Título: Juros em alta freiam novas captações
Autor: Janes Rocha
Fonte: Valor Econômico, 21/01/2005, Finanças, p. C3

As sucessivas altas da taxa de juros básica, a Selic, e a intervenção no Banco Santos frearam em dezembro duas importantes fontes de financiamento das empresas médias e grandes no mercado financeiro: a emissão de Cédulas de Crédito Bancário (CCB) e de debêntures. O impacto dos dois fatores se refletiu no balanço de 2004 dos ativos registrados na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos (Cetip). Passam pela Cetip 73% dos títulos privados negociados no mercado financeiro brasileiro. O número de operações de CCB - título mais utilizado por empresas e bancos de médio porte, e do qual o Santos era um participante importante - caiu 8,5% em dezembro, comparado a novembro, de 15.085 operações para 13.801. Ainda assim, o volume financeiro destas operações teve ligeiro crescimento, de R$ 1,635 bilhão para R$ 1,651 bilhão. Como o mercado de CCB teve seu auge no ano passado, devido a uma mudança na regulamentação instituída no início do ano, os negócios vinham crescendo rapidamente e, comparado com o ano anterior, houve um avanço de quase 140%.

O estoque de debêntures (papéis mais voltados para grandes empresas) chegou ao final de dezembro em R$ 44,109 bilhões, com crescimento de apenas 3,2% comparado à posição em dezembro de 2003, de acordo com os dados da Cetip. O número de operações em estoque, de 263, caiu 17,5% em comparação ao início do ano. Segundo Antonio Carlos Teixeira, superintendente geral da Cetip, "pelo menos cinco emissões, totalizando R$ 1,5 bilhão, que estavam para ser registradas, foram suspensas em dezembro". O argumento para suspensão, colocado pelas empresas e bancos que preparavam estas operações, foi que a alta dos juros prejudicaria a colocação dos papéis junto a investidores. Por isso, decidiram aguardar uma retomada da queda da taxa Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom), relata Teixeira. O registro de debêntures na Cetip se dá no momento em que os papéis são negociados, etapa posterior ao registro (obrigatório) na CVM. O registro na Cetip é opcional, e pode não ocorrer (ou ser feito em parte), caso a emissão seja para colocação privada ou se os papéis permanecem na carteira da empresa, ou seja, não são vendidos para os investidores.

José Alexandre Costa de Freitas, sócio-diretor da Oliveira Trust DTVM, acha que o efeito da alta dos juros sobre a disposição de captação das empresas é temporário, pois há um volume considerável de debêntures em estudo pelas empresas e bancos. Segundo estatísticas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), as emissões em análise para futuro registro estão em R$ 2,756 bilhões, aproximadamente. Somadas à intenção de emissões anunciadas este mês, totalizam R$ 3,6 bilhões, o equivalente a 37,5% do total registrado em 2004, que foi R$ 9,6 bilhões. A Oliveira Trust, que atua como agente fiduciário de grande parte das emissões, fechou contrato em janeiro para duas novas captações, afirmou Freitas. Para Francisco Turra, diretor da Integral Trust, a queda na emissão de CCB em dezembro foi "pontual", reflexo do susto causado pela intervenção no Banco Santos (em 12 de novembro) e do estreitamento do fluxo de recursos para os bancos médios. "A tendência deste mercado é para cima", acredita Turra, lembrando que o volume total de emissões de CCB pode ser maior que o registrado na Cetip, já que boa parte dos papéis não passa pela central. Segundo ele, a flexibilidade na execução dos empréstimos via CCB tem atraído cada vez mais bancos para esse tipo de operação e algumas financeiras estão começando a migrar toda a carteira de Crédito Direto ao Consumidor (CDC) para CCB. Luis Ildefonso, vice-presidente do Banco Brascan, é da mesma opinião. Para ele, apesar do abalo da intervenção no Santos, "o mercado continua interessado em bons CCBs, de emissão de bancos reconhecidamente sérios e de empresas com 'rating' de qualidade". O Brascan foi o estruturador de duas emissões de CCB da incorporadora Gafisa e, segundo Ildefonso, outras três novas emissões estão em fase de montagem. Mauro Storino, analista da área corporativa da agência de classificação de risco de crédito Fitch, explica que a restrição de liquidez para os bancos médios, depois da intervenção, obrigou-os a "segurar um pouco o crédito", daí a retração dos CCB, que são, afinal, empréstimos concedidos às empresas sob outro formato que não as linhas diretas. Em dezembro, a Cetip tinha em seu estoque R$ 784,5 bilhões em papéis e contratos variados (veja tabela), um volume apenas 3,98% superior à posição de 2003. Dos ativos mais importantes no volume total, dois tiveram queda expressiva: os contratos de swap e os Certificados de Depósito Bancário (CDB). A redução da dívida cambial do Tesouro foi o que provocou a queda dos contratos de swap. Já o estoque de CDB sofre um efeito estatístico na comparação com dezembro de 2003, quando a Cetip registrou duas grandes operações, que depois não se repetiram.