Título: Cresce risco de retração econômica
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 16/08/2007, Finanças, p. C1

São os temores de que o estouro na bolha imobiliária nos Estados Unidos traga um "colapso no crescimento econômico global" que têm levado os mercados financeiros internacionais a um movimento contínuo de reprecificação do risco, na visão de Kenneth Rogoff, ex-economista-chefe do FMI e professor de Harvard. Para ele, existe um perigo real e crescente de que a queda nos preços das moradias americanas se aprofunde e tenha um impacto mais pronunciado no consumo do maior mercado comprador de produtos no mundo, com efeitos sobre o crescimento dos demais países, o comércio internacional e o preço das commodities.

"Há um risco de a atual crise persistir e até piorar", afirmou ele, pouco antes de concorrida palestra em São Paulo, promovida pelo BBM Investimentos. Na visão de Rogoff, o perigo de uma recessão nos Estados Unidos, que é de 10% em uma situação "normal", cresceu agora para 25%. "Ainda é pequeno, portanto", diz ele. Rogoff acredita em uma retração de 1,5% a 2% no consumo nos Estados Unidos, mas não em um "colapso".

"Ironicamente, os investidores saíram vendendo ações dos bancos brasileiros com medo de que eles tenham crédito americano em suas carteiras", disse. Não apenas os bancos em todo o mundo estão no olho do furacão financeiro, que se iniciou com o não-pagamento de hipotecas nos EUA. O medo de que perdas de vários fundos estejam escondidas por meio das complexas estruturas de derivativos de crédito tem deixado os investidores alertas. "Esses novos produtos, que no papel parecem excelentes, realmente ainda não foram testados em uma crise e podem trazer surpresas", afirmou.

Para Rogoff, nem o Fed, banco central dos Estados Unidos, nem o Banco Central Europeu sabiam a dimensão da crise quando decidiram, em suas últimas reuniões, manter os juros básicos estáveis. Hoje, estão em uma situação difícil, pois, se baixarem as taxas, podem sinalizar ao mercado que o pior está por vir. "Eles não querem ser vistos como alguém que baixou os juros para agradar os mercados ou para socorrer um fundo ou um banco", disse o economista. Rogoff acredita que, no entanto, se mais indicadores de uma recessão se avolumarem, o Fed "vai se mover".

"Bernanke (o presidente do Fed, Ben Bernanke) é meu amigo e eu sei que ele não vai querer ficar com a fama de quem comandou o mundo para a recessão", afirmou, para completar: "A bolha pode ter sido do Greenspan (Alan Greenspan, ex-presidente do Fed), mas a recessão seria do Bernanke".

Para Rogoff, a crise financeira atual, pelo menos por enquanto, não assumiu as proporções dos últimos furacões financeiros, cujos epicentros eram os mercados emergentes. Segundo ele, bancos europeus na semana passada tiveram sérios problemas de liquidez e foram socorridos. Bancos têm chamado margens de garantias de inúmeros fundos, muitos dos quais têm impedido resgates. "Mas eu sei também de outros fundos que apostaram contra o mercado de hipotecas de alto risco nos Estados Unidos e ganharam dinheiro", comentou. "Esses fundos não aparecem nos jornais", afirmou. "Até agora ninguém sabe a dimensão das perdas no mercado de crédito dos EUA", completou Pedro Moreira Salles, presidente do Unibanco.

Rogoff acredita que, sem o colapso no crescimento econômico global, o Brasil poderá sair "mais fortalecido" da crise, mas com prêmios de risco de crédito mais elevados. Nessa hipótese, os ativos brasileiros podem ter sido até vendidos em excesso, afirmou.

Como o Brasil é credor externo líquido, uma desvalorização no câmbio tem impacto positivo sobre as contas públicas, lembra Beny Parnes, ex-diretor do Banco Central e diretor-executivo do BBM. No entanto, o dólar mais forte pode fazer com que o BC adote uma política monetária mais restritiva, alerta a economista Eliana Cardoso.