles devem ser avaliados a partir de metas previstas em lei. Arthur Virgílio promete apresentar, na próxima semana, projeto semelhante no Senado.

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), não acha que o Senado faça pouco caso de suas atribuições. Para ele, o maior problema é que tornou-se pejorativa a expressão "indicação política", e acusa-se o governo de estar apresentando nomes sem competência: "Qualquer indicação é política, na acepção mais nobre da palavra. Mas não abrimos mão de analisar a capacidade técnica de nossos indicados".