Título: Oferta extra nas mãos de 4 bancos
Autor: Janes Rocha
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2005, Finanças, p. C1

Somente quatro bancos serão responsáveis por uma oferta de R$ 11,5 bilhões em crédito imobiliário neste ano e deverão perder até R$ 500 milhões com isso. "O custo de oportunidade será colossal", disse o analista do ING, Pedro Guimarães, que fez os cálculos. E não é só isso: no próximo ano, esses bancos terão que oferecer mais R$ 11,5 bilhões ao mercado e, em 2007, mais R$ 7 bilhões. Somente Bradesco e Itaú terão que emprestar neste ano aproximadamente o dobro das carteiras atuais. No caso do Bradesco, isso significa R$ 5 bilhões; e no do Itaú, R$ 3,9 bilhões calculou Guimarães. O Unibanco, que tem carteira de R$ 1 bilhão, terá que emprestar quantia igual, R$ 1,1 bilhão. Já o Banco Nossa Caixa terá que direcionar R$ 1,5 bilhão, cinco vezes a carteira atual (R$ 319 milhões). Os quatro bancos representam 93% da oferta extra de crédito imobiliário que virá ao mercado neste ano em consequência da regra que começou a vigorar em 2002 e foi acelerada em 2004. A regra introduziu uma redução gradual do estoque de Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS) como enquadramento na exigência de direcionar 65% da caderneta de poupança ao crédito imobiliário. Foram atingidos os bancos que tinham mais crédito imobiliário na década de 80, quando foi criado o FCVS. O fundo surgiu para compensar os bancos pela troca da inflação pela variação salarial na correção do crédito imobiliário. Com a disparada da inflação, o governo cobriu a defasagem com o FCVS, mas jamais pagou a dívida. Quando alguns bancos entraram no Proer, na década de 90, o BC permitiu que o FCVS fosse vendido a essas instituições por 40% do valor de face para serem usados como garantia do apoio do governo. Como os grandes bancos já haviam provisionado esses títulos, a receita entrou como lucro, reduzindo o impacto da perda com floating do Plano Real. "Assim como a Argentina, o governo também deu um calote de 60% nos bancos", afirmou Guimarães. Em nova tentativa de amenizar as perdas, o BC permitiu que os bancos usassem o FCVS que já haviam vendido - chamado por isso de FCVS virtual - como enquadramento nas aplicações compulsórias de crédito imobiliário. Assim, os recursos captados na poupança poderiam ser, na prática, dirigidos para títulos e valores mobiliários. Guimarães calculou em R$ 500 milhões a diferença entre os bancos pagam aos aplicadores da poupança e o que ganham canalizando os recursos para títulos públicos corrigidos pela taxa Selic. Em setembro de 2002, para estimular o crédito imobiliário, o governo Fernando Henrique estabeleceu, pela resolução 3.005, que o saldo de FCVS diminuiria no ritmo de 1% ao mês para efeito de enquadramento na aplicação compulsória em crédito imobiliário. Na prática, a resolução estabelecia assim prazo de 100 meses para zerar o saldo. Em março do ano passado, pela resolução 3.177, o ritmo de redução foi dobrado para 2% ao mês, encurtando para 42 meses o prazo de zeragem do estoque. O analista acredita que os bancos convencerão o BC a mudar a regra e levarão os clientes para outras aplicações que não a poupança.