Título: Ganhos vapt-vupt
Autor: Daniele Camba e Luciana Monteiro
Fonte: Valor Econômico, 20/01/2005, EU &, p. D1

O investimento em ações tem crescido muito nos últimos anos a ponto de a pessoa física já representar 30% de todos os negócios da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Mas, apesar de decidir arriscar mais em troca da possibilidade de maiores ganhos, o aplicador ainda mantém uma visão de curto prazo, que é um dos maiores erros em bolsa. Pesquisa realizada pela TradeNetwork em parceria com a Braskem com 250 visitantes da ExpoMoney realizada em outubro do ano passado em São Paulo revela que 52% dos investidores que aplicam em bolsa ficam até um ano com uma mesma ação. Desse total, 34% ficam menos de seis meses e os outros 18% entre seis meses e um ano. Dos 250 entrevistados, 67% investem em ações. Os especialistas não cansam de dizer que, mais do que qualquer outro investimento, bolsa é uma aplicação de longo prazo, ou seja, acima de cinco anos. Mas, entre os entrevistados, apenas 6% permanecem de três e dez anos com o mesmo papel. A média é um ano e sete meses. Segundo Robert Dannenberg, sócio da TradeNetwork, não dá para generalizar e dizer que o brasileiro tem uma visão de curto prazo apenas porque fica em média menos de dois anos com uma ação. Isso porque ele pode ter continuado no mercado comprando outro papel. E o volume crescente da Bovespa mostra que não há uma saída grande de investidores do mercado, lembra Dannenberg. "A média de um ano e sete meses na mesma ação é um tempo bem razoável", diz. Para o diretor da Fides Asset Management, Roque Sut Ribeiro, o novo investidor ainda não tem uma cultura de bolsa, e apenas procura oportunidades de ganhos pontuais. Isso tudo graças ao imbatível custo de oportunidade da taxa de juros. "Enquanto os juros forem tão altos, o brasileiro vai continuar apenas tirando uma casquinha no mercado acionário", diz. O gerente da mesa de operações da corretora Concórdia, Romeu Vidali, afirma que o prazo curto de permanência tem a ver com a idade dos novos investidores. A pesquisa mostra que 71% dos entrevistados na ExpoMoney têm até 39 anos. "Pessoas mais novas tendem a ser muito mais imediatistas", diz Vidali. Ele lembra que as carteiras mais estáveis dentro da Concórdia são de investidores mais velhos. "Com o passar dos anos e a experiência, eles percebem que é preciso tempo para o investimento em ações trazer retorno.". Para ele, o prazo ideal em bolsa é a partir de cinco anos. Na opinião de Fernando Camargo, sócio da Orbe Investimentos, a visão de curto prazo também está relacionada com uma venda malfeita dos fundos de ações passivos - cujo objetivo é somente acompanhar o Índice Bovespa - e ativos - que buscam superar o indicador. "Às vezes, a escolha de um papel que vai compor uma carteira ativa demora meses e o ganho esperado leva anos, por isso, o aplicador não pode ter visão de curto prazo", diz. Quando o assunto é o investimento direto em ações, Camargo diz que é preciso ter cuidado redobrado. "Sozinho, o risco triplica, pois o investidor não terá uma série de instrumentos para avaliar um papel." Para Álvaro Bandeira, diretor da Ágora Senior - corretora com um dos maiores volumes de pessoas físicas do mercado - seis meses não é um período tão curto para ficar com um papel. "O ideal seria permanecer mais tempo, mas a economia brasileira, ainda instável, muitas vezes faz com que o acionista seja obrigado a girar muito os papéis", diz Bandeira. Ele lembra que entre seus clientes há investidores de todos os tipos. Desde aqueles que querem uma "dica apenas para se dar bem" até os mais seguros, que analisam os fundamentos das empresas antes de investir. "No primeiro caso, a chance de se dar mal é bem maior." A pesquisa da TradeNetwork também revela que uma parte significativa do patrimônio das pessoas está em bolsa. Os entrevistados já têm 37,5% de seus recursos aplicados entre papéis de empresas e fundos de ações. De qualquer forma, esse percentual ainda perde dos mais de 50% investidos na renda fixa. Mesmo sem uma pesquisa anterior, Dannenberg acredita que a vantagem da renda fixa sobre as ações nas aplicações dos brasileiros já foi muito maior. "O investidor está perdendo o ceticismo em relação à bolsa", diz. Ele acredita que uma conjunção de fatores contribuiu para que as ações caíssem na simpatia do poupador. Entre eles: a campanha de popularização da Bovespa, a melhora da governança corporativa das empresas e regras mais rígidas de proteção ao investidor minoritário. A estabilidade econômica e mais recentemente o crescimento do país também ajudaram o investidor a sentir-se mais seguro e ser menos conservador nas aplicações. Prova disso é outro dado da pesquisa que mostra uma forte intenção de aplicar no mercado acionário. Entre os que não possuem ações, três em cada quatro entrevistados já tiveram alguma aplicação no mercado acionário e desistiram por considerar o negócio muito arriscado. No entanto, 78% deles têm a intenção de voltar à bolsa, em primeiro lugar pela rentabilidade e, em seguida, para diversificar os investimentos e pelas perspectivas do mercado. Entre preferidas do investidor estão as "blue chips" Companhia Vale do Rio Doce e Petrobras, com 48%. A liderança está ligada ao sucesso na venda de ações das duas empresas com o uso do FGTS. Segundo Dannenberg, isso também explica o fato de 22,75% do patrimônio das pessoas estarem aplicados em ações isoladas de empresas e não em uma cesta de papéis. Em seguida, na preferência dos acionistas aparecem Gerdau, com 27%, e Usiminas, com 21%. Braskem, Itaú e Bradesco ocupam a quarta colocação, com 19% do total. Para Dannenberg, o ranking mostra que o investidor ainda se sente seguro em comprar ações de grandes empresas, que não necessariamente têm os maiores ganhos, mas representam riscos menores. Segundo Vidali, da Concórdia, a preferência por ações de setores como siderurgia e bancos é um sinal de que o investidor dá prioridade para companhias sólidas, boas pagadoras de dividendos e geradoras de caixa. "O investidor não está atrás de idéias mirabolantes", lembra Vidali. Outro dado interessante da pesquisa é que 51% dos entrevistados que possuem ações adquiriram o hábito nos últimos dois anos - 12% nos últimos seis meses, 21% entre seis meses e um ano e 18% entre um e dois anos. Para Ribeiro, da Fides, as altas da bolsa em 2003 e 2004 foram decisivas para esse resultado. Além da facilidade de acesso ao pequeno investidor via internet, com a criação do home broker.