Título: LG disputa espaço entre líderes mundiais
Autor: Moon Ihlwan BusinessWeek, de Seoul
Fonte: Valor Econômico, 27/01/2005, Empresas &, p. B6

Foi difícil não perceber as ambições da LG Electronics na gigantesca Feira de Produtos Eletrônicos de Consumo de Las Vegas, no começo de janeiro. A logomarca da LG e fotos de seus telefones estavam estampados em cartazes fincados a quase meio quilômetro, em todas as direções, do centro de convenções onde o evento ocorreu. Dentro do local, aparelhos de TV com telas de plasma de 42 polegadas mostravam mapas da área de exibição. No stand de 1,7 mil m², a companhia mostrou uma variedade de novos produtos, de um MP3 player do tamanho de uma caixa de fósforos, ao preço de US$ 180, a uma TV com tela de plasma de 71 polegadas (US$ 77 mil). O objetivo era fazer sombra a tudo o que estava sendo oferecido pela Sony, Samsung ou Panasonic. "Não dá para ser segunda linha para sempre", diz o principal executivo da LG, Kim Ssang Su. "Precisamos ser um concorrente de ponta." Esse é o tipo de conversa que o setor vem ouvindo há anos da rival da LG, a Samsung Electronics. Sob o comando de Kim, que assumiu em outubro de 2003, a LG quer entrar na "primeira divisão" dos aparelhos eletrônicos de consumo. Kim, que tem 60 anos e passou a vida inteira na LG, está determinado a transformar a companhia em uma formadora de tendências digital - e até 2010, uma das três maiores fabricantes de produtos eletrônicos domésticos do mundo. "Nós precisamos ser uma grande companhia com pessoas grandes", declara ele. O sobrenome de Kim, Ssang Su, pode ser traduzido literalmente como "duplamente surpreendente". E é isso que esse rígido chefe coreano espera que todos os seus subordinados sejam. Ele ordenou a cada uma das três divisões da LG - telefones móveis, displays digitais e produtos domésticos - que melhore a produtividade em 30%. E cada unidade tem de elaborar planos de combate anuais e trianuais para atacar o mundo dos produtos eletrônicos digitais. As vendas cresceram estimados 21% em 2004, para US$ 23,6 bilhões, e o lucro líquido deverá mais que dobrar, para US$ 1,5 bilhão. A companhia é a principal fabricante de aparelhos domésticos de ar-condicionado do mundo e a terceira maior fabricante de televisores com tela de plasma, enquanto sua joint-venture LG Philips LCD é a maior fabricante de telas de cristal líquido para TVs. Uma concorrente tardia na área de telefones móveis, a LG aumentou suas vendas de celulares de 6,9 milhões em 2000 para 44 milhões no ano passado e é a principal fornecedora da companhia telefônica americana Verizon Wireless. Em setembro, a LG superou a associação japonesa-sueca Sony Ericsson, abocanhando 7% do mercado mundial de celulares, segundo a consultoria Strategy Analytics. Ela está agora no quinto lugar, depois da Nokia, Motorola, Samsung e Siemens. Os consumidores adoram seus designs caprichosos. Os investidores gostam das ações da LG, que valorizaram 37% nos últimos cinco meses. Apesar de todo o sucesso, a LG continua obcecada com a Samsung. Até meados dos anos 90, as duas companhias estavam palmo a palmo na corrida para se tornar a principal fabricante de produtos eletrônicos da Coréia do Sul. As duas foram atingidas pela crise econômica asiática em 1997, mas a Samsung iniciou uma dolorosa reestruturação e uma cara arrancada para a construção de sua marca que a colocou nas fileiras dos líderes mundiais. A LG, por outro lado, patinou, fazendo uma aposta equivocada nas telecomunicações - tudo de serviços com fio e sem fio a sistemas de encaminhamento de ligações -, justamente quando os negócios malograram. A estratégia mal planejada da LG deixou os investidores em pânico em 2000, quando as ações caíram 75%. Hoje a estratégia rumo ao topo da telefonia é história - e os executivos da LG admitem que têm muito o que aprender com a Samsung. O principal executivo Kim elogia a maneira como a Samsung colocou seus funcionários "à beira do abismo" ao criar uma sensação de crise para acelerar o ritmo da mudança. O diretor financeiro Kwon Young Soo admira a habilidade da Samsung no desenho dos celulares: "Nossa qualidade é quase a mesma, mas em design a Samsung é melhor", diz. E Park Mun Hwa, que preside a divisão de celulares da LG, diz que usa a estratégia da Samsung como um modelo. "A Samsung é a nossa professora."

