Título: S&P descarta atraso no grau de investimento devido a turbulências
Autor: Silva Júnior, Altamiro
Fonte: Valor Econômico, 03/08/2007, Finanças, p. C2

As recentes turbulências no mercado financeiro internacional não devem atrasar a classificação do Brasil como grau de investimento ("investment grade"). O país nunca esteve tão perto de entrar neste seleto grupo, afirma Lisa Schineller, diretora da área de análise de risco soberano da Standard and Poor's (S&P). Para a executiva, ainda não é possível dimensionar o tamanho dos problemas no mercado imobiliário americano. "Ainda há muita incerteza. Mas por conta da alta liquidez internacional, é natural um período de maior volatilidade", diz.

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, também destaca que a economia brasileira está muito mais preparada agora para um cenário de maior volatilidade do que há alguns anos. "Essa correção dos mercados é negativa e tem custo. Para o Brasil, é melhor que venha hoje porque a economia tem mais solidez. O país tem mais força para passar por esse tipo de turbulência", afirma Meirelles.

Mesmo se a crise viesse daqui a dois ou três anos, possivelmente já em um cenário de grau de investimento, o efeito também seria maior, avalia, pois o preço dos ativos poderia estar muito mais valorizado do que hoje e a correção seria mais "custosa".

"Qualquer turbulência é negativa", ressaltou o presidente do BC. Na avaliação dele, o mercado está em um processo de correção dos preços, que haviam subido demais por conta da alta liquidez internacional e agora busca um equilíbrio.

Inflação dentro da meta, situação fiscal equilibrada, dívida em queda e melhora das contas externas foram apontados por Meirelles como fatores que demonstram os bons fundamentos da economia brasileira.

As reservas internacionais, que ultrapassaram os US$ 150 bilhões, também foram destacadas na apresentação que ele fez ontem em um seminário em São Paulo que discutia perspectivas para o crescimento econômico do país, promovido pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). Para a imprensa, Meirelles afirmou que o BC vai continuar mantendo a política de compor reservas.

O economista do banco WestLB, Ricardo Amorim, projeta que as reservas brasileiras atinjam US$ 195 bilhões em dezembro e US$ 235 bilhões no final de 2008. Já o dólar deve fechar o ano em R$ 1,80 e R$ 1,65 em dezembro de 2008. Amorim se diz otimista sobre os desdobramentos do atual cenário turbulento em Wall Street. Ele projeta mais "uma ou duas semanas" de volatilidade, com as bolsas mundiais operando sem tendência definida. Prova disso são os pregões abrindo com forte alta ou queda e depois mudando de rumo ao longo do dia. Em seguida, as ações devem voltar a subir.

Para chegar a esta conclusão, o economista analisou outros momentos de intenso estresse no mercado desde 2004. Em todos eles, houve quedas acentuadas das ações nos momentos iniciais, seguidas por alguns dias de oscilações e depois a retomada da trajetória de alta.

Para Lisa, da S&P, se a atual crise persistir por mais tempo, a capacidade de reação do governo brasileiro será levada em conta para o recebimento da nota grau de investimento, principalmente na área fiscal e no combate à inflação. "Vamos analisar se o país vai reagir de forma pragmática", diz ela. Na sua avaliação, o mais importante é manter a trajetória atual da economia, com juros em queda e disciplina fiscal. "Não estamos atrás de reformas específicas", afirma Lisa.

O diretor do banco de investimento do Credit Suisse, José Olympio Pereira, estima que o mercado ainda não embutiu totalmente nos preços dos ativos o investment grade. Ou seja, ainda há espaço para os papéis subirem mais. Pereira afirma que ainda é cedo para saber se esta é uma crise duradoura, mas reconhece que pode ter impacto no mercado de capitais brasileiro, na medida em que os fundos hedge, os mais afetados pela crise imobiliária americana, estão entre os principais compradores das ações das companhias brasileiras no boom de aberturas de capital.