Título: Tesouro emite 500 mi euros em bônus externos; demanda passa de 1 bi de euros
Autor: Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 21/01/2005, Finanças, p. C2

O governo brasileiro emitiu ontem títulos em euros no mercado internacional, a sua primeira captação externa neste ano. Foram lançados 500 milhões de euros em papéis com vencimento em dez anos e, apesar de a demanda ter chegado a mais de 1 bilhão de euros, a decisão foi de captar somente os 500 milhões de euros (US$ 648,35 milhões, aproximadamente), o que deixou os investidores surpresos. "O Tesouro não precisa ter pressa em obter recursos e, corretamente, preferiu priorizar o preço", explicou Luis R. Berlfein, vice-presidente do BNP Paribas, um dos bancos líderes da operação. Os papéis foram vendidos pagando rendimento de 7,55% ao ano ao investidor, exatamente o mesmo que os títulos do Tesouro em dólar com vencimento em 2014 pagavam no mercado secundário na hora do fechamento do preço, segundo Berlfein. "Com a operação, o Tesouro mostrou que a curva de juros em euro para o Brasil não precisa ter prêmio em relação à curva em dólar", afirmou ele.

Também em relação às outras captações feitas em euro pelo governo Lula, em setembro do ano passado, o eurobônus emitido ontem apresentou juro baixo: a de 750 milhões de euros, com vencimento em oito anos, pagou 8,7% ao ano, 477 pontos básicos sobre o título do Tesouro alemão; e a ampliação de 250 milhões de euros, com mesmo prazo, pagou 8,17% ao ano, prêmio de 439 pontos básicos. Na captação de ontem, o prêmio sobre o título alemão foi menor: 398,5 pontos-básicos. O cupom (juro nominal) foi de 7,375% ao ano e o preço, de 98,80% do valor de face. Pela primeira vez, o BC não atuou como agente do Tesouro na captação externa - o Tesouro atuou sozinho. Mas o mercado não percebeu diferenças de estratégia ou resultados. Por ter juros "apertados" e ter deixado demanda não atendida, a operação abre portanto espaço para emissões mais baratas de empresas e bancos em euro, considera o Berlfein. "Hoje, os juros em dólar apresentam bem mais volatilidade do que os juros em euro", continuou. Além disso, com o enfraquecimento do dólar, a demanda por investimentos em euro é crescente. Os papéis do governo brasileiro foram comprados por investidores na Europa, principalmente Suíça, Alemanha e Inglaterra, disse. Também participaram investidores asiáticos e dos Estados Unidos. "A participação dos fundos de 'private banking' foi grande", disse Berlfein. Esses fundos reúnem os recursos das pessoas físicas ricas. A operação foi bem-vista pelo mercado. "O papel foi bem colocado e mostra a grande liquidez que existe no mercado internacional para comprar papéis do Brasil", disse Carlos Gribel, sócio-diretor da Eurovest Securities. "A estratégia do Brasil, de diversificar a sua exposição a moedas, faz sentido", afirmou o estrategista do WestLB, Ricardo Amorim, em relatório divulgado ontem. Segundo ele, apenas 7 bilhões de euros (aproximadamente US$ 9 bilhões), ou menos do que 15% da dívida total externa do governo federal do Brasil, de US$ 65 bilhões, é denominada em euros. Enquanto isso, as exportações para a Europa e o investimento externo direto vindo de lá representam os dois mais de 20% do total, acrescentou o analista. Amorim lembrou que no ano passado o Brasil já captou antecipadamente US$ 1,5 bilhão dos US$ 6 bilhões em emissões externas previstas para este ano. Com a emissão de ontem, restam menos do que US$ 4 bilhões para captação ao longo deste ano. Amorim estima ainda que, com as compras de dólares feitas pelo Banco Central e a emissão de ontem, as reservas internacionais líquidas - o caixa em moeda forte do país - estejam em US$ 30 bilhões hoje, na comparação com os US$ 27,5 bilhões do final do ano passado. "Com as reservas líquidas nesse nível e crescendo, a probabilidade de que o Brasil opte por não renovar o acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que vence em março é alta", afirmou ele. Em 2005, continuou Amorim, o Brasil vai pagar juros de US$ 1,1 bilhão ao FMI e, adicionalmente, se o acordo não for renovado, vai desembolsar US$ 7 bilhões em amortização de um total de US$ 25 bilhões devidos ao Fundo até 2007.