"Não dá para ser segunda linha para sempre", diz o principal executivo da empresa, Kim Ssang Su

No entanto, a LG não é uma mera imitadora da Samsung. Para quem não sabe, ela tem uma dinâmica unidade de chips, que na ponta mais alta do ciclo de negócios pode dar uma alavancada em seus lucros. A LG desmembrou sua divisão de chips cinco anos atrás. Mesmo assim, Kim vê como ganhar vantagem da Samsung de duas maneiras. Uma é a velocidade: a LG bate a Samsung no lançamento de camera-fones e MP3 fones nos Estados Unidos. A outra é a diferenciação de produtos. A companhia vende seus produtos mais caros sob o nome LG e os eletrônicos de preços mais baixos como Zenith, uma marca americana comprada em 1996. (Uma terceira marca, GoldStar, está sendo aposentada.) Essa estratégia permite à LG ampliar rapidamente sua participação de mercado sem manchar a marca LG. Embora a LG não seja tão conhecida como a Samsung, ela está sendo levada muito mais a sério do que antes. No ano passado ela vendeu 3 milhões dos caros telefones celulares da terceira geração para a Hutchison Whampoa, tornando-se a maior fornecedora de celulares 3G para a companhia de Hong Kong, que possui redes em oito países asiáticos e europeus. A LG, que dobrou suas vendas de celulares nos EUA, para 20 milhões de unidades em 2004, espera um crescimento de 70% este ano. No ano passado ela vendeu 11 milhões de unidades para a Verizon Wireless e 6 milhões para a Cingular Wireless e sua parceira de fusão, a AT&T Wireless. A LG percorreu um longo caminho desde os dias em que era conhecida como Lucky-GoldStar - um nome que a LG iria logo esquecer. Pergunte aos executivos o que significa LG e eles vão dizer "Life´s Good" (a vida é boa), o slogan criado um ano atrás para reposicionar a companhia. Fundada em 1958 como uma fabricante de ventiladores, a GoldStar tornou-se a primeira companhia de produtos eletrônicos da Coréia do Sul um ano depois, quando começou a fabricar rádios. Tempos depois, ela estava fabricando de tudo, de geladeiras a elevadores e semicondutores. Enquanto isso, a unidade química do grupo, a Lucky, estava ampliando suas atividades para a produção de plásticos, cosméticos e baterias, entre outros, e em 1995 houve a mudança oficial do nome do grupo para LG. Até dois anos atrás, se os consumidores dos EUA e Europa tinham ao menos ouvido falar da LG, eles normalmente a associavam com produtos de baixa qualidade. Hoje, a LG sonha alto: ela quer atingir o terceiro lugar na fabricação de celulares em dois anos. Será uma tarefa quase impossível, dada a força da Samsung e a recuperação que a Motorola está experimentando. Além disso, os 44 milhões de aparelhos vendidos pela LG em 2004 representaram cerca de metade da produção da Samsung, a número três. Mesmo assim a companhia espera crescimento de 50% em suas vendas de celulares e também tomar o quarto lugar da Siemens, na medida em que for selando mais acordos com grandes companhias telefônicas e começar a exportar mais telefones que usam o padrão GSM - uma tecnologia que ela abraçou com determinação apenas no ano passado. Dentro de cinco anos, a LG quer obter metade de suas vendas com os celulares, parcela que em 2004 foi de 28%. É verdade que a vida não está de todo boa na LG. A erosão dos preços está tão acelerada nas telas e televisores que as operações de telas de cristal líquido, que responderam por metade dos lucros da LG no ano passado, poderão contribuir com uma parcela muito menor do lucro deste ano. Alguns analistas acreditam que os lucros com celulares e aparelhos domésticos crescerão com rapidez suficiente para compensar a queda dos ganhos com as telas, mas o negócio de LCD (liquid crystal displays) é altamente cíclico. A menos que os preços se recuperem no segundo semestre deste ano, a LG poderá não ter caixa suficiente para realizar os investimentos necessários para permanecer à frente de outros concorrentes. Nos celulares, a LG está contando com sua força inicial nos telefones 3G, mas os fabricantes japoneses estão de olho no mesmo mercado e serão concorrentes formidáveis.

