Título: Fazenda planeja dobrar corte no Orçamento e enfrenta resistências
Autor: Cristiano Romero
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2005, Política, p. A6

A história se repete. Mais uma vez, o governo federal inicia o ano promovendo cortes significativos no Orçamento aprovado pelo Congresso. Em 2004, o contingenciamento feito no início do ano bloqueou R$ 6 bilhões - R$ 3 bilhões do que estava previsto para investimentos e R$ 3 bilhões para custeio. Neste ano, a área econômica estuda fazer um corte bem maior: algo entre R$ 12 bilhões e R$ 16 bilhões. A resistência a esse corte é grande, inclusive, dentro do Palácio do Planalto. Por isso, o plano, debatido nas reuniões da Junta Orçamentária, é anunciar o contingenciamento apenas quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estiver fora do país - na sexta-feira, ele estará na Suíça, participando do Fórum de Davos, só devendo retornar ao país no fim de semana. Nos debates internos, a equipe econômica liderada pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci, tem argumentado que o governo precisa emitir um forte sinal de austeridade fiscal para reverter expectativas negativas criadas no fim de 2004. Naquela ocasião, algumas decisões inesperadas do próprio governo, como o reajuste linear dos valores da tabela do Imposto de Renda, provocarão renúncias de arrecadação. O Orçamento aprovado pelo Congresso prevê investimento de R$ 21,5 bilhões em 2005. Desde o início, a área técnica do governo considerou esse valor "impraticável". Ele representaria um incremento de 120% em relação ao que foi gasto em 2004. Segundo assessores graduados do governo, a idéia é assegurar, na primeira reprogramação orçamentária, R$ 9,8 bilhões para os investimentos, portanto, o mesmo patamar gasto no último ano. Dos R$ 9,8 bilhões, R$ 2,8 bilhões dizem respeito à "emenda FMI", como os parlamentares batizaram a nova forma de cálculo do superávit primário das contas públicos. Pela nova sistemática, os investimentos em infra-estrutura não serão mais contabilizados como gasto. Técnicos do governo alegam que, em 2004, os gastos com custeio, investimentos e pessoal cresceram de forma significativa. No caso de custeio, excluindo-se pessoal, as despesas aumentaram R$ 2,645 bilhões, o equivalente a 25% do que havia sido gasto em 2003. Já as despesas com os salários dos servidores públicos cresceram R$ 12 bilhões no ano passado - para este ano 2005, haverá novo incremento, estimado em mais de R$ 9 bilhões. Os gastos com investimento, por sua vez, expandiram cerca de 78%. Do total que poderá ser contingenciado neste ano, algo entre R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões virá, portanto, do investimento total previsto pelo Congresso. O restante será obtido por meio de cortes nas despesas com custeio. "É preciso lembrar que, em 2004, os gastos com investimentos e custeio aumentaram R$ 11 bilhões", explicou um assessor do governo. Um argumento que vem sendo usado pela área técnica é o de que o contingenciamento não necessariamente resulta em corte de despesas, na medida em que ao longo do ano, dependendo do comportamento da arrecadação, o governo pode reprogramar o Orçamento. Em 2004, dos R$ 6 bilhões previstos inicialmente, R$ 2,5 bilhões foram desbloqueados. Estava prevista para ontem a sanção do orçamento, mas o decreto, com a reprogramação, só deverá ser publicado nos próximos dias.