Título: Patentes e direitos de propriedade industrial
Autor: Silveira, Clóvis
Fonte: Valor Econômico, 10/08/2007, Legislação & Tributos, p. E2

Efetividade pressupõe eficiência e eficácia. Um time de futebol pode ser considerado eficiente se for rápido e controlar o jogo, mas não será eficaz se não colocar a bola no gol. A efetividade dos direitos do titular de uma patente depende da eficiência do processamento do pedido pelo órgão competente, como também da eficácia da patente eventualmente concedida. Ou seja, depende de sua capacidade de produzir o efeito esperado de excluir terceiros.

Quando o titular de um pedido de patente - seja ele uma pessoa física ou jurídica - deposita o pedido perante o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), inicia-se um período de incerteza, que pode arrastar-se por anos, que caracteriza uma situação jurídica única, muito peculiar, de expectativa de direito. Do momento da data do depósito do pedido até a decisão final dada pelo INPI, de indeferimento ou deferimento - que poderá resultar na concessão da patente -, o titular encontra-se na espera da efetivação de seu potencial direito, sem ter idéia da probabilidade de sucesso. Neste período suas decisões empresariais serão de risco e de avaliação não trivial.

A efetividade do direito decorrente de sua patente concedida - que é o que lhe interessa com relação à concorrência - não é ainda um fato, desconhecendo quando o será. Um longo período de incerteza desestimula suas iniciativas e desacredita a instituição. Trabalha na direção oposta do incentivo à inovação e da competitividade nacional. É contrário aos investimentos em tecnologia, sejam eles nacionais ou provenientes do exterior.

O INPI anuncia sua modernização, por meio da informatização de procedimentos, da implantação de um sistema desenhado e fornecido pelo Escritório Europeu de Patentes, buscando equiparar-se aos mais avançados escritórios de patente europeus. Anuncia também sua candidatura para tornar-se uma agência capacitada a realizar exames de pedidos internacionais depositados de acordo com o Tratado Internacional de Patentes, do qual o Brasil é signatário. Contudo, como fica a efetividade dos direitos dos titulares de patentes no Brasil, seja durante o período de expectativa, seja na fase pós-INPI, depois da eventual concessão?

-------------------------------------------------------------------------------- Quando o titular de um pedido de patente faz um depósito inicia-se um período de incerteza que pode arrastar-se por anos --------------------------------------------------------------------------------

O titular de um pedido depositado junto ao INPI tem seus primeiros problemas na fase do protocolo do pedido. O que acontecerá se, ao retornar à delegacia, o interessado não puder comprovar que depositou uma importantíssima documentação técnica e ela não for encontrada? Supondo-se que tal desastre não ocorra, inicia-se o período de incerteza de expectativa do direito.

Caberá então ao INPI, após processar e decidir os milhares de casos que se encontram em fila de espera - atualmente cerca de 80 mil pedidos à frente do interessado -, no momento azado, e iniciar o exame técnico do seu pedido, após a necessária busca de anterioridades, o que deveria ser executado com elevada competência técnica e qualidade, resultando em parecer técnico interno que, ao final dos trâmites e exigências, recomendará o indeferimento ou o deferimento do pedido. As decisões do INPI poderiam ser melhoradas em qualidade se houvesse um banco de dados disponibilizando as razões de deferimentos ou indeferimentos anteriores? O que dizer da qualidade das buscas efetuadas e dos exames técnicos? Há pessoal qualificado em número adequado? E o pós-INPI? Qual será a eficácia das patentes concedidas? Os titulares conseguirão exercer seus direitos se suas patentes tiverem sido inadequadamente concedidas?

Porque uma patente rápida, mas inadequadamente concedida, gerará um novo, inesperado e enorme problema para seu titular, pois ele agora poderá se defrontar com a Justiça, como réu de uma ação de nulidade de patente. Ele terá que lutar para demonstrar algo que não ficou claro ou bem resolvido. Sua patente apresenta-se frágil, seja porque as buscas realizadas pelos técnicos não foram capazes de apontar anterioridades que invalidariam o pedido, seja porque a patente foi concedida sem atender a certos requisitos legais, seja por falta de suficiência descritiva, seja por apresentar um quadro de reivindicações deficiente ou por ter sido concedida para o que não é considerado invenção.

Em todas estas situações, o titular da patente estará, após o primeiro longo período de expectativa de direito, passando por um novo longo período de expectativa, agora da confirmação ou da anulação do presumível direito. Ficará, então, dependente de um conhecimento especializado no campo da propriedade industrial, de juízes e dos peritos judiciais por eles nomeados.

Contudo, a realidade é que, de um modo geral, os juízes têm pouco ou nenhum conhecimento sobre a matéria, ocorrendo o mesmo com os peritos judiciais nomeados para se pronunciarem tecnicamente sobre patentes. É por esse motivo que as associações e os profissionais especializados têm procurado contribuir nas fases pré, durante e pós-INPI, no sentido de proporcionar uma maior efetividade dos direitos de propriedade industrial aos seus titulares.

Clóvis Silveira é presidente da Associação Paulista da Propriedade Intelectual (ASPI) e membro do conselho diretor da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (ABPI), que realiza em 28 de agosto o XXVII Seminário Nacional da Propriedade Intelectual, no Rio de Janeiro

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