Título: Infra-estrutura ficou estagnada com Lula, diz Bacha
Autor: Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 03/08/2007, Política, p. A6

Um dos pais do Plano Real, o economista Edmar Bacha diz que o governo Lula não fez nada, em quase cinco anos de gestão, para melhorar a infra-estrutura da economia brasileira. A atual administração, sustenta Bacha, rompeu com o modelo de privatização, concessão e regulação independente adotado pela gestão anterior, levando o país a um "vácuo de administração". "O atual governo demonstra que tudo o que foi construído antes (na área de infra-estrutura) foi deixado de lado, tanto que eles passaram quatro anos e não anunciaram nada", critica o economista.

Num depoimento de quase 30 minutos gravado para o 3º Congresso do PSDB, previsto para acontecer nos dias 21 e 22 de setembro, Bacha bate duro na gestão petista, mas faz também um "mea culpa" do governo Fernando Henrique Cardoso, do qual fez parte como presidente do BNDES. Segundo ele, o PSDB não assumiu as privatizações, durante a campanha eleitoral de 2006, como algo positivo.

"Privatização, no imaginário político do Brasil e da população, é como tirar algo do 'meu' Estado para dar a alguns particulares. A idéia de que a coisa que está lá no Estado não é 'sua' (inexiste). Na verdade, você está financiando aquilo com impostos, mas quem gere e se beneficia daquilo não é você, mesmo porque os benefícios não existem. Os telefones não funcionavam e as estradas estão esburacadas", ironiza Bacha. Privatizar, argumenta ele, não é entregar o Estado: "É um processo de concessão, de terceirização que o governo controla e regula por meio das agências. Isso a gente não conseguiu passar para a população".

Na opinião de Bacha, as privatizações promovidas pela gestão FHC foram bem-sucedidas, especialmente, no setor de telecomunicação. O governo anterior falhou, diz ele, no setor de energia. "Faltou em setores, como o de energia, um comando mais unificado, alguém que tivesse a batuta na mão e a capacidade de lidar com todas as enormes pressões que se exercem nessa área por causa de interesses políticos regionais e também corporativos", admite o economista, acrescentando que a área energética é mais complexa por envolver um período maior de maturação dos investimentos e segmentos sensíveis, como os de energia nuclear e térmica. "Nesse caso, pode-se dizer que fomos muito lentos porque não conseguimos nos organizar o suficiente para isso."

Bacha conta que o governo FHC cumpriu bem as primeiras etapas, "muito difíceis", do processo de estabilização da moeda. Introduziu a idéia de que a estabilidade de preços é um valor "essencial", sem o qual a economia não consegue se desenvolver. Depois, em 1999, em meio a uma sucessão de crises internacionais, adotou o tripé de política econômica que vigora até hoje - câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário -, resolvendo os "dilemas iniciais" do Plano Real.

Também naquele momento, observa Bacha, o governo fez reformas na área fiscal, com a adoção da Lei da Responsabilidade Fiscal, a renegociação das dívidas dos Estados e a privatização dos bancos estaduais. "Tudo isso permitiu arrumar a casa do governo para que ele deixasse de estar casado com a inflação", comenta o economista. Apesar disso, ele reconhece que faltou ao governo "condições" para a consolidação fiscal.

Bacha se refere ao que chama de peso do governo sobre a economia. "Não conseguimos fazer uma reforma fiscal que reduzisse o gasto corrente. O contrário: o gasto, seja pela presença do funcionalismo, seja pela previdência e as transferências tanto sociais quanto para Estados e Municípios, continuou a crescer e a representar uma parcela extremamente elevada da economia brasileira", lamenta.

O governo Lula, segundo o economista, piorou a situação, especialmente depois que Antonio Palocci deixou o Ministério da Fazenda. "O gasto do governo, depois da meia-trava que se deu em 2003, está se expandindo", critica Bacha. Além disso, observa, é possível discutir a velocidade de redução da taxa de juros, "num contexto em que o Banco Central se sente muito isolado em relação ao resto do governo". "Como o governo gasta muito, o BC tem que reprimir o gasto privado para que caiba no PIB. Nesse processo, além de se combater a inflação, se deixa de retomar o crescimento de forma mais vigorosa", adverte.