Título: A importância da regularidade
Autor: Pereira, Rogério Aleixo
Fonte: Valor Econômico, 14/08/2007, Legislação & Tributos, p. E2

Estar em dia com o fisco parece não ser apenas uma obrigação legal, mas uma necessidade das empresas e de seus respectivos sócios. Quem já se deparou com alguma restrição pessoal ou comercial por conta de pendências cadastrais ou fiscais sabe muito bem o que significa "correr atrás do prejuízo", sem contar o fato de que, às vezes, nem sempre é possível resolver o assunto a tempo de não perder o negócio.

Fazendo-se uma breve verificação da legislação em vigor - e aí não estamos falando somente da legislação tributária - verificamos que a existência de pendências de cunho fiscal pode acarretar uma série de problemas. Um deles é a própria perda de negócios junto a clientes privados. Cada vez mais as empresas estão exigindo a demonstração de regularidade fiscal de seus contratados, uma vez que eventuais problemas de seus fornecedores podem prejudicar o cumprimento dos objetivos da contratação. A possibilidade de perda de negócios junto ao governo, no caso de participação da empresa em licitações, também existe. Neste caso, não é preciso ser um jurista para saber que o governo só contrata empresas regulares, por disposição legal.

Além destes problemas, há outros de cunho burocrático causados pela existência de pendências fiscais. Como exemplo, o fato de o fisco só admitir o encerramento de uma empresa que não possua dívidas - logo, estar em dia com o mesmo é uma necessidade, já que, estando aberta a empresa, algumas obrigações fiscais e trabalhistas continuam obrigatórias, como as declarações fiscais e a Relação Anual de Informações Sociais (Rais), por exemplo. Pendências fiscais também impedem a abertura de uma nova empresa. Há disposição na legislação tributária no sentido de que só se concederá o CNPJ de uma nova empresa se os seus sócios não tiverem pendências pessoais em outras empresas do qual participem.

-------------------------------------------------------------------------------- O trabalho de verificação da situação fiscal e cadastral não deve ser feito apenas uma vez, mas continuamente --------------------------------------------------------------------------------

Além disso, há a possibilidade de penhora de bens: se houver uma dívida fiscal, a mesma será cobrada. Isso pode demorar um pouco, por conta da notória falta de recursos das procuradorias e dos juízos, mas certamente haverá uma cobrança. E é preciso lembrar que qualquer defesa a ser feita na Justiça demanda a contração de um advogado. É preciso lembrar, também, do instrumento da penhora on line de contas bancárias, já totalmente difundido no Poder Judiciário e nas procuradorias, que vêm requerendo aos juízos sua aplicação de maneira mais efetiva. Quem já teve a surpresa de ter o numerário de uma de suas contas bancárias sabe da dificuldade em se reverter tal situação. Ainda mais porque as execuções, muitas vezes, aparecem sem que o contribuinte saiba que têm contra si uma dívida fiscal. Têm sido praxe o ajuizamento de ações antes de o contribuinte ser informado da existência da dívida e antes de processados os seus requerimentos demonstrando que as mesmas são inexistentes - o chamado envelopamento.

Também não é preciso dizer que as pendências fiscais impedem a obtenção de financiamentos, já que os bancos não emprestam numerário a empresas com problemas fiscais. Aliás, já tomamos conhecimento de algumas instituições que não emprestam dinheiro às empresas se os sócios participam de outras sociedades com problemas, ou têm problemas particulares com o fisco. Estas mesmas empresas ficam ainda impedidas de vender bens particulares como imóveis. Vigora atualmente uma disposição legal no sentido de que, na pendência de uma inscrição em dívida ativa, os atos negociais desta natureza poderão ser objeto de anulação. É o caso, por exemplo, de uma empresa que faça a venda de um de seus imóveis hoje, mesmo com pendências fiscais. Por força desta nova legislação, o negócio poderá ser anulado pelo juiz competente caso a empresa vendedora não possua bens para garantir o débito que estava inscrito à época da venda e compra.

A empresa em débito com o fisco também não consegue encerrar um inventário - as quotas de uma sociedade limitada constituem-se de bens passíveis de inventário. Não se trata, na verdade, de uma opção em inventariá-las, mas sim de uma obrigação legal. Qualquer modificação no quadro societário das empresas, por conta da sucessão causa mortis, depende de alvarás ou formais de partilhas expedidos pelo Poder Judiciário. Mas não é só isso. Se a empresa tiver problemas fiscais, mesmo com a posse de tal documentação não será possível efetuar modificações societárias, principalmente aquelas que transmitem mais de 50% das quotas. E, por fim, as pendências fiscais também impedem a empresa de aderir ao Supersimples, já que a lei não permite que empresas sem regularidade fiscal possam ingressar neste regime tributário. Como vêm sendo divulgado por toda a imprensa, são milhares de empresas que, por conta de irregularidades tributárias, não estão podendo aderir ao Supersimples.

O que fazer diante de tal quadro? O primeiro passo para não ser "contemplado" com algum destes dissabores é o de obter a certificação digital do responsável da empresa perante a Secretaria da Receita Federal do Brasil, bem como a obtenção de senha on line do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), já que é possível obter rapidamente e a qualquer tempo (inclusive durante períodos de greves de servidores) os dados relativos à situação fiscal e cadastral da sociedade. Feita tal verificação, a empresa e o empresário devem atacar imediatamente as eventuais pendências, segundo os procedimentos administrativos oferecidos pelo fisco (envelopamento, conta-corrente etc.).

O trabalho de verificação da situação fiscal e cadastral não deve ser feito apenas uma vez, mas continuamente. O mesmo deve ser feito em relação ao acompanhamento dos processos de revisão de débito descritos acima. Isto deve ser feito mensalmente e, caso os mesmos não sejam solucionados no prazo de um ano, que seja proposta uma medida judicial no sentido de obrigar a análise de eventuais pedidos - acreditem, há dispositivo de lei que obriga a Receita Federal a analisar os processos administrativos neste prazo. Este procedimento já vem sendo adotado por algumas empresas em relação a processos de regularização antigos e o Poder Judiciário têm respondido positivamente a tais pedidos, determinando a verificação imediata dos respectivos procedimentos, principalmente porque o contribuinte tem direito a um serviço público eficiente.

Rogério Aleixo Pereira é advogado tributarista, sócio do escritório Aleixo Pereira Advogados e membro do Conselho Municipal de Tributos de São Paulo

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