Título: Brasil não deve copiar Ásia, diz Conceição
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 29/08/2007, Brasil, p. A4

A relação centro/periferia mudou e o Brasil não é mais a periferia preferencial do capitalismo - agora esse papel é ocupado pela Ásia. Apesar disso, o futuro do Brasil não é se tornar asiático e os países centrais ainda têm interesse no país como o centro de custos mais importante da América Latina, destacou a economista Maria da Conceição Tavares, durante aula inaugural do curso de desenvolvimento econômico, promovido pelo Centro Internacional Celso Furtado. Para ela, no entanto, o que vai definir se o Brasil se tornará uma "fortaleza de expansão dos Estados Unidos" é o que virá como resultado dos processos de desnacionalização e internacionalização das nossas empresas.

Na análise da economista, o Brasil está protegido contra uma turbulência forte e mesmo uma recessão dos Estados Unidos, devido ao que denominou "lado bom do conservadorismo do Banco Central". Para Conceição, a única coisa boa que o Banco Central fez não foi elevar a taxa de juros, "mas subir as reservas e diminuir a dívida externa".

Ela destacou, porém, que a economia brasileira ainda tem o passivo de curto prazo das empresas e não dispõe de controle de capitais para se proteger de uma fuga de capitais. Raciocina, no entanto, que se houver uma crise muito forte, os capitais não terão para onde fugir, apesar de terem, recentemente, corrido para os títulos americanos. "Se houver uma depressão mundial vamos todos para o "beleléu", inclusive a China."

Ao discorrer sobre a economia brasileira, Conceição considerou que em princípio, o potencial de crescimento do Brasil é hoje maior que o da maioria dos países da América Latina e África. "Agora, não é maior que o da Ásia, que ainda está no ciclo da industrialização pesada." Entretanto, ela não vê nenhuma vantagem em comparar o país com os Tigres Asiáticos. "Espero que o país não vire um asiático na pobreza e que nossas metrópoles não se pareçam com as da Índia, que pode crescer o quanto quiser, mas suas grandes cidades continuarão sendo o inferno em vida." A economista avalia que ser asiático, americano ou europeu não é uma característica que dure para sempre no mundo globalizado.

O Brasil entrou numa trajetória de crescimento a partir de 2006 e ela acredita que o país vive agora o desafio de continuar nesta estrada. Porém, para ser bem-sucedido no desenho de um modelo econômico sustentável, o governo Lula terá que recompor o tripé de desenvolvimento sustentado pela aliança do Estado, do capital estrangeiro e do capital nacional, que vigorou nos anos JK e Geisel.

Para ela, o grande desafio do país é acabar com o gargalo da infra-estrutura. "O PAC está rastejando, mas a ministra (da Casa Civil, Dilma Rousseff) demonstra uma grande paciência para restaurar o tripé do desenvolvimento desmantelado no governo Fernando Henrique Cardoso.

Na visão de Conceição Tavares, o problema mais complexo do país, na área da infra-estrutura, é o setor elétrico. "Foi a privatização mais porca de todas." Para ela, ninguém está de acordo com o modelo elétrico do país. "A ministra Dilma acertou como pode este modelo, que era uma colcha de retalhos e acabou no apagão."

A economista lembrou que o Brasil teve sua industrialização promovida por Getúlio Vargas, que em seus dois governos não recebeu nenhum apoio do capital estrangeiro. Na era JK foi desenvolvido o Plano de Metas e, nos anos 70 e 80, o país conseguiu se equilibrar por conta de uma administração da economia que visava salvar os bancos e as empresas tocada por Delfim Neto e Reis Velloso, o que garantiu que o parque industrial brasileiro não fosse arrasado, como aconteceu com a Argentina e o Chile na crise da dívida.

"O Estado brasileiro sempre foi forte", lembrou Conceição Tavares. "Só tivemos neoliberalismo no governo Dutra, um período rápido na gestão Campos-Bulhões e, infelizmente nos oito anos do Fernando Henrique Cardoso, quando levamos uma desarrumação brutal do capitalismo, mas que não chegou a destruir nada significativo da nossa indústria, só nossos sonhos de um Brasil independente", acrescentou.