Título: Renan tenta reassumir o controle da agenda parlamentar
Autor: Ulhôa, Raquel e Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 16/08/2007, Política, p. A9

O presidente do Senado, Renan Calheiros, lançou ontem uma ofensiva para tentar retomar as rédeas do comando do Congresso. Acertou com os líderes a instalação, amanhã, da CPI das ONGs, propôs um entendimento prévio entre a Câmara e o Senado para a aprovação da CPMF e avisou a oposição que seus interesses serão levados em consideração no momento em que a prorrogação do "imposto do cheque" for a plenário.

"No Senado a relação de forças é muito apertada", disse Renan. "Não é possível aprovar uma emenda constitucional sem negociação, sem acordo. O papel da oposição no Senado é relevante". Ao mesmo tempo, propôs um entendimento entre os líderes partidários da Câmara e do Senado para que a CPMF seja aprovada no prazo (fim de setembro) que permita sua cobrança já a partir de 1º de janeiro.

Renan desencadeou a ofensiva depois de almoço oferecido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao presidente de Benin, no Itamaraty. À saída, Lula disse que a crise do Senado não estava interferindo nas votações. "Nunca imaginei sangrar tanto. Já se vão quase 80 dias, sem que se apresentasse nenhum fato que fosse incompatível com o decoro parlamentar", disse Renan, tentando transmitir uma aparência de normalidade.

Na realidade, a oposição tem interesse na instalação da CPI das ONGs, cuja criação foi proposta pelo senador Heráclito Fortes (DEM-PI). Renan conta ainda em votar uma das três medidas provisórias em tramitação no Senado para reforçar a aparência de normalidade. Mas a medida em questão, que trata da renegociação de dívidas agrícolas, também interessa à oposição, especialmente o Democratas, partido que mais radicalizou posição pelo afastamento de Renan.

A votação da CPMF é um trunfo que Renan julga dispor na tentativa de se manter no cargo. Agrada ao governo do propor o entendimento para que a aprovação ocorra dentro do prazo necessário ao cumprimento da noventena, mas mantém um canal com a oposição ao afirmar que o projeto não passa sem um entendimento amplo. O presidente do Senado sabe que é improvável que a emenda saia da Câmara antes de setembro. Ele próprio fez um levantamento das três prorrogações anteriores. Na Câmara, o tempo médio de tramitação foi de pouco mais de quatro meses; no Senado, de dois meses.

Sem um entendimento prévio entre as duas Casas, o que também é improvável, o projeto será aprovado após o prazo necessário para que o governo possa cobrar a CPMF já a partir de 1º de janeiro, depois de cumprida a noventena. E são grandes as chances de o projeto modificar o projeto. O problema, segundo Renan, é que os governadores querem partilhar a contribuição com os Estados, enquanto o Senado já se manifestou pela redução do tributo. "O Mantega (ministro Guido Mantega, da Fazenda) negocia muito bem com o parlamento. Ele sabe que as dificuldades são maiores no Senado, em função da proporção maior da oposição", disse.

O corregedor do Senado, Romeu Tuma (DEM-SP), ouve hoje em Maceió (AL) o depoimento do usineiro João Lyra a respeito da denúncia feita pela revista Veja - e confirmada por Lyra em entrevista - de que ele teria comprado duas emissoras de rádio e um jornal em Alagoas em conjunto com o presidente do Senado, mas em nome de "laranjas".

Essa é uma das razões pelas quais o grupo de Renan acredita que essa denúncia, que motivou a terceira representação aberta no Conselho de Ética e Decoro parlamentar do Senado contra o presidente do Senado, será arquivada no próprio colegiado. Aliados do pemedebistas apostam que apenas a primeira representação - que originou apuração sobre pagamento de pensão por Renan à mãe de uma filha sua por meio de um lobista da construtora Mendes Júnior - chegará ao plenário.

O parecer do conselho deve ser adiado em pelo menos uma semana, já que a Polícia Federal concluirá apenas na segunda-feira a perícia nos documentos do caso. Permanecer na presidência do Senado é fundamental no objetivo de Renan. Ele acha que, sem o poder do cargo, correrá sério risco de cassação. Não acredita naqueles que propõem, nos bastidores, sua renúncia ao cargo em troca da manutenção do mandato. "Se eu cedesse qualquer espaço, colaboraria com o entendimento de que sou culpado", disse.