Título: Lula sai em defesa de Renan e faz apelo contra obstrução da pauta de votações
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2007, Política, p. A10

A crise política do Senado alcançou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Tegucigalpa, segunda escala de uma viagem pela América do Norte, América Central e Caribe. Na breve passagem de oito horas por Honduras, Lula comentou a crise do Senado, cujo presidente Renan Calheiros está sendo investigado pela Procuradoria Geral da República em inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o presidente, "Nenhum caso individual, por mais importante que seja, pode atrapalhar a votação de coisas de interesse do nosso país".

"Para que eu não cometa nenhum erro na minha resposta, por que ele é réu?", perguntou Lula, ao ouvir os jornalistas referirem-se a Renan como "réu" no STF. Ao saber que o Ministério Público Federal pedira a investigação ao Supremo, o presidente tentou preservar Renan Calheiros.

"Sei que Renan está sendo investigado há muito tempo", disse. "Há dois meses não se fala noutra coisa. Ele tem mostrado todos os documentos para provar sua inocência. Ele próprio pediu que a Polícia Federal o investigasse. O Conselho de Ética do Senado ainda não tomou uma decisão".

De acordo com o presidente, "é preciso esperar" o Senado ou o Supremo tomarem uma decisão. "O presidente da República, por mais importante que ele seja, não pode dar palpite sobre o que vai ocorrer na Suprema Corte". Esse comentário de Lula foi aplaudido pelas autoridades e empresários hondurenhos e brasileiros presentes à solenidade de assinatura de sete acordo entre os dois países.

Segundo o presidente, até agora, tanto a Câmara quanto o Senado têm votado os projetos de interesse do governo federal. Quando voltar ao Brasil, no domingo, vai consultar seus auxiliares sobre se a crise do Senado passou a atrapalhar a agenda do governo. "Se eu descobrir que o Senado está atrasando, reunirei com o líder do governo e com os líderes partidários e pedirei: nenhum caso individual, por mais importante que seja, pode atrapalhar a votação de coisas de interesse do nosso país".

Lula evitou entrar no mérito das acusações feitas contra Renan desde o início da crise, quando o senador foi acusado de ter custeado despesas pessoais por meio de uma empreiteira. O presidente chegou a fazer declaração pública entendida como um gesto de apoio a Renan, quando recomendou que se deveria evitar pré-julgamentos. Mas Lula já foi informado por assessores que a situação de Renan agravou-se e tornou insustentável a permanência na presidência do Senado. Talvez possa evitar a cassação por quebra do decoro parlamentar, se renunciar ao cargo.

De Tegucigalpa, Lula partiria ainda ontem à noite para a Nicarágua, e, depois, completaria seu roteiro com visitas a Jamaica e Panamá. Entre os acordos assinados em Honduras, Lula aposta mais aposta na associação para produzir etanol e biodiesel no país. Tem a boa vontade do presidente José Manuel Zelaya Rosales, que fez da produção do etanol uma das principais promessas de campanha eleitoral.

Etanol e biocombustível permeiam a viagem de Lula. Na comitiva para Honduras foram incorporados 15 empresários do setor do álcool e açúcar. Os acordos estimulam parcerias entre empresários brasileiros e locais. O governo estima que só o mercado americano tem um potencial para absorver 1,3 bilhão de litros ao ano.

A decisão da Califórnia e da Flórida de admitir a mistura de 10% de álcool à gasolina deixou governo e empresários ainda mais otimistas. Mas, até agora, não se apresentou nenhum projeto concreto. Só na Jamaica, Lula inaugurará uma uma planta de etanol com participação de empresas brasileiras. Lula não deu muitas esperanças em relação à pesquisa do mar hondurenho pela Petrobras, argumentando que é decisão da empresa, que é pública, com participação de capital privado e ações negociadas na bolsa de Nova York. Mas prometeu se empenhar para atender a um eventual pedido do presidente Zelaya.

Foi a primeira visita de um presidente brasileiro a Honduras, em 101 anos de relações diplomáticas, estabelecidas pelo barão de Rio Branco. Apesar de uma relação irrelevante, o Brasil atuou em favor de Honduras em algumas situações. Teve papel importante, por exemplo, no perdão da dívida de US$ 1,3 bilhão que o país mantinha com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Auxilia os hondurenhos também no combate à Aids, que tem níveis altos de incidência no país. Mas o comércio bilateral aumenta expressivamente desde 1977, e passou de US$ 28,5 milhões para US$ 144 milhões em 2006. O superávit comercial do Brasil é "predominante e crescente, atingindo o saldo de US$ 139 milhões em 2006", diz estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI).