Título: Ministério prevê processo de regularização de áreas em cidades
Autor: Izaguirre,Mônica
Fonte: Valor Econômico, 27/08/2007, Brasil, p. A4
Mais de 70% dos municípios que já tomaram a iniciativa de elaborar ou de rever o respectivo plano diretor por exigência do Estatuto das Cidades destinaram áreas para implantação de Zonas Especiais de Interesse Social, as Zeis. A constatação é de uma pesquisa do Ministério das Cidades. Para o secretário nacional de Programas Urbanos do ministério, Benny Schasberg, esse é o prenúncio de que o país passará, nos próximos anos, por um grande processo de regularização de áreas hoje ocupadas irregularmente por populações de baixa renda.
Como permitem a aplicação de regras de parcelamento de solo e de edificação definidas especialmente para cada caso, "as Zonas Especiais de Interesse Social são um instrumento poderosíssimo de regularização fundiária nas mãos dos municípios", diz Schasberg. Então, se houver vontade política local, acredita ele, o processo se dará mesmo que o Congresso não aprove ou demore muito a aprovar a reforma da Lei 6.766/79, que regula, em nível nacional, o parcelamento de solo urbano.
A reforma está em discussão desde o ano 2000. Um dos objetivos do respectivo projeto de lei, que é muito mais amplo, é justamente permitir que as prefeituras adotem critérios mais flexíveis de ocupação do solo para poder regularizar situações estabelecidas de fato e que, em geral, são irreversíveis, como grandes favelas. "Usando o plano diretor (PD) e as Zonas Especiais de Interesse Social, no entanto, as prefeituras não precisarão esperar pela mudança da Lei 6.766", pois o Estatuto da Cidades, que criou esse instrumento em 2001, já dá base legal, entende Benny Schasberg.
Pelas contas do ministério, 1.678 municípios brasileiros foram obrigados pelo estatuto a fazer ou a rever seu plano diretor - lei local que define a política de expansão urbana e como deve ser ocupado o território municipal. Desse total, até março deste ano, 1.335 deles já tinham tomado a iniciativa se não de aprovar, pelo menos de elaborar o plano ou sua revisão. Entre esses, os que destinaram áreas para as Zeis no plano diretor chegam a 977, quase a 73%.
O percentual cresce, alcançando 83,3%, quando se olha apenas o grupo de municípios com mais de 500 mil habitantes. Naqueles com população entre 100 mil e 500 mil pessoas, o índice é ainda maior, chegando a 88,5%. É principalmente nas grandes cidades que se concentram as favelas e outras formas irregulares de ocupação do solo por populações pobres. Por isso, esse detalhe da pesquisa reforça a expectativa de Benny Schasberg de que está para se iniciar uma onda de regularização fundiária no país a partir da implementação dos novos planos diretores.
O processo só não começou ainda, pelo menos não em larga escala, porque o prazo dado pelo Estatuto das Cidades para aprovação dos planos terminou só em outubro de 2006 e muitos ainda se atrasaram.
A pesquisa do Ministério das Cidades mostrou ainda que a maioria dos planos diretores prevê instrumentos de combate à especulação imobiliária e de desenvolvimento urbano. Segundo Schasberg, isso é importante para dar efetividade a essas leis municipais, ou seja, para que a ocupação territorial de fato ocorra conforme o que foi nelas estabelecido. O parcelamento ou edificação compulsórios, por exemplo, foi adotado por 838 cidades, cerca de 63% das 1335 que elaboraram seu plano diretor até março de 2007.
Associado a um imposto territorial com alíquota progressiva no tempo, esse tipo de instrumento é usado para evitar que grandes áreas fiquem ociosas à espera de obras públicas de infra-estrutura que proporcionem sua valorização. Se não edifica nem parcela em lotes menores, depois de determinado prazo, o dono passa a pagar um IPTU cada vez mais alto.
A outorga onerosa do direito de construir - quando o município não proíbe, mas cobra para autorizar um percentual de área construída superior ao padrão estabelecido - foi adotada em 54% dos casos. Não tão alto, mas também significativo, é o percentual dos planos que prevêem outorga onerosa para alteração de uso de solo, ou seja, quando a prefeitura cobra para permitir destinação diferente da original para um terreno.
Benny Schasberg explica que esses são "dois instrumentos Robin Wood", pois permitem aos cofres públicos e, portanto, à sociedade se apropriar de parcela da valorização imobiliária decorrente da mudança da destinação ou do aumento do limite de área construída de um terreno. "Numa única canetada", explica ele, essas outorgas costumam gerar enriquecimento do dono da terra, que, sem construir nada, costuma vendê-la por um preço bem mais alto, logo depois. Por isso, defende, podem e devem ser onerosas, de forma a gerar recursos para aplicação em infra-estrutura urbana de áreas mais pobres.
Outro importante instrumento de desenvolvimento urbano, na opinião de Benny Schasberg, é o direito de preempção, previsto em 61% dos planos diretores analisados na pesquisa do Ministério das Cidades. Isso dá às prefeituras a preferência de direito de compra se determinadas áreas forem colocadas à venda. Normalmente, são áreas nas quais o município quer colocar equipamentos públicos, como praças e parques, mas não de imediato.