Título: Modelo da operação pode sair em 90 dias
Autor: Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2007, Empresas, p. B3

A ruidosa disputa comercial entre operadoras de telefonia e de TV paga ficou em segundo plano. Nas rodinhas de executivos aqui e ali, a ausência do ministro das Comunicações, Hélio Costa, no primeiro dia do congresso anual da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) tornou-se assunto de destaque. A participação de Costa estava prevista na solenidade de abertura do evento, onde estaria ao lado do novo presidente da Anatel, Ronaldo Sardenberg, do presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, deputado Júlio Semeghini (PSDB-SP) e de representantes da indústria.

A falta do ministro chamou a atenção por ser incomum. Costa é notório participante de congressos e seminários sobre os setores de telecomunicações e radiodifusão, onde em geral costuma não se furtar aos contatos com os jornalistas, a quem gosta de fazer declarações de efeito. A explicação dos organizadores foi a de que Costa teve um imprevisto. Procurado, o ministro informou ao Valor que estava numa reunião e não poderia falar.

O anúncio feito pelo ministro, na semana passada, de que será criado um grupo de trabalho para tratar da criação de uma operadora de telecomunicações de capital nacional irritou o governo, segundo fontes do setor. Embora não se possa estabelecer uma relação entre um fato e outro, é inegável que Costa teria sido questionado sobre esse tema se fosse ao congresso da ABTA.

De qualquer forma, um representante do ministério acabou falando abertamente sobre o assunto, a um grupo de jornalistas, durante um seminário realizado também ontem pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). O secretário de telecomunicações do ministério, Roberto Martins, afirmou que o grupo de trabalho deverá apresentar em 90 dias um modelo que permita a criação da tele brasileira. Ele disse que será um dos integrantes do órgão, que ainda não se reuniu e que terá a participação da Casa Civil.

O interesse em viabilizar uma fusão entre Brasil Telecom e Oi (ex-Telemar), segundo Martins, é criar uma terceira força no mercado que se contraponha ao domínio da espanhola Telefónica e da mexicana Telmex/América Móvil.

Martins afirmou que as discussões partiram de Brasília, sem a participação das operadoras supostamente interessadas. "Isso tem sido tratado no âmbito do governo", ressaltou. "Depois vamos chamar as empresas e conversar com elas." O secretário disse também que não está excluída a possibilidade de participação de um grupo estrangeiro como acionista minoritário da companhia. De acordo com ele, a questão é que, se nada for feito, a Telefónica e os mexicanos continuarão avançando no mercado nacional e engolirão as duas companhias nacionais existentes hoje. "A gente acha que isso não é conveniente." Martins negou ainda que a idéia de criação de uma "golden share", dando poderes à União nessa empresa, represente alguma tentativa de reestatização. Ao contrário, disse ele, a intenção é fortalecer essa companhia, que no mercado interno teria condições de competir em pé de igualdade com os grupos estrangeiros, ainda que fora do Brasil não tivesse a mesma escala que eles.

No congresso da ABTA, o presidente da Anatel, Ronaldo Sardenberg, também fez comentários sobre o grupo de trabalho. Segundo ele, a agência reguladora irá propor a participação de quatro representantes no grupo e não apenas três, como afirmou o ministro.

Sardenberg procurou ser cauteloso e ponderou que a fusão depende do interesse de duas empresas privadas que, por enquanto, estão relativamente quietas. O grupo, disse ele, reflete o interesse do governo de promover essa fusão diante do processo de consolidação do setor de telecomunicações.

Indagado se os debates no governo poderiam levar a regras que permitissem a consolidação de outras empresas, o presidente da Anatel respondeu: "É possível que o grupo de trabalho chegue à conclusão de que essa maneira de abordar o problema [trabalhar só com a hipótese da fusão entre as teles brasileiras] é insuficiente". Ele acrescentou que outros grupos podem se associar à BrT e à Oi e que outros investidores brasileiros estão sendo procurados com essa finalidade. "O próprio grupo português indicou que tinha interesse", observou Sardenberg, referindo-se à Portugal Telecom, que levou ao governo a idéia da criação de uma operadora luso-brasileira.

O presidente da Telefônica no Brasil, Antonio Carlos Valente, evitou bater de frente com o governo ainda que a idéia de mudança de regras feita apenas para permitir a fusão entre BrT e Oi seja rechaçada pelo grupo espanhol. Mas defendeu que o Executivo não desconsidere os resultados benéficos para o setor com o tratamento isonômico dado, no passado, a investidores nacionais e estrangeiros. Para ele, "as regras que vão ser estabelecidas devem considerar o sucesso do processo que houve no Brasil, onde o capital nacional e estrangeiro foram igualmente tratados e os benefícios são esses que vemos para a sociedade".