As vendas cresceram 21% em 2004, para US$ 23,6 bi, e o lucro líquido deve mais que dobrar, para US$ 1,5 bi

Mas no setor, a maioria das pessoas está levando a LG a sério, e seu sucesso junto a empresas como a Verizon, Cingular e Hutchison vem reforçando seu potencial. "A LG fez um trabalho de credibilidade ao se estabelecer no mercado global nos últimos dois anos", diz Chang Il Hyung, vice-presidente sênior da Samsung Electronics. O respeito que a LG está conseguindo hoje se deve em grande parte a Kim. Filho de um agricultor pobre, ele começou como engenheiro da LG em uma fábrica de geladeiras do grupo. Ele passou 27 anos galgando a escada corporativa na divisão de utensílios domésticos antes de ser nomeado presidente da unidade em 1996. Sob sua liderança, a divisão de eletrodomésticos da linha branca passou a ter lucros de dois dígitos, confundindo os céticos que pensavam que a LG nunca conseguiria competir com os produtores de baixos custos chineses. A chave dessa estratégia foi a mudança de cerca de 35% da produção para a China e a concentração dos produtos de preços mais altos em fábricas na Coréia. A divisão ultrapassou a unidade de produtos da Samsung em 2000 e em 2004 saltou para a terceira posição no mundo (depois da Whirlpool e Electrolux), gerando o caixa que a LG precisava para investir em celulares, TVs digitais e telas planas. Kim é um líder duro que exige que seus funcionários também tenham a sua enorme ambição. A primeira coisa que ele fez quando foi nomeado principal executivo foi colocar um fim na cultura tranqüila da LG, que pouco fazia para encorajar os administradores a superarem as metas. "Odeio ouvir as pessoas dizerem que a LG é um lugar confortável para trabalhar", diz Kim. "Eu quero que ela seja um lugar duro." Kim adiantou as reuniões da direção em uma hora, das 8 horas para as 7 horas, e estabeleceu metas extremamente difíceis para executivos e trabalhadores. E ele pressionou os fornecedores para reduzir seus custos e centralizou as redes de fornecimento para cortar os estoques em uma média de 30%. Os estoques de televisores, por exemplo, caíram de cinco dias para três no último ano. Agora ele está reforçando as áreas de pesquisa e desenvolvimento e marketing. Embora a qualidade de produção da LG seja comparável à dos concorrentes japoneses mais conhecidos e da Samsung, ela ainda não fixou isso no conceito dos consumidores. Para melhorar esse perfil, a LG precisa fortalecer sua presença nas linhas de produtos mais caros e melhorar o marketing e a pesquisa e desenvolvimento, segundo analistas. A LG reservou US$ 1,73 bilhão para pesquisa e desenvolvimento em 2005, ou 6% das receitas. Isso é 40% mais do que no ano passado, mas a Samsung reserva o equivalente a 7,5% das receitas para pesquisa e desenvolvimento. A maior parte dos investimentos da LG irá para os celulares de próxima geração, TVs digitais, telas planas e produtos de rede. "É preciso ter munição e armas boas no campo de batalha", diz Kim. A vanguarda do ataque será a divisão de aparelhos de mão. Como a Samsung, a LG acredita que pode prosperar tornando os celulares a âncora de sua campanha mundial de construção de marca. Desde 1999 a Samsung lançou uma série de celulares bem desenhados que transformaram sua imagem em um fabricante de primeira linha desses aparelhos. Na LG, a tese é que uma vez que os consumidores tenham um celular seu nas mãos, é bem provável que eles mudem de marca quando forem comprar uma TV, gravador de vídeo ou geladeira. "A imagem da marca da LG é significativamente melhor entre aqueles que já tinham produtos da LG", diz Lee Hye Woong, vice-presidente de administração global de marca. Mas, ao contrário da Samsung, que vem gastando centenas de milhões de dólares anualmente somente com propaganda para promover sua marca, a LG centra seus esforços na venda de telefones. Este ano a companhia pretende gastar US$ 200 milhões para comercializar celulares nos Estados Unidos - o dobro do que gastou no ano passado - em grande parte conjugados com as companhias telefônicas que são clientes da LG.

