Título: Aviação civil já responde por 0,86% do PIB
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2007, Brasil, p. A3

A crise nos aeroportos pode ter reflexos negativos em vários setores da economia. Um estudo inédito do Centro de Excelência em Turismo da Universidade de Brasília (UnB) detectou que a cadeia produtiva da aviação civil engloba mais de 50 segmentos da atividade econômica. Da indústria química às agências de viagens, da siderurgia ao aluguel de imóveis, o estudo da UnB demonstra que os efeitos econômicos do apagão aéreo têm potencial de ir além dos compromissos perdidos por causa de vôos atrasados e do aumento de tarifas.

Para cada R$ 1.000 de expansão do setor aéreo, o aumento da demanda na indústria química é de R$ 258 - obviamente, o impacto de uma retração é o mesmo. Trata-se do maior impacto da aviação sobre outros setores, devido às grandes quantidades de combustível e outros insumos fornecidos para as aeronaves. Outros impactos significativos são para o comércio (R$ 78 de demanda adicional para cada R$ 1.000 de crescimento da aviação), extrativismo mineral (R$ 52), instituições financeiras (R$ 51) e agências de viagens (R$ 36).

Ainda não há muitas evidências do grau de desaceleração no crescimento do transporte aéreo, mas executivos e analistas do setor têm advertido que as últimas medidas anunciadas pelo governo devem restringir a oferta e elevar as tarifas. Quase ninguém aposta em prejuízo para as aéreas, mas o ritmo de crescimento do mercado doméstico - cerca de 15% nos últimos três anos - pode estar com os dias contados.

Para a pesquisadora Maria de Lourdes Rollemberg Mollo, co-autora do estudo com outros quatro professores de doutorado da universidade, "a política econômica precisa ser cuidadosa" para evitar a transferência de desdobramentos negativos da crise aérea para outros setores da economia. "Não é uma coisa simples mexer em setor nenhum, mas há um lugar estratégico do transporte aéreo na estrutura produtiva brasileira", observa a pesquisadora da UnB.

O trabalho foi encomendado há quatro meses pelo Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (Snea) e concluído em julho. Ele aponta que o setor aéreo exerce mais influência do que recebe da economia como um todo. Em outras palavras, o poder de gerar impactos - positivos ou negativos - aos demais setores com seu crescimento ou sua retração é maior do que o contrário. Todas as simulações foram feitas com dados de 2003, mas os pesquisadores avaliam que não há alterações estruturais que possam modificar as conclusões obtidas.

O único dado atualizado foi o de crescimento da participação da aviação civil no Produto Interno Bruto (PIB). De 0,63% em 2003, a fatia do setor na economia brasileira subiu ininterruptamente, até alcançar 0,86% no ano passado.

Em 2003, a remuneração dos trabalhadores em aviação somou R$ 4,138 bilhões. Nove em cada dez pessoas são de "alta qualificação", segundo o estudo, o que explica que 57% dos custos das aéreas - descontando impostos e tarifas - sejam com salários.

Uma revelação apresentada pelo estudo é a de que, apesar da propalada democratização do transporte aéreo no país, 92% do consumo no setor foi feito por pessoas com renda familiar considerada alta (acima de R$ 720 mensais per capita). Trata-se de uma faixa de renda que consome, na economia como um todo, 49% de todos os bens.

As pessoas de renda "baixa" (até R$ 360 mensais per capita, em valores de 2003) consomem 19% dos bens no país, mas representam apenas 0,2% do consumo de transporte aéreo. Para Maria de Lourdes, pode ter havido mudanças nos últimos anos, por causa do barateamento de passagens aéreas e maior oferta de crédito. O estudo pode servir de ferramenta ao governo para nortear que rumo deve seguir para regular a aviação civil, diz a professora da UnB.