Título: Proposta quer ampliar público alvo
Autor: Janes Rocha
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2005, Finanças, p. C1

Os bancos que operam crédito imobiliário e as empresas da construção apresentaram uma proposta conjunta ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, para elevar o volume de financiamentos e o número de pessoas que poderão se candidatar ao crédito. Mas os bancos alertam: dificilmente o volume de crédito atingirá, este ano, os R$ 12,8 bilhões exigidos pela Resolução 3.177 do Banco Central que regula a aplicação de recursos da caderneta de poupança no crédito imobiliário. A expectativa é ampliar dos R$ 3 bilhões de 2004 para no máximo R$ 4 bilhões. A proposta conjunta envolve a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) e a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Apresentada no início de janeiro, inclui reduzir o valor mínimo do financiamento de R$ 80 mil para R$ 40 mil, aumentar o prazo de financiamento de 15 anos para 20 anos e aumentar o valor máximo do imóvel candidato a crédito de R$ 300 mil para R$ 450 mil. As regras para o financiamento de imóveis residenciais seriam flexibilizadas. A taxa de juros, que hoje é de 12% ao ano, entraria para uma escala que começa em 9% ao ano para financiamentos até R$ 60 mil; 10% ao ano para imóveis de R$ 60 mil a R$ 100 mil; 11% entre R$ 100 mil e R$ 150 mil; e 12% acima de R$ 150 mil. O comprometimento da renda do tomador sobe dos atuais 20% para algo entre 25% e 30% (hoje só os financiamentos com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS - podem comprometer 30% da renda). A parcela financiada sobe de 60% para 80% do valor do imóvel. Para entrarem em prática, as medidas dependem de autorização do Conselho Monetário Nacional (CMN), o que deve acontecer até o final de fevereiro, na expectativa de Décio Tenerello, presidente da Abecip e diretor de crédito imobiliário do Bradesco. A proposta também inclui aliviar os bancos da exigência de aplicação de 2% do dinheiro do Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS) e da caderneta de poupança em empréstimos imobiliários. As instituições financeiras estão preocupadas (e o governo está cobrando) com a imposição da Resolução 3177 de cumprir o acordo, firmado no ano 2000 entre os bancos e o BC, para liberar em parcelas o saldo do FCVS acumulado de uma renegociação realizada em 1996. Essa resolução foi alterada em 2004, elevando de 1% para 2% o crédito de FCVS que os bancos deveriam obrigatoriamente liberar para financiamentos à casa própria. Pela proposta das duas entidades, a alíquota seria reduzida ou a aplicação dos recursos, quando destinadas ao público de baixa renda, seria contabilizada em dobro para efeito de cumprimento da resolução. O problema é que o setor da construção está deprimido há anos por falta de renda da população. "Temos disposição de emprestar, mas não há produto nem consumidor com renda suficiente", explicou Décio Tenerello. "O mercado não tem demanda para R$ 12 bilhões", sustenta Luiz Antonio Rodrigues, diretor de crédito imobiliário do Banco Itaú. Na verdade, demanda não falta. Calcula-se que o déficit habitacional do país é de mais de 7,5 milhões residências. Porém, essa demanda é concentrada (95%) nas famílias com renda mensal até cinco salários mínimos (R$ 1,3 mil hoje). Os bancos resistem a financiar esse público que, na maioria, são pessoas que vivem da economia informal, não comprovam renda, às vezes nem sequer endereço, e muitas estão no cadastro negativo de crédito. Rodrigues diz que, nessa faixa de renda, as pessoas não têm capacidade de pagamento - pelas regras atuais, financiar um imóvel, por exemplo, de R$ 40 mil custaria algo como R$ 640 por mês, a juros de 1% ao mês mais TR, mais as amortizações. "Pelas regras do próprio Banco Central, não podemos emprestar para quem tem cadastro negativo ou não comprova renda", sustenta Natalino Gazonato, diretor de crédito imobiliário da Nossa Caixa. O presidente da CBIC, Paulo Safady Simão, confirma que o setor não tem projetos suficientes em andamento para absorver os R$ 12,8 bilhões. O acordo fechado este ano - e que vinha sendo negociado desde agosto de 2004 - prevê que os bancos liberam, a princípio, 30% mais este ano comparado a 2004 (o que dá aproximadamente R$ 4 bilhões), meta que será revista, em conjunto, a cada três meses. Se, na revisão, a demanda for maior, os bancos liberam mais. "Os bancos estão com as carteiras abertas", garante Decio Tenerello. É a primeira vez os bancos e as empresas da construção chegaram a um acordo sobre as dificuldades do segmento e como resolvê-las, diz Simão. "Estamos construindo um novo mercado imobiliário", afirmou o presidente da CBIC.