A destreza técnica da LG é completada por uma crescente equipe de designers de nível mundial

A LG sabe o quanto é importante trabalhar de perto com as telefônicas. Dois anos atrás, a Verizon Wireless estava em busca de um parceiro para o lançamento de um serviço de mensagens multimídia. A LG aproveitou a oportunidade e estabeleceu um escritório perto da sede da Verizon. "A tarefa mais crítica foi criar um grande companheirismo com o nosso cliente", diz Warren Yun, gerente sênior encarregado das operações da LG na América do Norte. Essas ligações valeram a pena quando a Verizon escolheu o câmera fone VX6000, de US$ 149, da LG para lançar o serviço em julho de 2003. Depois a Verizon escolheu o modelo VX8000, de US$ 200, como o aparelho de mão de destaque no anúncio de seu novo serviço VCast, que envia clips de vídeo para telefones celulares. No disputado negócio da telefonia móvel, a velocidade é essencial. E é aí que os executivos da LG acreditam que têm uma vantagem. Para se certificar de que o novo serviço multimídia da Verizon seria um sucesso, a LG mandou 50 engenheiros de sua elite, marketeiros e especialistas em desenvolvimento de produtos para os EUA. Ao usar essa capacidade de trabalho, a LG conseguiu cortar o tempo normalmente necessário para o lançamento de um novo serviço em 25%, para nove meses. Para promover a imagem de inovadora da LG, Kim também quer que a companhia ofereça produtos que despertem mais a atenção. Em Las Vegas ela lançou uma TV de plasma de 60 polegadas com um gravador de vídeo embutido (preço US$ 15 mil). E apresentou um gravador de vídeo digital com um hard drive de 160 gigabytes que oferece um guia de programação eletrônica e pode ser conectado a um PC. No ano passado ela foi a primeira companhia a introduzir um telefone móvel capaz de receber transmissões de TV digital, e lançou uma geladeira com uma TV com tela de cristal líquido embutida. E, é claro, há a TV dourada de 71 polegadas da LG, apresentada como "a maior TV de plasma em produção no mundo". Infelizmente para a LG, no último minuto ela teve que acrescentar a palavra "produção" porque a Samsung apareceu com um protótipo de um modelo de plasma de 102 polegadas. Mesmo assim, a LG se saiu bem: recebeu 16 prêmios por inovações na feira - mais do que qualquer outra companhia. A destreza técnica da LG é completada por uma crescente equipe de designers de nível mundial. No último ano, a LG aumentou sua equipe de projetos em 40%, para 500 pessoas. No centro de projetos de Kangnam, um bairro de Seoul cheio de galerias, clubes noturnos e cafés, projetistas vestindo jeans, camisetas e tênis estão na dianteira dos esforços da LG em desenvolver projetos que todos os jovens consumidores vão querer ter. "Cada vez mais os projetistas são vistos como criadores de valor", diz Yang Jung Min, que ajudou a desenhar um aparelho de ar-condicionado vermelho-rubi lançado pela LG em 2003. A máquina, que tem um painel frontal de vidro, foi um sucesso, vendendo 40 mil unidades no primeiro ano. Conseguirá a LG repetir o sucesso da Samsung? Os céticos observam que o lucro projetado pela companhia para 2004, de US$ 1,5 bilhão, fica bem longe do resultado da Samsung, de US$ 10 bilhões - embora metade do lucro da Samsung venha da divisão de chips. E as margens da LG para os celulares, em 7%, são menos da metade da Samsung - a LG atribui isso aos menores volumes de produção e gastos elevados com pesquisa e desenvolvimento. Alguns podem dizer que a LG poderá acabar sendo uma forte número 2 na Coréia, papel que a Matsushita Electric Industrial do Japão - fabricante dos produtos Panasonic - tem em relação à Sony. A número 2? Não é o tipo de conversa que Kim quer ouvir. Mas acabe a LG mais alto ou mais baixo no ranking, os fabricantes globais já estão tendo mais um concorrente coreano em rápido crescimento para enfrentar. (Tradução de Mário Zamarian)