Título: Governo vincula defesa de CPMF a gastos sociais para obter aprovação
Autor: Tarso Lyra, Paulo de, e Arnaldo Galvão
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2007, Política, p. A12

Pressionado pelos aliados que pedem cargos e pela oposição e empresários que querem o fim da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o governo quer mudar o enfoque do debate da CPMF: ao invés de defender a prorrogação como uma questão de equilíbrio fiscal, o Planalto vai passar a dizer que, sem ela, ficam ameaçados o Bolsa Família, os recursos para o SUS e a aposentadoria de quase um milhão de brasileiros. Um estudo preparado pela Secretaria de Orçamento e Finanças do Ministério do Planejamento e apresentado há duas semanas ao presidente Lula tentará sustentar esta argumentação. Mostra que, em quatro anos, o governo federal investiu, graças à CPMF, R$ 91,6 bilhões em Saúde, Previdência e Combate à Pobreza.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, contrariou em parte esta orientação, apesar de, provavelmente, ter participado de sua definição, ao falar aos empresários reunidos em seminário do setor de infra-estrutura. Disse que a prorrogação da CPMF é um dos cinco desafios para expandir o potencial de crescimento do país. E enalteceu a facilidade de arrecadação do tributo. "A CPMF não é tão ruim como se diz. É fácil de ser paga. A gente vai lá e pega", ensinou Mantega.

O documento do Ministério do Planejamento começou a ser encaminhado ontem à tarde aos líderes da base aliada, sob o título: "uma contribuição solidária da sociedade brasileira para combater a pobreza e reduzir a desigualdade social no país". O texto busca induzir os aliados a pensarem que, sem a CPMF, todas as ações sociais do governo Lula estarão irremediavelmente perdidas. No campo da Saúde, o documento mostra que, entre 2003 e 2006, foram investidos R$ 46,6 bilhões de recursos da CPMF em Saúde, dos quais R$ 32 bilhões destinados ao SUS. "O SUS é o único acesso à saúde para 80% da população brasileira", alerta o documento.

O estudo prossegue afirmando que a CPMF deve investir R$ 7,5 milhões no Bolsa Família, o que representaria 88% dos recursos do programa, beneficiando 9,6 milhões de famílias ou 40 milhões de pessoas. Já no caso da Previdência, "o maior programa social do país", a CPMF asseguraria o pagamento de benefícios mensais para quase um milhão de pessoas.

"O governo precisa se empenhar para passar dados e argumentos aos partidos da base", defendeu o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). "A CPMF tem papel estratégico no financiamento de todos os nossos programas de assistência social", prossegue o petista.

Essa falta de visão política, na opinião de um senador aliado, permitiu que o Planalto fosse chantageado pelo PMDB e por outros partidos da base desde que a PEC da CPMF chegou ao Congresso. A chantagem começou durante a tramitação da matéria na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. O Planalto foi obrigado a nomear Luiz Paulo Conde para a presidência de Furnas em troca do relatório favorável do pemedebista Eduardo Cunha (RJ).

A emenda tramitará agora em uma Comissão Especial, mas a troca de favores está longe de terminar. "Ninguém gosta de votar matérias antipáticas ao povo. Quem apóia aumento de imposto? Essa tarefa de convencimento fica ainda mais difícil porque o governo não distribui os cargos que promete aos aliados", explicitou um líder da base aliada na Câmara.

Durante a reunião do Conselho Político de ontem, os líderes dividiram-se quanto à conveniência de se encaminhar neste momento a proposta de reforma tributária ao Congresso. A equipe econômica pretende enviar o texto em meados de setembro. "Não seria mais prudente mandar depois para não parecer que só queremos garantir a prorrogação da CPMF?" ponderou a líder do governo no Senado, Roseana Sarney (PMDB-MA).