Título: No Panamá, Lula discute obra no Canal
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2007, Brasil, p. A5

Na única etapa de sua viagem pelo México e América Central em que deve tratar efetivamente de um grande empreendimento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva discutirá hoje, com o presidente panamenho Martin Torrijos Espino, o interesse de dois consórcios, com participação de grandes empreiteiras brasileiras, na construção de duas eclusas no Canal do Panamá. Lula defenderá a demanda das empresas.

A obra das eclusas está estimada em US$ 3,5 bilhões, em sua primeira etapa. Ao final, as obras de recuperação e ampliação do Canal do Panamá devem alcançar US$ 5,5 bilhões. É uma das maiores obras em licitação hoje no mundo. Além das empresas brasileiras, mais de uma dezena de gigantes mundiais da construção civil devem se habilitar à concorrência. O edital de pré-qualificação sai em outubro.

Um dos consórcios, liderado pela francesa Bouygues, conta com a participação de três tradicionais empreiteiras brasileiras _ Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Camargo Corrêa. O outro consórcio, com participação brasileira, é liderado pela Norberto Odebrecht, associada com outros fabricantes internacionais. Duas companhias chinesas também participarão da pré-qualificação, processo que deve se estender até dezembro.

Ontem, o presidente passou o dia em Kingston, capital da Jamaica, onde inaugurou uma usina de desidratação de álcool, a cerca de cinco quilômetros do centro da capital. A usina é jamaicana, mas foi construída por empresas brasileiras com tecnologia brasileira. O custo da obra foi de US$ 20 milhões. A planta terá capacidade para produzir 270 milhões de litros de álcool anidro. O fornecimento de álcool também será brasileiro.

A grande vantagem da parceria Brasil-Jamaica é que a produção do álcool anidro será inteiramente exportada para os Estados Unidos com tarifa zero, devido ao acordo comercial entre os dois países. Atualmente, para entrar nos EUA, o álcool brasileiro é taxado em 20%.

Duas outras empresas brasileiras atuam na Jamaica. Uma delas, a Coimex, também produz etanol em solo jamaicano e já planeja ampliar as operações no país. O mercado potencial americano para o etanol é estimado em 1,3 bilhão de litros anuais - é esse filão que o Brasil pretende alcançar por meio dos países centro-americanos.

Ao contrário do que ocorreu na Nicarágua, o discurso de Lula em defesa do biocombustível foi muito bem recebido na Jamaica, um país com regime de monarquia parlamentarista, cujo chefe de Estado é a rainha Elizabeth II, representada pelo governador geral Kanet Hall. A população é de pouco mais de 2,7 milhões de habitantes, e a renda per capita de US$ 4,4 mil. A primeira-ministra Portia Simpson Milier demonstrou ser uma grande entusiasta do biocombustível. A partir do próximo ano, a gasolina jamaicana terá 10% de mistura de álcool. Já é lei.

Lula fez um longo histórico da utilização do álcool no Brasil, desde o período da colonização portuguesa até a criação do carro "flex-fuel". Ele previu que, em breve, derivados hoje retirados do petróleo também possam ser obtidos a partir dos biocombustíveis. "Aí teremos o carro verde", disse, aplaudido pela platéia de empresários brasileiros e jamaicanos, que realizaram um seminário sobre o desenvolvimento do biocombustível. Na Jamaica, como já fizera no México, Honduras e Nicarágua, Lula repetiu mais uma vez que "o biocombustível é inexorável".

Lula disse que, por causa do biocombustível, os usineiros, que "muitas vezes foram tratados como marginais", estão hoje virando "celebridades internacionais". Nunca tiveram tantas reuniões de negócio. Mas para isso foi preciso dar um passo de cada vez, desde 2004, quando Lula disse aos empresários que "precisávamos nos profissionalizar, se quiséssemos colocar álcool no mercado internacional, até surgir o que parecia impossível, um carro chamado flex fuel".

O presidente anunciou que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) abrirá uma linha de crédito para projetos de biocombustível na região. Além das três usinas instaladas na Jamaica, há também uma planta funcionando em El Salvador. Linhas de crédito são a maior demanda dos empresários em relação ao governo, e não apenas para negócios na área do biocombustível.

A Andrade Gutierrez, por exemplo, estuda a possibilidade de entrar na concorrência para a construção de uma hidrelétrica na Nicarágua, mas avalia o tamanho do negócio, que é considerado pequeno: US$ 141 milhões.