Título: Especialistas dizem que é prematuro culpar piloto
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 02/08/2007, Especial, p. A14

A divulgação da transcrição do gravador de voz da caixa-preta do Airbus da TAM, sem que houvesse um pronunciamento oficial da Aeronáutica, não pôs fim às especulações sobre as causas do acidente. Especialistas no setor aéreo afirmam que é prematuro chegar a qualquer conclusão antes de finalizada a investigação, ainda que seja possível fazer inferências a partir dos diálogos entre os pilotos nos momentos que antecederam o acidente. Uma falha mecânica, por exemplo, não pode ser afastada.

"O que poderá ser conclusivo é juntar essas informações com o que for tirado do gravador de dados da aeronave", diz o comandante Eric Antunes, piloto de aviões executivos que utiliza com freqüência o aeroporto de Congonhas. Antunes lembra que o gravador de dados mostra o funcionamento de todo o sistema do avião, como as velocidades, a posição de pouso, e poderá indicar se houve alguma falha nos aparelhos. Por isso ele considera prematuro buscar uma conclusão para o acidente nesse momento.

Com base em sua experiência como piloto, Antunes diz que o fato de o piloto ter dito "spoilers, nada" pode indicar que houve falha no sistema hidráulico. Os spoilers são hastes que ficam na parte superior das asas e que ao serem acionadas funcionam como barreira contra o vento. Como o freio principal, que pára os pneus, faz parte do sistema hidráulico, isso poderia indicar que ele também não funcionou. "Mas é irresponsável concluir qualquer coisa nesse momento."

O presidente da Associação de Pilotos e Proprietários de Aeronaves (Appa), George Sicupira, também ressalta o "perigo" de se fazer interpretações a partir de informações parciais, criticando as divulgações que têm sido feitas nos últimos dias. "É precipitado culpar o piloto", afirma ele. Como Antunes, Sucupira ressalta a importância de se conhecer as informações da caixa-preta referentes aos parâmetros do avião.

Uma hipótese que deve ser levada em conta, segundo Sucupira, é o fato de que os pilotos podem ter tentado acionar os controles manuais - para corrigir uma eventual posição errada do manete, por exemplo - e não terem obtido sucesso. A questão, diz ele, é que no Airbus o sistema automático leva um tempo para ser desconfigurado - algo como 12 segundos. Em aviões americanos, diz ele, o controle manual se sobrepõe ao automático, o que não ocorre no Airbus. "O piloto pode ter acionado o manete e o avião não ter obedecido", afirma Sucupira, ressalvando que se trata de uma suposição.

Também no campo das suposições, Adyr da Silva, professor da Universidade de Brasília (UNB) e ex-presidente da Infraero, acredita que a pilotagem pode ter influído no acidente, já que o piloto não notou a aceleração do motor direito. "Como ninguém notou que o motor direito estava acelerado? Os freios não funcionam quando o motor está acelerado", diz ele. Isso explicaria o fato de o "spoiler" não ter funcionado. Segundo Silva, se fosse apenas falta de freio, o piloto teria notificado o problema e arremetido. "Ele tinha toda a pista à sua frente, se estivesse apenas sem freio ele arremeteria", diz. Para ele, agora os problemas na pista assumiram uma posição secundária na discussão. Mesmo assim, explica que sem a comissão de investigação se pronunciar sobre o caso, não é prudente concluir nada.