Título: Descriminalização na pauta federal
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 11/01/2011, Política, p. 2

NOVO GOVERNO Ministério da Justiça herda estrutura da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e terá entre as prioridades coordenar a discussão sobre o tema. Plano inclui estudar experiências de outros países

A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, transferida ontem do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) para o Ministério da Justiça (leia abaixo), vai coordenar a discussão sobre a descriminalização das drogas no país. Em entrevista ao Correio, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, defendeu um debate público sobre o tema. O primeiro passo será a elaboração de um plano de trabalho com estudos detalhados sobre a experiência de outros países. A transferência do órgão foi uma decisão da presidente da República, Dilma Rousseff, que traçou como meta de governo a ampliação das políticas antidrogas desde a prevenção até a repressão. O texto sobre as atribuições da secretaria, elaborado pela Casa Civil, foi publicado no Diário Oficial da União. O ministério ganhou 52 cargos comissionados de direção e assessoramento para atender a nova estrutura.

De acordo com o documento, a secretaria irá coordenar ações do governo federal com o Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas nos aspectos relacionados às atividades de repressão, tráfico e produção de substâncias não autorizadas, além das atividades de tratamento, recuperação e reinserção social de dependentes e ao Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras drogas.

A pasta será dividida em quatro diretorias: projetos estratégicos e assuntos internacionais, articulação e coordenação de políticas sobre drogas, contencioso e gestão do Fundo Nacional Antidrogas e planejamento e avaliação de políticas. A baixa execução do fundo é uma das reclamações dos secretários de segurança pública dos estados. Reportagem publicada na última semana pelo Correio revelou que dos R$ 136,5 milhões autorizados em 2010, apenas R$ 12,1 milhões foram pagos. Desse total, menos de R$ 4 milhões foram destinados a investimentos na área.

Prestígio Alguns militares demonstraram insatisfação com a troca de comando. Segundo eles, isso representa uma suposta perda de força no novo governo. O ministro do GSI, general José Elito Carvalho, minimizou a crise e comparou o caso com a saída do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) da Casa Civil, de Antonio Palocci, para o Ministério do Planejamento, de Miriam Belchior. ¿Estou como o Palocci. Não acho que perderemos força com a saída da secretaria¿, disse. Cardozo nomeou o secretário nacional de Justiça, Pedro Abramovay, para o cargo. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, também defendeu a proposta, ressaltando a falta de atuação da secretaria e a obrigação legal da Polícia Federal na repressão.

A secretaria está nas mãos dos militares desde 1998. A troca no comando, àquela época, foi provocada por uma pressão dos Estados Unidos em militarizar o combate às drogas. O conceito do general Alberto Cardoso, chefe da Casa Militar, era o mesmo da estrutura montada em Washington. O chefe do departamento, general reformado Barry McCaffrey, ficou conhecido como o ¿czar das drogas¿. O juiz Walter Maierovich inspirou-se no colega e travou uma batalha pelo comando do combate ao narcotráfico no país, que culminou com a saída do diretor da PF, José Carlos Dias.

Varreduras prosaicas O enxugamento do GSI é a radicalização de um processo de desmilitarização da Presidência iniciado em 1999. Ao extinguir a Casa Militar e criar o GSI, Fernando Henrique Cardoso eliminou a função da antiga estrutura, que funcionava como uma espécie de adido das Forças Armadas. Sem esse status, o GSI se transformou em unidade de ordens presidenciais, cuja principal missão é realizar varreduras dos locais por onde o presidente transitará. Muitas vezes, o GSI torna-se apêndice ¿doméstico¿ do governo, até mesmo em agendas particulares prosaicas, como cabeleireiro e consultas médicas.

Abin sob novo guarda-chuva

Josie Jeronimo Tiago Pariz

Além da transferência de 47 funcionários comissionados dos 97 que compunham o Gabinete de Segurança Institucional para o Ministério da Justiça, o GSI está prestes a perder ainda mais sua importância. Dilma Rousseff tomou a decisão de repaginar a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e colocá-la sob novo guarda-chuva, concretizando uma intenção projetada na campanha.

O enxugamento do GSI ocorre logo após o estremecimento da relação da presidente Dilma com o ministro José Elito Siqueira. O chefia do Gabinete de Segurança afirmou que vítimas da ditadura militar são fatos históricos. A declaração rendeu ao general do Exército um puxão de orelha de Dilma e uma desautorização pública do ministro da Defesa, Nelson Jobim. A saída analisada pelo governo é criar uma ¿assessoria de inteligência da Presidência¿ que possa abrigar a Abin e o Departamento de Segurança de Informações, hoje também vinculado ao GSI.

A agência tem previsão de gastos em torno de R$ 390 milhões em 2011 e é considerada órgão estratégico. No governo, a migração da Abin para a Casa Civil seria a saída institucional menos custosa, mas o ministro Antonio Palocci não quer arcar com o ônus político que o serviço de monitoramento gera. A Secretaria-Geral da Presidência, comandada por Gilberto Carvalho, também seria opção, mas a transferência poderia desvirtuar a vocação da pasta. A presidente quer Carvalho focado no meio de campo com movimentos sociais.

A transferência dos funcionários faz parte da reestruturação que Dilma inicia nos quadros da Presidência. A petista quer enxugar o gabinete institucional, que vem crescendo em número de funcionários e orçamento desde que foi criado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (veja quadro).

Inchaço Além do pessoal civil, que atua nas diretorias do gabinete, 1.040 militares são pagos pela Presidência. De acordo com a Lei Orçamentária de 2011, a folha de pagamento dos militares escalados para cuidar da segurança presidencial custa R$ 10 milhões. Outros R$ 34,1 milhões são gastos com o suporte de transporte e deslocamento do chefe de Estado. Em 2003, quando Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o primeiro mandato, 616 militares realizavam a função, com custo de R$ 3,8 milhões por ano. A despesa do gabinete era de R$ 201 milhões. Agora, o orçamento do GSI é de R$ 315 milhões.

Na Abin, a troca de comando é vista com bons olhos, segundo servidores da área. A concretização da ordem de Dilma depende apenas de encontrar o lugar certo para a agência. Na campanha, a intenção era colocá-la sob o controle da Presidência, mas assessores alertaram que isso poderia trazer problemas para o terceiro andar do Palácio do Planalto. Caso os arapongas protagonizassem algum escândalo, por exemplo, ela perderia a opção de ter um ¿fusível¿ para queimar (leia-se ministro ou assessor para demitir). A turbulência se instalaria diretamente em seu gabinete. A opção é pela autopreservação.