Título: Mudança na lei reduziria poder das 'pílulas de veneno'
Autor: Valenti, Graziella
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2007, Empresas, p. B3

A presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Maria Helena Santana, acredita que a mudança da Lei das Sociedades por Ações para o modelo europeu, de oferta pública aos minoritários em caso de compra de 30% das ações de uma companhia, reduziria a polêmica sobre os estatutos das novas empresas listadas na Bolsa.

As novatas, que pulverizaram capital na bolsa, usaram um mecanismo conhecido como 'pílula de veneno' para buscar estabilidade à estrutura da empresa. O objetivo é dificultar ofertas hostis de compra para formação de um bloco controlador.

Polêmicas, as tais pílulas determinam que qualquer investidor lance oferta a todos os acionistas de uma empresa, ao alcançar uma determinada fatia do capital. Normalmente, o porcentual que dispara a obrigação vai de 15% a 20%. É comum os estatutos também definirem o método de cálculo do valor da oferta e até mesmo o prêmio que deve existir.

O problema apontado por especialistas é que esses estatutos dificultariam em demasia as compras de empresas, o que não é positivo nem para a companhia e nem para o mercado. A mudança da lei, na avaliação de Maria Helena, reduziria a relevância dessa questão. O nova legislação seria bastante semelhante às pílulas, porém, de forma regulada e equivalente a todas as empresas.

Ainda não houve tempo para fusões e aquisições entre as novatas. Até agora, as próprias emissoras de ações consolidam seus setores, utilizando os recursos obtidos na bolsa. No entanto, é esperado que a maciça capitalização das empresas estimule os negócios. O temor é que as transações fiquem inviáveis ou caras demais por conta dos estatutos.

As pílulas de veneno surgiram no mercado internacional, no qual o ambiente é bastante concentrado na figura dos administradores das companhias - já que a maioria delas possui capital pulverizado.

A relevância dos executivos foi ressaltada por Maria Helena, em seu primeiro debate público à frente do órgão regulador. Ela enfatizou a necessidade de cobrar dos administradores o dever de lealdade à companhia que estabelece a Lei das S.A. "Temos que superar a cultura de que tudo é culpa do controlador."

A maior parte das novatas na bolsa manteve os controladores no conselho de administração, deixando o corpo executivo para profissionais de mercado. Os empresários, porém, já estavam cientes do endurecimento da gestão anterior da CVM nas punições atribuídas a executivos estatutários e conselheiros.

Na tentativa de se protegerem, criaram estruturas de controle em cascata, com sociedades acima da companhia listada. Queriam, assim, esconder-se atrás do acordo de acionistas da cadeia controladora, pois o artigo 118 da Lei das S.A. prevê lealdade do conselheiro ao acordo do acionista que o elegeu.

Para Luiz Leonardo Cantidiano, ex-presidente da CVM, esse artigo não dilui em nada as responsabilidades dos conselheiros e executivos da empresa. "O poder, no geral, está com o administrador." João Nogueira Batista, presidente do conselho de administração do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri), enfatiza o dilema. "Quando a gente está desse lado (administração), vê que não é algo tão claro assim. Não é razoável votar contra o interesse daquele que o elegeu."

Diante do novo cenário, Batista defende o estímulo à participação do acionista nas assembléias, para que ele exerça seu poder de voto. "A coisa mais deprimente que tem é assembléia. Não aparece ninguém." Ele defende a reconstrução dessa ferramenta. (GV)