Título: A intimidação ambiental da nova Europa
Autor: Dombrovskis, Valdis
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2007, Opinião, p. A11

Em vez de ajudar todos os países membros a cumprirem as suas próprias metas de Kyoto, a Comissão Européia está transferindo o que deveria ser um ônus compartilhado aos seus mais membros recentes, que já são os mais ambientalmente eficientes na União Européia. Ao fazê-lo, a comissão está recompensando a ineficiência e reduzindo a eficácia dos seus compromissos de fazer uma faxina no meio ambiente.

A decisão da Comissão na questão do Plano de Alocação Nacional (PAN) da Letônia para o período 2008-2012 manteve apenas 55% das emissões solicitadas pelo país. Estônia e Lituânia, igualmente, receberam apenas 52%-53% das cotas solicitadas. Profundos cortes também foram feitos nas cotas de outros novos membros da UE, levando Polônia, República Tcheca e Eslováquia, assim como a Letônia, a dar início a interpelações jurídicas. Quase todos os antigos membros da UE, porém, receberam mais de 90% das cotas requeridas.

O que está acontecendo aqui?

A abordagem da comissão está equivocada. De acordo com sua própria informação, o objetivo do Esquema de Comércio de Emissões da União Européia (EU-ETS) é ajudar os países a cumprirem as suas metas de Kyoto 2010 usando instrumentos de mercado para estimular as empresas a reduzirem suas emissões de CO2. Logicamente, as cotas deverão ser vinculadas ao progresso de cada membro no cumprimento do Protocolo de Kyoto.

Os novos países membros da União Européia estão cumprindo os seus compromissos individuais relativos a Kyoto. A maioria está comprometida a reduzir emissões em 8% até 2010. A Letônia já tem expectativa de reduzir suas emissões em 46% até aquela data, mesmo sem implantar nenhuma política adicional de redução de CO2. Na verdade, estima-se que os novos membros reduzam suas emissões de gás estufa em no mínimo 21% até 2010.

Os membros antigos da UE também têm uma meta de Kyoto coletiva, de reduzir as suas emissões de CO2 em 8% até 2010, porém estima-se que eles só alcançarão uma redução de meros 4,6%. Apesar disso, países como Bélgica e Holanda, que não devem cumprir suas obrigações de Kyoto, estão recebendo permissão para elevar as suas emissões.

-------------------------------------------------------------------------------- É imperativo que a Comissão Européia distribua todas as obrigações de forma igual e justa entre os 27 membros da União Européia --------------------------------------------------------------------------------

É imperativo que a Comissão Européia distribua todas as obrigações de forma igual e justa entre os 27 membros da União Européia. A maioria dos novos membros cumpriu ou está se aproximando das suas metas de Kyoto, e eles necessitam de crescimento econômico acelerado para alcançar o resto da UE. A sua capacidade de crescimento, porém, está sendo prejudicada, pois os países carecem de recursos para confrontar os maciços grupos de pressão empresariais dos países mais ricos e mais desenvolvidos da UE. Fazer os membros mais recentes da União suportar uma parcela desproporcional da carga da redução do valor total da poluição da UE é injusto e, ao mesmo tempo, tolo.

O exemplo da Letônia é o mais agudo. Depois de reconquistar a sua independência da União Soviética, só restaram alguns poucos vestígios dos elefantes brancos industriais da era comunista. Começando praticamente a partir de um "ponto zero" econômico, os empreendedores letões construíram uma economia nova e moderna, baseada em tecnologias novas e eficientes. Consequentemente, a Letônia possui um dos mais baixos níveis de emissão de gás estufa per capita na União Européia.

Apesar de ser o terceiro país mais pobre da União Européia, porém, essas determinações significam que o país deve adquirir cotas de emissão de membros da UE mais poluidores e mais ricos, que pouco fizeram para cumprir suas obrigações com Kyoto. Essa abordagem assimétrica está colocando em risco o desenvolvimento da Letônia e dos vulneráveis países que são membros novos, enquanto os mais antigos se aproveitam.

Em economias de pequeno porte como a Letônia e muitos outros países membros novos, mesmo um projeto de grande porte é importante para o progresso de todo o país. A decisão da comissão de reduzir suas cotas de emissão de CO2 poderá levar os investidores em projetos de desenvolvimento extremamente necessários a esses países a se deslocarem para fora da União Européia, para lugares com normas ambientais mais frouxas, onde suas atividades poderiam contribuir para gerar emissões globais mais elevadas. Emissões adicionais poderão ocorrer quando as mercadorias forem transportadas de volta à UE.

Como se isso não bastasse, a comissão está preparando um esquema de comércio de emissões para companhias aéreas da União Européia, tomando 2004 como ano-base para estabelecer cotas. Trata-se de uma nítida desvantagem para as empresas aéreas dos novos membros da UE, já que o número de passageiros por elas transportados só aumentou após 2004, quando estes países ingressaram na UE.

Uma decisão recente de aumentar a parcela de energia obtida a partir de fontes renováveis para 20% até 2020 também acarretará problemas. A Letônia, por exemplo, já gera 37% da sua energia a partir de fontes renováveis, mas agora provavelmente será agredida com uma meta de cerca de 50%, enquanto outros países terão metas inferiores a 10%. Por que deverá o povo da Letônia, um dos mais pobres da União Européia, pagar por algo que os povos mais ricos da Europa estão tendo dificuldade de fazer?

A Letônia e outros novos membros da UE não têm alternativa, salvo contestar a Comissão Européia em juízo. Ações e recursos, porém, não são a forma como imaginamos que a UE atuaria quando lutamos para nela ingressarmos. Pensávamos que a Europa acreditava no compartilhamento eqüitativo das suas responsabilidades. Lamentavelmente, quando o assunto é meio ambiente, os pobres da Europa estão sendo obrigados a suportar o ônus sozinhos.

Valdis Dombrovskis, ex-ministro das Finanças da Letônia, é membro do Parlamento Europeu. © Project Syndicate/Europe´s World, 2007. www.project-syndicate.org