Título: Empresários cobram propostas do 'Cansei'
Autor: Lamucci, Sergio e Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 03/08/2007, Brasil, p. A9

A ausência de um caráter mais propositivo afasta algumas lideranças empresariais do "Cansei", o Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros. Contando com o apoio de entidades como a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Federação Brasileira das Associações de Bancos (Febraban), o "Cansei" tem sido acusado de elitista e até de golpista por políticos próximos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva - o próprio Lula mostrou descontentamento com a iniciativa, ainda que sem citá-lo explicitamente.

O empresário Newton de Mello, ex-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), avalia que o movimento é legítimo. Num país com inúmeros problemas como o Brasil, é natural que haja esse tipo de iniciativa, que ele qualifica como um "desabafo". Mello, no entanto, não pretende juntar-se ao "Cansei", por preferir movimentos que tenham um caráter propositivo. "Eu prefiro aqueles que apresentam propostas e sugestões. Se não, eles tendem a cair no esquecimento." Mello afirma não ver nenhum traço golpista no movimento e tampouco acredita que haja um caráter partidário.

O empresário Oded Grajew, presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Ethos, diz considerar positivo que a sociedade se mobilize, principalmente num país em que há muita corrupção, desigualdade de renda e pobreza como o Brasil. "A democracia se fortalece quando há mobilização da sociedade." Ex-assessor especial de Lula, Grajew diz não ver nenhum elemento golpista no "Cansei".

Para ele, porém, o ideal é que movimentos de protesto sejam acompanhados de propostas. Isso ajudaria inclusive a afastar suspeitas de golpismo. Em vez de apenas dizer "cansei disso", seria importante também deixar claro o que se quer fazer, com propostas claras e detalhadas, traçando ainda uma estratégia para sua implementação. Assim como Mello, Grajew não pretende aderir ao "Cansei". Ele também é um dos participantes mais ativos do movimento "Nossa São Paulo: outra cidade".

A pecha de elitista e golpista parece afastar empresários da iniciativa. Algumas associações empresariais procuradas pelo Valor informaram preferir não se manifestar sobre o "Cansei". Uma história ilustra bem as incertezas quanto à conveniência de participar do movimento. A pedido de um cliente, uma grande assessoria de imprensa de São Paulo procurava, na quarta-feira, alguns jornalistas para tentar medir as repercussões de uma eventual adesão ao "Cansei". Duvidava-se se seria ou não uma boa estratégia atrelar a imagem da empresa à iniciativa.

Os participantes do "Cansei" rebatem a idéia de que o movimento tenha o propósito de ser oposição ao governo Lula, como faz o empresário Ronaldo Koloszuk, do Comitê de Jovens Empreendedores da Fiesp. "O mais importante é que ele seja apartidário e que o Brasil saia do marasmo. Tem muitas coisas que estão indo bem, mas tem muitas que estão mal, como o sistema aéreo. Queremos que ocorra aqui o que era uma bandeira do PT: que o Brasil passe de uma democracia representativa para uma democracia participativa."

Koloszuk conta que o mais recente participante, a Confederação Nacional dos Jovens Empresários (Conaje), tem 15 mil jovens empresários. Segundo ele, as propostas surgirão naturalmente. "Se sem apresentar propostas já estamos sofrendo críticas de partidarismo, imagine se tivéssemos propondo. Mas elas virão naturalmente, como resultado do engajamento. Quando você se torna pró-ativo, começa a ter idéias." Ele contesta a visão de que o movimento é elitista. "Na primeira reunião o Severino, taxista que levou um dos idealizadores, participou, e é eleitor do PT. Não ouvi um não até agora."

Para Rafael Sá, do do Instituto de Estudos Empresariais, que tambem subscreve o movimento, a mobilização não é menos importante por ter em sua raiz empresários. "Nós temos escola boa, e pagamos por isso. Mas temos que pagar duas vezes, porque já pagamos impostos. A mobilização não é menor porque é feita por empresários. Se o Brasil for melhor, vai ser melhor para todo mundo. Aqui ninguém é tucano e ninguém é do PT. Nós gostaríamos que houvesse partidos melhores que esses dois." (Colaborou Fernando Lopes)